sexta-feira, setembro 28, 2007

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (parte 1 de 2)

1) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-07-2007, proferido no processo n.º 07B2330:
"Na obrigação da Relação de resolver as questões que lhe são colocadas pelas partes - pontos de facto e ou de direito relevantes no quadro do litígio, concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções – não se inscrevem todos os argumentos por elas deduzidos.
Na fase declarativa da oposição à execução, estruturalmente extrínseca a esta, espécie de contra-acção, susceptível de se basear em fundamentos de natureza substantiva, o ónus de prova segue o regime decorrente do artigo 342º, com o desvio constante do nº 2 do artigo 374º, ambos do Código Civil.
Posicionando-se as letras de câmbio nas relações imediatas envolventes do sacador e do aceitante, pode discutir-se na fase declarativa da oposição a origem da constituição das obrigações jurídico-cambiárias por via da análise do conteúdo das relações jurídicas subjacentes.
Pela sua estrutura meramente conclusiva, a afirmação no requerimento executivo de que as letras de câmbio se destinavam ao pagamento de empréstimos feitos pelo exequente ao executado é insusceptível de revelar a celebração de algum contrato de mútuo, quedando por isso prejudicado o conhecimento da sua nulidade invocada pelo opositor.
A aposição da assinatura do aceitante no lugar do aceite em letras de câmbio, que contêm a expressão reforma ou transacção comercial, não implica a conclusão do reconhecimento por ele da sua dívida em relação ao sacador, a que se reporta o artigo 458º, nº 1, do Código Civil.
Prescrito o direito de crédito cambiário, não podem as referidas letras servir de título executivo como meros documentos particulares, a que alude a alínea c) do nº 1 do artigo 46º do Código de Processo Civil, visto que delas não resulta a constituição ou o reconhecimento de alguma obrigação pecuniária."


Nota - Sobre o primeiro ponto ("Na obrigação da Relação de resolver as questões que lhe são colocadas pelas partes (...) não se inscrevem todos os argumentos por elas deduzidos"), cfr. a nota que deixei
aqui ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-09-2007, proferido no processo n.º 07B2522.
Quanto ao ónus da prova na oposição à execução, cfr. também os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 15-03-2007, proferido no processo n.º 07B683, de 16-06-2005, proferido no processo n.º 04B660, e de 30-09-2004, proferido no processo n.º 04B2538, do Tribunal da Relação do Porto de 22-02-2007, proferido no processo n.º 0730674, do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-03-2007, proferido no processo n.º 633/2007-8, de 23-11-2006, proferido no processo n.º 9208/2004-6, e de 18-06-2003, proferido no processo n.º 3884/2003-4, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 21-03-2006, proferido no processo n.º 395/06.
Sobre a (in)exequibilidade da letra prescrita, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 06-05-2003, proferido no processo n.º 03A1051, de 30-01-2001, in CJ, tomo I, pág. 85, do Tribunal da Relação do Porto de 01-03-2005, proferido no processo n.º 0520778, de 08-11-2004, proferido no processo n.º 0455441, de 01-07-2004, proferido no processo n.º 0433048, de 10-05-2004, proferido no processo n.º 0451322, de 09-03-2004, proferido no processo n.º 0326796, e de 10-02-2000, proferido no processo n.º 9931464, do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-10-2006, proferido no processo n.º 7465/2006-6, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 27-06-2006, proferido no processo n.º 755/06.


2)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-09-2007, proferido no processo n.º 07A090:
"O nº 6 do artº 712º do CPC determina que das decisões da Relação previstas nos números anteriores não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Todavia, isso tem de ser entendido cum grano salis, pois o Supremo pode censurar o mau uso pela Relação dos poderes que em exclusivo lhe são conferidos pelo artº 712º do CPC, podendo sindicar o desrespeito, pela Relação, dos pressupostos exigidos para a mexida na matéria de facto, referidos no artº 712º do CPC, e, de uma maneira geral, a alteração da matéria de facto que tiver sido feita com violação da lei.
Uma coisa é a apreciação das provas por parte da Relação, outra a questão de saber se esta fez uso legal do artº 712º, sendo a primeira questão de facto, com a qual nada tem o Supremo, e a segunda questão de direito, em relação à qual é legítima a censura por parte do tribunal de revista"
.

Nota - Sobre esta matéria, cfr. o
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08-05-2007, proferido no processo n.º 07A759, e a anotação que a ele deixei aqui, bem como o acórdão do mesmo tribunal de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07A1528.
Em particular, sobre a possibilidade de controlo, pelo STJ, do uso, pelas Relações, de presunções judiciais, cfr. o
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-03-2007, proferido no processo n.º 06A4002 (e a anotação que a ele deixei aqui). O Supremo Tribunal de Justiça não pode sindicar o simples uso ou não uso da presunção judicial, embora possa controlar, como aqui o fez, um uso que se traduza na alteração das respostas dadas à matéria de facto - cfr., neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 05-07-1984, proferido no processo n.º 071754, de 03-11-1992, proferido no processo n.º 082011, de 09-03-1995, proferido no processo n.º 086250, de 26-09-1995, proferido no processo n.º 087078, de 31-10-1995, proferido no processo n.º 087288 (estes dois últimos com um voto de vencido), de 20-01-1998, proferido no processo n.º 97A460, 09-07-1998, proferido no processo n.º 98B430, de 07-07-1999, proferido no processo n.º 99A588, de 20-06-2000, proferido no processo n.º 00A407, de 19-03-2002, proferido no processo n.º 02B656, de 10-02-2003, proferido no processo n.º 03B1837, de 15-02-2005, proferido no processo n.º 04A4577, e de 07-11-2006, proferido no processo n.º 06A3564.
Em particular para a definição de presunção judicial, cfr. a nota ao
acórdão do STJ de 05-12-2006, proferido no processo n.º 06A3883, que deixei aqui.


3)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-09-2007, proferido no processo n.º 07B2340:
"O despacho de saneamento, positivo, do relator, no tribunal superior, é sempre de carácter provisório, podendo, consequentemente, ser livremente modificável, pela conferência, sem consubstanciar defesa postergação dos princípios consignados nos artºs 666º nº 1 e 672º do CPC.
Sob pena de valimento achar a prolação de despacho de indeferimento do requerimento de interposição do recurso, deve, em tal peça processual, o recorrente invocar o fundamento excepcional em que, para o efeito, se abona (artºs 678º nºs 2 a 6 e 687º nº1 do CPC).
Sem prejuízo dos casos a que se reporta o artº 66º nº 5 do Código das Expropriações, aprovado pela Lei nº 168/99, de 18 de Setembro, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do tribunal da Relação que fixa o valor da indemnização devida, mesmo com fundamento em questões de direito, sempre que tal implique com a predita fixação, que, em suma, redunde na reapreciação da decisão que aquela operou.
Os tribunais judiciais são os competentes, em razão da matéria, para condenar a Administração no pagamento de indemnização a particular, por danos directos ou indirectos, de que foi vítima, por mor da actuação daquela, fundada, não em expropriação, sim em denominada «via de facto», por traduzida em apossamento seu de direitos patrimoniais privados de um modo fáctico, sem ocorrência de decisão a servir-lhe de fundamento, como acto de declaração de utilidade pública e qualquer procedimento próprio da expropriação
"
.

Nota - Para maiores desenvolvimentos sobre a irrecorribilidade do acórdão da Relação em processo de expropriação, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 06-07-2005, proferido no processo n.º 03B1925, de 16-03-2004, proferido no processo n.º 03A2594, e de 23-10-2003, proferido no processo n.º 03B2087.


4)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-09-2007, proferido no processo n.º 07B1963:
"Só nos casos previstos no nº 2 do artigo 722º do Código de Processo Civil é que o Supremo Tribunal de Justiça pode alterar a decisão sobre a matéria de facto.
Não cabe pois nos seus poderes apreciar conclusões que a Relação tenha retirado da prova testemunhal ou a que tenha chegado por presunções judiciais, mas compete-lhe determinar se eram admissíveis tais meios de prova, bem como analisar a força probatória plena de documentos particulares assinados.
A impossibilidade de substituição de uma escritura pública exigida por lei como requisito de forma de uma declaração negocial para que se façam valer os efeitos do negócio, como se fora válido, não impede a utilização, nem de documentos de menor força probatória, nem de prova testemunhal ou por presunções judiciais, para a demonstração de que foi celebrado um mútuo nulo por falta de forma e, por essa via, fazer operar os efeitos da respectiva nulidade.
Constitui litigância de má fé negar factos essenciais de que necessariamente se tem conhecimento, por serem pessoais."


Nota - Cfr. a anotação ao segundo acórdão.
Sobre a litigância de má fé consubstanciada na negação de factos pessoais, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto
de 17-06-2002, proferido no processo n.º 0210089, de 16-01-2001, proferido no processo n.º 0021395, de 28-11-1991, proferido no processo n.º 9150360, de 27-11-1995, proferido no processo n.º 9510856, do Tribunal da Relação de Coimbra de 02-05-1984, in BMJ n.º 337, pág. 420, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 02-07-2002, proferido no processo n.º 0059021, e de 20-04-1993, proferido no processo n.º 0063771.

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quinta-feira, setembro 27, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 4 de 4)

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 6141/2007-7:
"Seja qual for o regime de bens, no caso de um cônjuge se ver impedido de aceder aos seus bens próprios ou aos bens de que é comproprietário com o outro cônjuge, é-lhe lícito recorrer à providência de arrolamento a que alude o artigo 427º/1 do C.P.C. /revisão de 1995-1996 como preliminar ou incidente da acção de divórcio.
Dada a natureza instrumental dos procedimentos cautelares relativamente à acção principal, que é neste caso a acção de divórcio proposta ou a propor, os Tribunais de Família são competentes em razão da matéria atento o disposto nos artigos 383º/1 do C.P.C. e artigo 81º, alíneas b) e c) da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro)".

Nota - A dúvida prendia-se, aqui, com a competência do Tribunal de Família para conhecer o pedido de arrolamento, considerando que o cônjuge não pedia o arrolamento dos bens comuns mas dos seus bens próprios, que se encontravam na morada do casal, vigorando entre ambos o regime da separação de bens.
Não é claro, na fundamentação do acórdão, se os bens em causa, próprios do requerente, estariam sob administração da requerida (caso em que a hipótese caberia directamente na previsão do n.º 1 do artigo 427.º).
Ainda assim, parece-me que se justificaria a providência, enquanto incidente do processo de divórcio, para acautelar o risco de ocultação ou apropriação, pela requerida, dos bens próprios do requerente, por se encontrarem no local onde reside, ainda que não haja futuramente um processo de inventário, por vigorar entre os cônjuges o regime da separação de bens. A necessidade de futura partilha parece não ser essencial para admitir o arrolamento, até mesmo porque o n.º 1 do artigo 427.º do CPC prevê expressamente a hipótese de arrolamento de bens próprios do requerente, os quais não serão objecto de qualquer partilha.
Na jurisprudência que conheço sobre a competência do Tribunal de Família para o arrolamento dependente da acção de divórcio, não encontro nenhuma caso concreto em que vigorasse entre os cônjuges o regime da separação de bens (ainda assim, vejam-se os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 22-05-2000, proferido no processo n.º 9951488, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 04-03-1997, proferido no processo n.º 0017611, referindo-se este último apenas a
"arrolamento dos bens susceptíveis de partilha").


2) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4095/2007-8:
"Não é válida cláusula contratual em que o fiador se obrigou relativamente aos períodos de renovação do contrato sem limitar o número destes, devendo, por isso, a obrigação do fiador considerar-se extinta decorridos cinco anos sobre o início da primeira prorrogação (artigo 655º/2 do Código Civil).
É válida a desistência do pedido relativamente a um dos fiadores que com outros se obrigou em regime de solidariedade a pagar as rendas, pois no caso de litisconsórcio voluntário é livre a desistência do pedido (artigos 293.º e 298.º do Código de Processo Civil).
O exercício do direito de desistência do pedido (ou da confissão ou de transacção) não constitui abuso do direito".

Nota - Sobre a desistência do pedido em caso de litisconsórcio voluntário, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-03-2001, proferido no processo n.º 0130239.
Note-se, porém, que parte da doutrina defende uma interpretação restritiva do artigo 298.º do CPC, por forma a abranger nele apenas os casos de litisconsórcio unitário (nesse sentido, cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lisboa: Lex, 1997, página 153). Este entendimento já encontrou acolhimento na jurisprudência, em, pelo menos, dois acórdãos: do Tribunal da Relação de Lisboa de 14-11-2006, proferido no processo n.º 2801/2006-7, e do Supremo Tribunal de Justiça de 27-04-1999, proferido no processo n.º 99A295 (também in CJ, 1999, tomo II, pág. 63 e ainda BMJ 486-276).
Para maiores desenvolvimento sobre o conceito de litisconsórcio unitário, cfr. este post do blog, que dediquei ao assunto.



3) Decisão individual do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferida no processo n.º 6401/2007-8:
"A circunstância de em acção de reivindicação o autor considerar possuidor aquele que porventura não será mais do que um detentor não obsta a que a acção prossiga pois, podendo a referida acção ser proposta quer contra o possuidor, quer contra o detentor, é afinal uma questão de qualificação a que se pode suscitar (artigo 661.º do Código de Processo Civil) não devendo o Tribunal obstar por tal razão ao prosseguimento da lide".

Nota - A decisão é, quanto a mim, pacífica e evidente. A petição não pode considerar-se inepta por errar uma qualificação jurídica, quanto à qual o tribunal é inteiramente livre, não se encontrando dependente da actividade das partes.
Creio que a menção, na fundamentação e no sumário, ao artigo 661.º do CPC é um lapso, tendo-se pretendido, provavelmente, referir o artigo 664.º do CPC.



4) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-07-2007, proferido no processo n.º 6792/2007-1:
"A reserva de propriedade não é um exclusivo dos contratos de compra e venda.
A menção do art.º 18.º, n.º 1, do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, ao “contrato de alienação” pode ser entendida como referindo-se também ao contrato de mútuo conexo com o de compra e venda e que esteve na origem da reserva de propriedade".

Nota - Actualizando e consolidando o levantamento jurisprudencial anteriormente realizado a este respeito, temos o quadro seguinte.
O artigo 18.º/1 do Decreto-Lei n.º 54/75, referido no sumário, trata da resolução do contrato por incumprimento das obrigações a que se refere a reserva da propriedade.
Problemas relacionados com a interpretação destas normas têm vindo a ser sucessivamente colocados aos tribunais superiores, já que, em vez da normal relação de dois pólos (vendendor-comprador), a reserva de propriedade surge cada vez mais em relações triangulares (adquirente-vendedor-financiador), sendo cada vez mais frequente a constituição de reserva de propriedade como instrumento de protecção do financiador. Ou seja, a reserva de propriedade passa a salvaguardar não o pagamento do preço ao vendedor (que terá sido assegurado pelo financiador), mas sim o pagamento das prestações ao financiador.
A jurisprudência tem vindo a interpretar o preceito do artigo 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75 no sentido de se referir apenas ao incumprimento das obrigações do contrato de compra e venda, o que impediria que o financiador dela beneficiasse.
No entanto, em outras decisões tem admitido a possibilidade de: (i) a reserva ser constituída a favor de crédito de terceiro; e (ii) interpretar extensivamente o artigo 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75, no sentido de abranger "o contrato de mútuo conexo com o de compra e venda cujo cumprimento esteve na origem da reserva de propriedade" (texto citado do acórdão em análise).
Quanto ao primeiro ponto (possibilidade de a reserva ser constituída a favor de crédito de terceiro), cfr. o acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-03-2003, in CJ, 2003, tomo II, pág. 74, e, recentemente, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2006, proferido no processo n.º 06A1901.
Quanto ao segundo ponto (possibilidade de interpretar extensivamente o artigo 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75), cfr. o já citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2006, proferido no processo n.º 06A1901 . Contra: acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-12-1997, in CJ, 1997, tomo V, pág. 120, do Supremo Tribunal de Justiça de 12-05-2005, proferido no processo n.º 05B538 (argumentando que o vendedor não pode já exercer o direito à resolução porque recebeu já a totalidade do preço, logo não poderá exercer o direito de apreensão, conexo com aquele primeiro - a decisão conta com um voto de vencido), e do Tribunal da Relação do Porto de 01-06-2004, proferido no processo n.º 0422028.
No Tribunal da Relação de Lisboa, temos a seguinte "contagem de espingardas":
- no sentido de que a reserva de propriedade pode constituir-se em favor de crédito de terceiro não vendedor, cfr. os acórdãos de 26-04-2007, proferido no processo n.º 1614/2007-6, de 06-03-2007, proferido no processo n.º 1187/2007-7, de 01-02-2007, proferido no processo n.º 733/2007-6, de 22-06-2006, proferido no processo n.º 3629/2006-6, de 27-06-2006, proferido no processo n.º 937/2006-1 (este, se bem o interpreto, apenas quanto à primeira vertente, ou seja, da possibilidade de constituição da reserva a favor de terceiro), de 22-06-2006, proferido no processo n.º 4667/2006-6, de 30-05-2006, proferido no processo n.º 3228/2006-7, de 28-03-2006, proferido no processo n.º 447/2006-7 (com um voto de vencido, apoiado no citado acórdão do STJ de 12-05-2005), de 20-10-2005, proferido no processo n.º 8454/2005-6, de 05-05-2005, proferido no processo n.º 3843/2005-6, de 18-03-2004, proferido no processo n.º 2097/2004-6 (concordando com, pelo menos, o primeiro ponto supra citado, já que o segundo não se levanta no processo, e com um vonto de vencido, que não abrange, em rigor, essa matéria), de 27-06-2002, proferido no processo n.º 0053286, de 26-04-2007, proferido no processo n.º 3076/2007-6, e o agora anotado, de 26-07-2007, proferido no processo n.º 6792/2007-1.
- contra: acórdãos de 08-02-2007, proferido no processo n.º 957/2007-2, de 12-10-2006, proferido no processo n.º 3814/2006-2, de 22-06-2006, proferido no processo n.º 4927/2006-8, de 29-06-2006, proferido no processo n.º 4888/2006-2, e de 14-12-2004, proferido no processo n.º 9857/2004-7.
Outros assuntos relativos à reserva de propriedade já analisados neste blog foram relação entre as regras de competência constantes do DL 54/75 e as novas regras da Lei 14/2006 (cfr. aqui o último levantamento sobre este assunto) e a renúncia à reserva de propriedade e penhora pelo titular da reserva.

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quarta-feira, setembro 26, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 3 de 4)

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4382/2007-6:
"O arbitramento de reparação provisória constitui um procedimento cautelar (nominado) que tem como objectivo, reparar provisoriamente o dano decorrente de morte ou lesão corporal como também aqueles em que a pretensão indemnizatória se funde em dano susceptível de por seriamente em causa o sustento ou habitação do lesado, sendo que o seu regime jurídico se encontra previsto nos arts. 403º a 405º do CPCivil.
O preceituado no art. 403º, nº 2, não deve corresponder necessariamente à medida da protecção alimentícia, do mesmo modo que não pode cingir-se aos quantitativos necessários para compensar a perda de poder económico para provimento do sustento e da habitação.
Por contraposição com o nº 4, o conceito de necessidade a que se reporta o nº 2 é mais amplo e pode envolver, de acordo com o normal padrão de vida do lesado, componentes ligadas à diminuição do bem-estar, da educação ou do vestuário, que não apenas as atinentes à capacidade de almejar o seu próprio sustento ou de prover à sua habitação.
E compreende ainda não apenas as despesas do próprio lesado como as dos familiares dele dependentes, cabendo ao julgador, na fixação da renda provisória, ter em conta as regras do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, ou seja com recurso à equidade".

Nota - As decisões sobre o arbitramento de reparação provisória despertam-me sempre alguma curiosidade, por fazerem apelo àquilo que, no sumário acima transcrito, se designa por "regras do bom senso prático".
Por regra, não transcrevo grandes segmentos da fundamentação, mas considero que, neste caso, alguns pontos merecem destaque.
O acórdão começa por analisar se o tribunal de primeira instância deveria ter dado como provado um rendimento mensal do requerente de €4000. A fundamentação da decisão,nesta parte tem algum interesse:
"Ora, encontrando-se junto aos autos documentos emitidos pela requerida comprovativos de que aquela, na qualidade de responsável pelos danos derivados do acidente, aceitara pagar à requerente, desde a data do acidente até Setembro de 2006, como indemnização pela perda dos rendimentos derivados do trabalho a quantia mensal de € 3500, tem-se por aceitável, mas apenas em sede da dita prova sumária legalmente exigida no âmbito do presente procedimentos cautelar, a presunção (judicial) de que os rendimentos da requerente seriam, em média da ordem do valor pago, já que não é crível que a seguradora tivesse aceite pagar aquele montante sem se certificar minimamente do valor dos rendimentos mensais auferidos pela requerente à data do acidente.
E embora se entenda que, não obstante tratar-se de facto negativo, a prova de que a requerente não tinha quaisquer outros rendimentos, competia à autora, acompanha-se o entendimento daqueles que, nestes casos, consideram dever haver uma menor exigência na prova (cfr. Antunes Varela, RLJ., ano 116, p.338 e 341), admitindo-se mesmo que a parte contrária deva, num espírito de colaboração leal, perante uma alegação consistentemente feita, desenvolver algum esforço de contraprova e não limitar-se a uma pura impugnação.
Daí que, contrariamente ao defendido pela agravante se entenda que, no caso e no tipo de processo em causa, não é de alterar a matéria de facto tida como indiciariamente provada, designadamente o segmento relativo ao valor dos rendimentos médios mensais auferidos pela requerente na data do acidente".
Mais adiante, quanto à determinação do montante da renda, escreve-se o seguinte (aproveito para fazer a ligação à jurisprudência citada):
"Como afirma Abrantes Geraldes, em Temas da Reforma do Processo Civil, IV vol., p. 136 “(…) o preceituado no art. 403º, nº 2, não deve corresponder necessariamente à medida da protecção alimentícia, do mesmo modo que não pode cingir-se aos quantitativos necessários para compensar a perda de poder económico para provimento do sustento e da habitação.
“Por contraposição com o nº 4, o conceito de necessidade a que se reporta o nº 2 é mais amplo e pode envolver, de acordo com o normal padrão de vida do lesado, componentes ligadas à diminuição do bem-estar, da educação ou do vestuário, que não apenas as atinentes à capacidade de almejar o seu próprio sustento ou de prover à sua habitação”.
E compreende ainda não apenas as despesas do próprio lesado como as dos familiares dele dependentes, cabendo ao julgador, na fixação da renda provisória, “ter em conta as regras (…) do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida”, ou seja com recurso à equidade “que tanto pode servir para moderar o quantitativo como para aumentá-lo, de acordo com as circunstâncias” do caso (autor e obra citada e acórdão do STJ, de 10.02.98, CJ/STJ, tomo 1, p. 65, aí citado, p. 150 e 151)
E assim tem entendido também grande parte da jurisprudência (v. por todos, para além do acórdão do STJ citado, também por exemplo, o acórdão da R. do Porto, de 16.01.2006 em www.dgsi.pt).
Neste contexto normativo e vistos os factos apurados, designadamente os encargos da requerente e a composição do seu agregado familiar, conclui-se que a quantia arbitrada pelo tribunal recorrido, correspondente a cerca de 50% do valor médio tido por auferido por aquela, é, não obstante o valor sensivelmente inferior das despesas provadas da requerente, a adequada para a suprir a “situação de necessidade” da requerente, decorrente do acidente de que foi vítima".
Este entendimento, relativamente generoso, das regras para apurar o montante da renda, à luz do n.º 4 do artigo 403.º do CPC parece ser o mais ajustado à tutela dos interesses que a norma visa proteger. O valor elevado da renda reflecte, de certo modo, o valor, também ele elevado, das normais despesas de sustento e habitação de um agregado familiar nos dias de hoje. Cfr. ainda, neste sentido, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04-03-2002, proferido no processo n.º 0250036.
Sobre o problema da revisão do valor da renda, através da instauração de novo procedimento de arbitramento de reparação provisória, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 04-07-2007, proferido no processo n.º 0752894, e de 16-11-1999, proferido no processo n.º 9921223.
Sobre os efeitos da improcedência, em primeira instância, da acção indemnizatória para o procedimento de arbitramento a ela apenso mas ainda não decidido, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 26-04-2007, proferido no processo n.º 0731623 e de 17-10-2006, proferido no processo n.º 0625119. Para a hipótese de a decisão do procedimento não ter ainda sido proferida, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 06-03-2007, proferido no processo n.º 0720398, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 30-01-2007, proferido no processo n.º 6905/2006-7.
Sobre a relação entre os números 1 e 4 do artigo 403.º do CPC, cfr. o já citado acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-10-2006, proferido no processo n.º 0625119.
Quanto à possibilidade de reparação natural no arbitramento de reparação provisória, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05-12-2005, proferido no processo n.º 0554946.
Considera que a dita providência não se estende a pessoas colectivas o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11-12-2003, proferido no processo n.º 0336087.
Sobre a inviabilização, pelo requerente, do cumprimento das obrigações do requerido, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18-01-2007, proferido no processo n.º 9721/2006-8. Quanto à culpa do requerente na produção do dano, veja-se o acórdão da mesma Relação de 17-03-1998, proferido no processo n.º 0071061.
Pela aplicabilidade da providência, nos termos previstos no n.º 4 do artigo 403.º do CPC, às hipóteses de responsabilidade contratual (designadamente em contrato de trabalho) pronuncia-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 03-11-2004, proferido no processo n.º 9554/2003-4. Contra, o acórdão da mesma Relação de 05-02-1998, proferido no processo n.º 0070462.
Sobre a responsabilidade do Fundo de Garantia Automóvel na reparação provisória, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-06-2007, proferido no processo n.º 4197/06.8TJCBR-A.C1.



2) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4297/2007-7:
"Numa acção em que é demandado apenas um réu, o facto de a carta registada com aviso de recepção remetida para citação desse réu ter sido endereçada também em nome do marido, que não era demandado, não implica a nulidade da citação, por preterição de formalidade prescrita na lei (artigo 198.º/1 do Código de Processo Civil) verificando-se que a defesa da ré demandada não ficou prejudicada visto que ela recebeu a carta que lhe era dirigida e assinou o aviso de recepção.
De facto a ré teve oportunidade de tomar contacto com a petição inicial e, assim, poder defender-se, não sendo, portanto, aquele lapso causal relativamente à entretanto alegada ausência de conhecimento do acto de citação por, segundo a ré referiu, ter entregue a carta ao marido".

Nota - Parece-me ajustada a decisão, embora conte com um voto de vencido (da relatora original do processo).
Convence-me o entendimento, constante da fundamentação, segundo o qual, neste caso concreto, os erros da secretaria
"não são (...) causais relativamente à alegada ausência de conhecimento do acto de citação. Não foi em virtude destes erros que a Ré deixou de poder ler a petição inicial e todo o expediente que recebeu em mãos, bem como de compreender o conteúdo do acto que lhe foi transmitido – com a importância conferida pela chancela consistente na sua assinatura, aposta no aviso de recepção relativo a uma carta vinda do Tribunal Cível de Lisboa".
A verdade é que a carta era dirigida também à ré (embora não só a ela) e a falta de conhecimento ser-lhe-á imputável, pelo menos a título de negligência, ao não procurar conhecer o seu conteúdo, apesar de a ter recebido pessoalmente.
Note-se que a citação pessoal (realizada pela
"entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção" - cfr. artigo 233.º, n.º 2, al. a) do CPC), se considera realizada na data em que é assinado o aviso e que a falta de citação só poderá ser invocada quando o não conhecimento do seu conteúdo não é imputável ao citando (cfr. artigo 195.º, n.º 1, al. e) do CPC).


3) e 4) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 6140/2007-7 ("O artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro deve considerar-se tacitamente revogado pela Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril no que respeita à matéria atinente à competência territorial"), e decisão individual do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-07-2007, proferida no processo n.º 6604/2007-7 ("O artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro deve considerar-se tacitamente revogado pela Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril").

Nota - Juntei estas duas decisões por serem praticamente idênticas no seu conteúdo. A questão em causa divide a jurisprudência, tendo sido já tratada aqui no blog. Actualizo, pois, as notas anteriores.
Elas divergem de outras já analisadas neste blog, designadamente os acórdãos do mesmo tribunal de 15-02-2007, proferido no processo n.º 1180/2007-8, e de 06-03-2007, proferido no processo n.º 7958/2006-1, (cfr., respectivamente, aqui e aqui), mas estão em linha com os acórdãos da mesma Relação de 22-03-2007, proferido no processo n.º 1935/2007-8 (anotado aqui), de 29-05-2007, proferido no processo n.º 4386/2007-7 (referido no ponto "2)" deste post), e de 29-05-2007, proferido no processo n.º 4117/2007-7 (referido no ponto "1)" deste post).
São estas as sete decisões que conheço sobre a matéria em causa (como também já referi, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14-09-2006, proferido no processo n.º 6952/2006-8, embora, à primeira vista, trate de questão semelhante, ocupa-se de outra: a inaplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 54/75 de 12/02 ao mutuante que tem a seu favor inscrita registo de reserva de propriedade de veículo automóvel).
Embora a argumentação que se encontra nos acórdãos que seguem a linha das decisões anotadas seja interessante, não me convence ao ponto de considerar que o legislador pretendeu revogar a lei especial, continuando, pois, na linha dos outros dois acórdãos, convencido da vigência do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 54/75 de 12/02, que não terá sido revogado pela Lei n.º 14/2006 (ou seja, entendo que a revogação da lei geral não implica a revogação da lei especial, por entender que não há motivos evidentes para concluir que foi outra a vontade do legislador).
Mantenho, por isso, alguma dúvida, quanto a esta matéria. A propósito, note-se o relator do citado acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-05-2007, proferido no processo n.º 4386/2007-7 (desembargador Abrantes Geraldes) alterou ali a posição anteriormente assumida, enquanto adjunto, em acórdão anterior (não publicado), espelhando assim, de certo modo, as dificuldades de interpretação dos preceitos em causa.

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terça-feira, setembro 25, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 2 de 4)

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4830/2007-1:
"Os créditos que tiverem sido verificados ou reconhecidos no processo de execução não têm de ser reclamados novamente na fase de falência e, se o forem não podem ser desatendidos, pois a sentença de verificação e reconhecimento proferida na fase executiva constitui caso julgado em todo o processo, excepto quanto à graduação. Esta fica sem efeito, devendo ser substituída por outra a fazer oportunamente na falência, sendo o que resulta do disposto nos artºs 188º/4 e 196º/4, ambos do CPEREF.
Se, anteriormente o credor/reclamante não reclamou expressamente os juros de mora e, adoptou em sede de recurso uma posição completamente contraditória com o comportamento por si anteriormente assumido, actua claramente num “venire contra factum proprium”, o que constitui uma das vertentes do abuso de direito e, portanto, inadmissível"
.

Nota - A verificação de créditos impor-se-á, à luz das normas citadas do já revogado CPEREF, a saber:
"Artigo 188.º
Reclamação de créditos
(...)
4 - Consideram-se devidamente reclamados o crédito do requerente da falência, bem como os créditos exigidos nos processos em que já tenha havido apreensão de bens do falido ou nos quais se debatam interesses relativos à massa, se esses processos forem mandados apensar aos autos da falência dentro do prazo fixado para a reclamação, e ainda os créditos reclamados no processo de recuperação que tenha antecedido o processo de falência, sem prejuízo da possibilidade de os credores apresentarem nova reclamação, em substituição da anterior, se nisso tiverem interesse.

Artigo 196.º
Saneamento do processo
(...)
4 - Consideram-se reconhecidos os créditos não impugnados e os que tiverem sido aprovados na tentativa de conciliação; consideram-se ainda reconhecidos os demais créditos que possam sê-lo face aos elementos de prova contidos nos autos."

Não fazendo sentido aproveitar a graduação da execução, em face da presença de novos credores na falência, o aproveitamento da verificação dos créditos implica que o acórdão tenha considerado (embora não analise esta questão explicitamente) que os credores da falência que não intervieram na execução são terceiros juridicamente indiferentes em relação à decisão de verificação (embora eventualmente afectados economicamente por ela) - daí estender-se-lhes a força do caso julgado.
Sobre a distinção entre terceiros juridicamente indiferentes e terceiros juridicamente interessados para efeitos de extensão do caso julgado, particularmente no que toca a reflexos desta qualificação na verficação e graduação de créditos, cfr.
este post anterior, em anotação ao acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08-05-2007, proferido no processo n.º 267/04.5TBOFR-A.C1.
Quanto ao segundo ponto, parece-me que bastaria, para negar a pretensão de reclamação (tardia) de juros de mora a menção de que, não tendo estes sido reclamados oportunamente, a sua consideração violaria o princípio do pedido (argumento que o acórdão invoca na sua fundamentação), não me parecendo tão evidente que esta reclamação tardia configure um venire contra factum proprium (o reclamante não assume uma posição contrária à anterior, apenas pretendendo um "plus" em relação a ela; não pretende o oposto, mas um complemento).



2)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4133/2007-6:
"O embargo de obra nova, seja o embargo de obra nova judicial ou extrajudicial, tem em vista suspender provisoriamente uma obra, cuja execução ofenda o direito de propriedade, singular ou comum, qualquer outro direito real de gozo ou a posse do requerente e cause ou esteja na iminência de lhe causar prejuízos.
A vistoria
ad perpetuam rei memoriam consubstancia uma diligência de produção antecipada de prova obrigatória nos processos de expropriação urgentes, que se insere na fase administrativa do processo expropriativo, anterior à fase da arbitragem, destinada a fixar os elementos de facto susceptíveis de desaparecerem e cujo conhecimento seja de interesse ao julgamento do processo (artigos 15º nº 2 e 20º nº 1 al. c) do citado Código das Expropriações).
Este auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam mune a expropriante do poder de “utilizar” a parcela expropriada para os fins da expropriação, lavrando o auto de posse administrativa e dando início aos trabalhos.
A natureza meramente declarativa do registo predial não permite radicar o juízo relativo à integração ou não de uma parte do edifício na parcela expropriada, no confronto da descrição predial relativa ao prédio, só parcialmente expropriado, com a inscrição subsequente à expropriação"
.

Nota - Estava em causa, aqui, o embargo de uma obra de demolição, no âmbito de um processo expropriativo, de uma parte de um edifício que os requerentes entenderam não estar incluído na parcela expropriada.
Sobre a competência dos tribunais comuns para o conhecimento deste pedido, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
de 04-12-2006, proferido no processo n.º 6131/2006-8 ("O procedimento cautelar é sempre dependência de causa que tenha por fundamento o direito acautelado (artigo 383.º,n.º1 do Código de Processo Civil). A providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova visando a demolição de parte do edifício, relativamente à qual se discute a inclusão em área expropriada a favor da requerida, não se encontra na dependência do processo de expropriação visto que neste o que está em causa é a determinação do montante indemnizatório devido aos expropriados."). A posição deste acórdão não é, porém, pacífica na jurisprudência, encontrando-se, em sentido oposto, pelo menos um outro, do Tribunal da Relação do Porto, de 07-06-2001, proferido no processo n.º 0130815.
A parte restante do sumário acaba por dizer respeito à prova que decorre da junção de uma certidão de registo predial, que não abrange a descrição do prédio (cfr., neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 14-12-2006, proferido no processo n.º 06B3684, e de 10-03-1998, proferido no processo n.º 97A710, e do Tribunal da Relação do Porto de 26-10-2006, proferido no processo n.º 0634775; para maior desenvolvimento sobre a função e efeito probatório do registo predial, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10-10-2006, proferido no processo n.º 2015/06.6YRCBR).
No caso concreto, à falta de melhor prova do que a certidão junta, a requerente não logrou provar a titularidade da parte da parcela em causa.



3)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 5455/2007-6:
"O Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores apenas assegura o pagamento das prestações de alimentos devidas a menores, em substituição do devedor originário, a partir do momento em que ocorre a notificação da decisão do tribunal, não tendo aplicação, no caso, a regra inserta no artigo 2006º do Código Civil, segundo o qual os alimentos são devidos desde a proposição da acção.
Aquela prestação social não visa substituir definitivamente uma obrigação legal de alimentos devida a menor, antes propiciar uma prestação a forfait de um montante por regra equivalente, mas que pode ser maior ou menor, ao que fora fixado judicialmente, revestindo natureza subsidiária, visto que é seu pressuposto legitimador a não realização coactiva da prestação alimentícia já fixada através das formas previstas no art. 189º da OTM
Tal prestação é uma prestação actual, independente ou autónoma da anteriormente fixada, em que esta constitui apenas um dos elementos a ponderar na fixação daquela, pois que conforme dispõe o art. 2º da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, o tribunal deve atender na fixação do montante, a não exceder 4 UC por cada devedor, à capacidade económica do agregado familiar da pessoa a cuja guarda se encontre, ao montante da prestação de alimentos anteriormente fixada pelo tribunal e às necessidades específicas do menor"
.

Nota - Sobre a matéria citada existem três correntes jurisprudenciais diferentes - cfr.
este post anterior e ainda este, de ontem, em anotação ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4961/2007-8, bem como a jurisprudência citada nos ditos textos.
O próprio acórdão em análise não foi tirado por unanimidade, assim indiciando aquela divisão.


4)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 3920/2007-6:
"Tendo sido ordenada a citação da requerida para os termos do recurso e da causa no despacho que admitiu o recurso de agravo do indeferimento liminar da petição do procedimento cautelar interposto pelos requerentes, sobre este despacho, que não foi impugnado e versou unicamente sobre a relação processual, formou-se caso julgado formal, adquirindo força obrigatória dentro do processo (artigo 672º), não sendo já passível de qualquer juízo de reponderação.
Vindo a requerida, na sequência do mesmo despacho, oferecer a sua oposição, à qual os requerentes responderam através da apresentação de nova alegação de recurso, é manifesto que a oposição da requerida é extemporânea por ter sido apresentada antes de tempo, visto que o prazo para a prática de tal acto só se iniciaria com a notificação em primeira instância da eventual revogação do despacho de indeferimento liminar. (nº 4 do artigo 234º-A).
Dessa extemporaneidade não deriva qualquer consequência, designadamente a sua inadmissibilidade. Tal como sucede quando as partes oferecem os meios de prova com a petição inicial nos casos em que deveriam fazê-lo apenas no momento previsto no artigo 512º, praticado o acto antes de tempo, apenas se aguardará que surja o momento processual adequado para ser tomado em consideração e, nesse caso, dele extrair as consequências legais.
Assim, a oposição apresentada não conferia aos requerentes o direito de apresentar nova alegação de recurso, ainda que sob o pretexto do exercício do direito do contraditório, só podendo agir dentro do quadro legal subsequente ao exercício do contraditório previsto nos artigos 385º a 388º.
Fixando a citação “os elementos definidores da instância”, é lícito ao autor ou requerente proceder à modificação subjectiva ou objectiva da instância desde que a mesma preceda a citação, só sendo a instância alterável, depois da citação ocorrer, se a lei geral ou especial o permitir, nomeadamente o disposto nos artigos 269º a 273º.
Aos titulares de direito real de habitação periódica é reconhecido o direito de integrar a respectiva assembleia geral, pressupondo a sua participação nesta o prévio conhecimento das questões que nela serão objecto de discussão e que lhes sejam facultados todos os elementos necessários a essa participação, nomeadamente, as contas respeitantes à utilização das prestações periódicas pagas pelos referidos titulares e as dotações do fundo de reserva (artigos 34º e 35º do DL nº 275/93, de 5 de Agosto, alterado pelo DL 180/99, de 22 de Maio, e pelo DL 22/2002, de 31 de Janeiro), diploma que teve, além do mais, em vista reforçar o grau de protecção dos adquirentes de direitos reais de habitação periódica.
Tendo a requerida pedido a suspensão das deliberações e tendo ocorrido a citação de, pelo menos, um dos requeridos no respectivo procedimento cautelar, não podem tais deliberações ser executadas, pelo que não permitem que os requerentes nelas se fundamentem para alcançar o que propõem com o presente procedimento cautelar (artigo 397º nº 3).
Donde a falta a demonstração, mesmo sumária, da existência de lesão grave ou dificilmente reparável do direito invocado pelos requerentes, o que não significa desprotecção dos direitos que se arrogam, uma vez que podem sempre impugnar as deliberações que vierem eventualmente a ser tomadas e que considerem contrárias à lei e lesivas dos seus interesses
"
.

Nota - Note-se que a citação para os termos do recurso e da causa, simultaneamente, não deve ocorrer quando o requerido não deva ser ouvido antes do decretamento da providência (cfr. o n.º 3 do artigo 234.º-A do CPC), o que aqui não esteve em causa apenas porque a citação não foi oportunamente impugnada.
A comparação, feita no terceiro parágrafo, entre a remessa antecipada da oposição, no procedimento cautelar, e o oferecimento da prova na petição inicial não é a mais perfeita, pois esta última hipótese encontra, ao contrário da primeira, consagração legal expressa (cfr. o artigo 467.º, n.º 2 do CPC). Não me parece de subscrever a posição, sustentada na decisão anotada, de admitir a oposição (intempestiva) no momento da subida do recurso, nem sequer numa lógica de aproveitamento dos actos processuais. Isto porque o acto corre o risco de se tornar inútil, se a Relação confirmar a decisão de indeferimento liminar (como, no caso concreto, veio a acontecer). Cfr., a propósito, o disposto no artigo 137.º do CPC.

É acertada (diria indiscutível) a decisão de não admitir novas alegações na sequência da apresentação intempestiva da oposição.
Parece-me correcta a conclusão final, no sentido segundo o qual as deliberações sociais cuja execução os requerentes, em outro procedimento cautelar, lograram paralisar não constituem factos indiciadores de risco de lesão grave dos direitos destes mesmos requerentes.

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segunda-feira, setembro 24, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 1 de 4)

Aqui fica a primeira de quatro partes com recolha de jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa e respectivas notas. Justifica-se esta (pouco habitual) introdução para chamar a atenção para a primeira decisão, cujos contornos são, no mínimo, inesperados.


1) Decisão individual do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferida no processo n.º 6403/2007-6:
"I. A competência dos Julgados de Paz é uma competência exclusiva e não alternativa.
II. Se a competência fosse meramente alternativa, por se tratar de um desvio à regra, justificava-se que o legislador tivesse prevenido da inexistência de obrigatoriedade de recorrer à jurisdição dos Julgados de Paz.
III. E tanto é uma competência exclusiva que o legislador estabeleceu uma norma transitória a determinar que as acções pendentes à data da criação e instalação dos Julgados de Paz prosseguissem os seus termos nos tribunais onde foram propostas.
IV. Esta norma não faria o menor sentido se a competência dos Julgados de Paz fosse meramente alternativa da dos Tribunais Judiciais, pois que então não haveria qualquer justificação ou fundamento para o desaforamento destas acções, para as quais eram, e continuariam a ser, competentes aqueles tribunais.
V. Não se ignora que no douto acórdão do STJ de 24.05.2007 se uniformizou a jurisprudência nos termos seguintes: “no actual quadro jurídico, a competência material dos julgados de paz para apreciar e decidir as acções previstas no art. 9º, n.º 1 da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, é alternativa relativamente aos tribunais judiciais de competência territorial concorrente”.
VI. Todavia, a interpretação que foi produzida no douto Acórdão uniformizador de jurisprudência, no sentido de que a competência dos julgados de paz é meramente facultativa, viola o princípio da igualdade no acesso à justiça na medida em que coloca apenas nas mãos do autor a opção pelo recurso ao tribunal ou ao julgado de paz, como lhe aprouver, ficando o réu, afinal sem alternativa nenhuma, mesmo quando entenda, quando demandado no julgado de paz, que o tribunal é que lhe oferecia as garantias de defesa de que carecia.
VII. A faculdade de opção alternativa entendida apenas em favor de uma das partes, no caso o autor, viola esta exigência de igualdade de faculdades e de meios de acção e de defesa que a lei estabelece.
VIII. A interpretação feita no mesmo aresto viola o princípio, ou regra, do processo equitativo, que é assegurado, nomeadamente, através da igualdade de armas, que impõe o equilíbrio entre as partes ao longo de todo o processo, na perspectiva dos meios processuais de que dispõem para apresentar e fazer vingar as respectivas teses e que exige a identidade de faculdades e meios de defesa processuais".

Nota - Parece que houve, nesta matéria, uma certa dificuldade em harmonizar a jurisprudência através de acórdão uniformizador.
Na verdade, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07B881 (por mim analisado aqui), com apenas um voto de vencido, uniformou jurisprudência no sentido da não exclusividade da competência dos julgados de paz:
"no actual quadro jurídico, a competência material dos julgados de paz para apreciar e decidir as acções previstas no artº 9º, nº 1, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho, é alternativa relativamente aos tribunais judiciais de competência territorial concorrente".
Que a Relação de Lisboa contrariasse a jurisprudência uniformizada já seria de estranhar. Mas o que torna esta situação ainda mais caricata é a circunstância de se tratar não de acórdão mas de uma decisão individual, que pressupõe o uso da faculdade prevista nos artigos 701.º, n.º 2 e 705.º do CPC, o que, por sua vez, se encontra previsto para as hipóteses em que
"a questão a decidir é simples, designadamente por ter já sido jurisdicionalmente apreciada, de modo uniforme e reiterado, ou [em] que o recurso é manifestamente infundado".
Parece-me evidente que não foi dado um bom uso às ditas normas nem feito a melhor interpretação da função dos acórdãos uniformizadores.
Contrariar um acórdão uniformizador através de decisão individual (que está pensada, entre outras hipóteses, para quando o relator apenas confirma jurisprudência uniformizada) é inusitado e, para mim, dificilmente justificável. Penso que será inédito.
Para um levantamento da jurisprudência sobre a competência dos julgados de paz antes do dito acórdão uniformizador, cfr. este post anterior.


2) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4961/2007-8:
"Na prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a menores incluem-se também as prestações vencidas".

Nota - Sobre esta matéria, havia três correntes jurisprudenciais diferentes. Como tive já oportunidade de referir anteriormente, era possível encontrar decisões que sustentavam que a obrigação do Estado abrange as prestações já vencidas e não pagas anteriores ao pedido contra o Fundo, outras defendendo que inclui apenas as vencidas após tal pedido e, finalmente, uma terceira corrente entendia que só eram devidas as prestações que se vencessem após a decisão.
Citando o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14-12-2006, proferido no processo n.º 0636008 (exemplar, pela vontade de superar divergências doutrinais), aqui fica um levantamento de algumas delas.
"São já muito numerosas as decisões dos tribunais superiores sobre a questão do momento a partir do qual recai sobre o Fundo a obrigação de pagar a prestação de alimentos. E três correntes se têm perfilado.
Uma sustenta que a condenação abrange apenas as prestações vencidas a partir do mês seguinte à data da notificação da decisão (de que são exemplo os muitos arestos citados pelo recorrente e, além de outros, o recente acórdão do STJ, de 6.7.2006, www.dgsi.pt, proc. 05B4278); outra, para quem o pagamento, embora só se inicie no mês seguinte ao da notificação da decisão, reporta-se e abrange as prestações vencidas desde a data em que foi apresentado pedido contra o Fundo (neste sentido, Acs. RC, de 12.4.2005, proc. 265/05, e de 3.5.2006, proc. 805/06; da RG, de 1.6.2005, proc. 587/05-1 e de 11.2.2004, proc. 2269/03-2; da RE, de 30.3.2006, proc. 147/06-2, todos em www.dgsi.pt); e, uma terceira, que defende que o Fundo pode ser condenado a pagar as prestações acumuladas, já vencidas e não pagas pela pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos (neste sentido, Ac. da RL, de 12.7.2001 - confirmado pelo Ac. do STJ, de 31.1.2002 (revista nº 4160/01-2ª), e da mesma Relação, de 24.11.2005 e de 9.6.2005, www.dgsi.pt, procs. 9132/2005-6 e 3645/2005-8; da RC, de 15.11.2005, www.dgsi.pt, proc. 2710/05; da RP, de 25.10.2004, 21.9.2004 e 22.11.2004, www.dgsi.pt, procs. 0454340, 0453441 e 0455508; e desta mesma Relação, de 19.9.2002, este in CJ, 2002, IV, 180, relatado pelo ora também relator)."
Prossegue o acórdão: "A divergência de decisões tem ocorrido mesmo nesta Secção da Relação do Porto. O que – há que reconhecê-lo – em nada é prestigiante para os tribunais e não deixará de causar alguma perplexidade nos menos entendidos em assuntos de justiça.
Entendeu-se, porém, agora, nesta Secção, após análise conjunta da questão, dever assumir-se uma posição consensual e uniforme, esta no sentido de que as prestações de alimentos são devidas desde a data da propositura do respectivo pedido contra o Estado (embora o respectivo pagamento só se inicie no mês seguinte ao da notificação da decisão que fixe a prestação mensal)."
A argumentação, partindo da omissão de lei reguladora do funcionamento do Fundo, passa por aplicar a regra do artigo 2006.º do CC: "os alimentos são devidos desde a proposição da acção (...)".
O acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 19-04-2007, proferido no processo n.º 173/07-2 também segue no mesmo sentido do ali decidido pela Relação do Porto.
No entanto, no acórdão agora anotado perfilha-se o entendimento segundo o qual a obrigação do Fundo abrange todas as prestações vencidas.
Assim, actualmente, o levantamento já feito pode resumir-se ao seguinte:
- no Tribunal da Relação do Porto, é relativamente estável o entendimento segundo o qual "as prestações de alimentos são devidas desde a data da propositura do respectivo pedido contra o Estado (embora o respectivo pagamento só se inicie no mês seguinte ao da notificação da decisão que fixe a prestação mensal)";
- nos restantes tribunais da Relação, continua a haver uma divisão muito grande na jurisprudência, não se apresentando ainda muito claramente uma corrente dominante.


3) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4953/2007-8:
"Numa oposição deduzida a uma execução, tendo o oponente junto no prazo legal o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial, mas por valor inferior ao devido, não tendo o requerimento de oposição sido rejeitado pela secretaria, não pode o juiz ordenar o seu desentranhamento sem dar ao oponente a possibilidade de pagar as quantias em falta, devendo este ser notificado para efectuar o seu pagamento no prazo de dez dias, com a sanção referida no nº 3 do artigo 486º-A do CPC".

Nota - Este acórdão é muito interessante, ao analisar, com muitas cautelas, o regime a que deve estar sujeito o articulado de oposição à execução.
Parte-se do princípio da equiparação do dito articulado à petição inicial (tal como a jurisprudência já vinha, de forma constante, afirmando, quanto aos embargos de executado no regime anterior - cfr os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 09-10-2006, proferido no processo n.º 0654628, do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-11-1991, proferido no processo n.º 0034371, e de 17-12-1991, proferido no processo n.º 0049961), na linha, por exemplo, do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22-02-2007, proferido no processo n.º 0730569.
Isto conduziria, em princípio, a aplicar à oposição à execução o disposto nos artigos 467º, nº 3 e 474º, f) do CPC. No entanto (e é aqui que a argumentação do acórdão anotado se torna especialmente interessante), considerou-se que, no que toca a custas, não deveria ser assim. Citando a fundamentação,
"bem se compreende que a secretaria recuse o recebimento da petição inicial nos casos em que não tenha sido junto o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial ou do pedido de apoio judiciário nos termos da alínea f) do artigo 474º. É que tem então o autor a possibilidade de apresentar nova petição nos termos do artigo 476º, considerando-se a acção proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo. Faculta-se, assim, ao autor um prazo de dez dias para apresentar nova petição, com o documento em falta, ou, se for acaso disso, juntar apenas este documento em igual prazo. Mas esta regra não poderia ser aplicada à oposição, pois tal significaria conceder-se ao oponente (o infractor) um novo prazo de dez para deduzir oposição. A PI, sendo o primeiro articulado, com o qual se inicia a instancia, deverá merecer um tratamento diferenciado, o que já não sucede com a oposição".
Assim sendo, faria mais sentido, no que toca a custas, aplicar ao dito articulado o regime da contestação, constante do artigo 486.º-A do CPC, do qual decorre a solução constante do sumário acima transcrito.
Esta solução de equiparação da oposição à contestação apenas para o dito efeito não é inédita na jurisprudência, encontrando-se, por exemplo, nos acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 16-04-2007, proferido no processo n.º 0750244, do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-11-2006, proferido no processo n.º 6366/2006-2 (considerando este entendimento "admissível"), e do Tribunal da Relação de Guimarães de 08-03-2007, proferido no processo n.º 2564/06-2. O acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09-10-2006, proferido no processo n.º 0654628, manteve-se, nesta matéria, pela equiparação da oposição à petição inicial, embora ali se tenha afirmado
"que não repugnava, para efeitos de pagamento de taxa de justiça, equiparar o opoente antes ao R.. As razões que levaram a fixar um regime diferente para o R., nesta matéria, parece valerem igualmente para o opoente à execução".


4) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 358/2007-8:
"Autorizada pelo senhorio a realização de obras no local arrendado, na sequência de solicitação dos inquilinos, referindo ele que os arrendatários “ podiam fazer as obras desde que não lhe pedissem dinheiro”, provando-se ainda que o senhorio viu as obras depois da sua conclusão, não podem, ele ou aqueles que lhe sucederam na posição contratual, deixar de ser condenados como litigantes de má fé pela acção de despejo movida contra os arrendatários com fundamento em obras não autorizadas susceptíveis de preencher a previsão constante do artigo 64.º/1, alínea d) do R.A.U.".

Nota - Aqui, não estava em causa a situação de facto em que assentava a má fé (que poucas dúvidas suscitará), mas apenas saber se os sucessores da parte que praticou os factos integrantes da má fé devem ser pessoalmente responsabilizados nessa sede.
Quanto a este ponto, considerou que os sucessores "herdaram" a má fé processual do autor.
Tenho algumas dúvidas quanto a uma posição tão simplificada. A sanção por litigância de má fé não deixa de ter uma certa natureza pessoal. É a consequência de carácter sancionatório por um comportamento processual culposo.
Não me parece de subscrever sem mais uma transposição automática da "culpa" da parte para os seus sucessores, havendo que procurar, a meu ver, averiguar em que momento processual foram habilitados os sucessores e quais os meios processuais que, em tal momento, tinham à sua disposição para contrariar a posição (eventualmente consubstanciadora de má fé) que a parte habilitada já tinha marcado no processo. Como vem lembrando a jurisprudência,
"os tribunais devem ser prudentes na condenação por litigância de má fé, apurando-se caso a caso - apreciação casuística onde deverá caber a natureza dos factos e a forma como a negação ou omissão foram feitas" (citação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-10-2002, proferido no processo n.º 02A2185).

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