terça-feira, abril 03, 2007

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (parte 1 de 2)

1) Acórdão de 27-03-2007, proferido no processo n.º 06A4002:
"No cômputo da indemnização pelo interesse contratual negativo (ou dano de confiança) cabem os lucros cessantes, consistentes no proveito que o contraente fiel teria se não tivesse celebrado o contrato.
O lucro cessante, deve determinar-se por critérios de probabilidade ou verosimilhança baseados em factos alegados e provados, com valimento “a se” ou como base de presunção judicial.
É exclusivamente de facto a ilação logicamente necessária por já compreendida nas premissas em termos de normalidade de vida, do conhecimento geral e do senso comum (presunção judicial), sendo da competência das instâncias e ficando a intervenção do STJ limitada à sua admissibilidade ou não face ao disposto no artigo 351º do CC.
O recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – e salvo a situação do artigo 725º do Código de Processo Civil – destina-se a impugnar o Acórdão da Relação e a argumentar contra os seus fundamentos.
Se o recorrente usa a mesma argumentação, com reprodução “pari passu” das conclusões da alegação produzida na apelação, fica plenamente justificado o uso da faculdade remissiva do nº 5 do artigo 713º do CPC, ou, e no limite, uma fundamentação muito sucinta.
"


Nota - No acórdão em apreço, o STJ negou-se a sindicar o não uso de uma presunção judicial, tal como, repetidamente, se nega a sindicar o seu uso, excepto "no sentido de averiguar se ela ofende qualquer norma legal, se padece de alguma ilogicidade ou se parte de factos não provados" (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 09-12-2004, proferido no processo n.º 04B3526, também in CJ, t. III, pág. 204). Assim é porque o uso das presunções judiciais pertence ainda à matéria de facto, encontrando-se por isso reservada às instâncias. Nesta ligação podem encontrar-se decisões judiciais sobre o uso de presunções judiciais anteriormente referidas aqui no blog. Em particular para a definição de presunção judicial, cfr. a nota ao acórdão do STJ de 05-12-2006, proferido no processo n.º 06A3883, que deixei aqui.
Alguns limites à utilização de presunções judiciais podem encontrar-se nos seguintes acórdãos, para além dos indicados nas ligações supra:
- "I – A força probatória das presunções judiciais (da experiência ou de facto) não é mais relevante do que a prova testemunhal. II – Por isso, tendo havido produção de prova testemunhal, não sujeita a registo, o tribunal da Relação não pode alterar a matéria de facto dada como provada na 1ª instância, com base em simples ditas presunções" - acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09-03-1998, in CJ, tomo II, pág. 253.
- "As Relações podem extrair ilacções de facto de matéria provada na 1ª instância, mas o exercício dessa faculdade está condicionado à verificação de quaisquer das situações previstas no nº 1 do artigo 712º do Código de Processo Civil, quando o facto presumido tenha, ele próprio, sido objecto de resposta pelo colectivo (ou pelo tribunal singular)" - acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 03-06-1997, in BMJ 468, pág. 490.
- "I – Sendo lícito ao julgador socorrer-se de presunções judiciais para apreciar a matéria de facto e com base nelas considerar provados outros factos que servirão posteriormente para fundamentar a solução de direito, o certo é que as presunções de que aquele se pode servir têm de respeitar a matéria de facto provada ou, pelo menos, e salvo casos excepcionais previstos na lei, só dentro de limites muito apertados a pode afastar. II – Assim, não é possível qualificar de contratos de mútuo ou de abertura de crédito, passíveis de pagamento de juros, fazendo apelo às regras de experiência do mundo empresarial, as entregas de dinheiro feitas por certa sociedade a duas outras quando estas, como resulta inequivocamente da matéria de facto fixada, se obrigaram, não a restituir os dinheiros daquela recebidos, mas a prestar serviços e fornecer mercadorias para amortizar aqueles adiantamentos" - acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 29-11-1990, in CJ, tomo V, pág. 259.
- "I – As chamadas presunções naturais, judiciais ou de facto constituem meios de prova mediata cuja força probatória é apreciada livremente pelas instâncias. II – Através delas o julgador retira ilações lógicas de certos factos conhecidos para chegar ao conhecimento de outros desconhecidos, guiado por regras práticas e da experiência. III – O Tribunal da Relação pode lançar mão de presunções tirando conclusões da matéria de facto, desde que tais conclusões se limitem a desenvolvê-la, não a contrariando. IV – As presunções retiradas dos factos provados constituem, também elas, matéria de facto, pelo que são insindicáveis pelo Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista" - acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-06-1991, in Acórdãos Doutrinários do STA, n.º 359, pág. 1306.
Quanto ao segundo ponto (elaboração de acórdão por remissão ou com fundamentação muito sucinta, quando o recorrente apenas reproduza, na revista, o teor da alegações de apelação), a decisão está em linha com a jurisprudência dominante (cfr., entre muitos outros, os acórdãos daquele tribunal
de 21-12-2005, proferido no processo n.º 05B2188, de 27-04-2006, proferido no processo n.º 06A945, e de 18-05-2006, proferido no processo n.º 06A1134), o que - diga-se em boa verdade - é solução bem menos drástica do que outra, que também pode encontrar-se na jurisprudência, segundo a qual a reprodução das alegações da apelação na revista implica a rejeição deste recurso por deserção (cfr., por exemplo, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-05-1999, proferido no processo n.º 257/99, da 1ª secção e a declaração de voto aposta no acórdão do mesmo tribunal de 27-04-2006, proferido no processo n.º 06A945).


2)
Acórdão de 29-03-2007, proferido no processo n.º 07B764:
"A fase declarativa dos embargos de executado, estruturalmente extrínseca à acção executiva, configura-se como contra-acção tendente a obstar, por via de impugnação ou de excepção, aos efeitos normais do título executivo.
A admissão de factos por acordo por falta de impugnação pressupõe a possibilidade de apresentação de articulado de resposta, não bastando para o efeito a faculdade de exercício do contraditório a que se reporta o artigo 3º, nº 4, do Código de Processo Civil.
(...)"


Nota - Também no sentido de que a omissão da alegação prevista no artigo 3.º, n.º 4 do CPC não implica a admissão dos factos nos termos dos artigos 490.º e 505.º do CPC, cfr. LEBRE DE FREITAS, A acção declarativa comum, Coimbra: Coimbra Editora, 2000, pág. 122 e ainda, do mesmo autor, parecer publicado na CJ, 1989, t. III, pág. 41.


3)
Acórdão de 27-03-2007, proferido no processo n.º 06A4668:
"O nº 2 do artº 486º do Código de Processo Civil – segundo o qual quando termine em dias diferentes o prazo para a defesa por parte de vários réus, a contestação de todos ou cada um deles pode ser oferecida até ao termo do prazo que começou a correr em último lugar – não é aplicável aos embargos de executado, em caso de pluralidade de executados.
Aliás, o actual do artº 816º, nº 3 do Código de Processo Civil é uma norma interpretativa, que, nos termos do artº 13º do Código Civil, se integra na lei interpretada, dissipando as dúvidas que existiam, ao estatuir expressamente a inaplicabilidade do artº 486º, nº 2 à dedução de embargos
"
.

Nota - O sumário e o texto do acórdão referem-se ao artigo 816.º, n.º 3 do CPC não na sua redacção actual, emergente da
reforma operada pelo Decreto-Lei nº 38/2003, de 8 de Março, mas na redacção anterior, que ainda se referia aos embargos de executado. Hoje, a regra equivalente, referindo-se à oposição à execução, encontra-se no artigo 813.º, n.º 4 do CPC ("Não é aplicável à oposição o disposto no nº 2 do artigo 486º."). Tal regra não existia antes da reforma de 1995/96.
Aplicando o CPC na sua redacção actual, a questão torna-se indiscutível, por força da dita norma.
Defendendo, em aplicação do Código na redacção anterior à reforma (de 1995/96), a solução da inaplicabilidade do artigo 486.º aos embargos de executado, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 15-06-1999, proferido no processo n.º 99A519, de 30-06-1998, proferido no processo n.º 98A737, de 27-05-1999, proferido no processo n.º 99B447 (com um voto de vencido) e de 20-01-1999, proferido no processo n.º 98A1224. Admitindo tal aplicação, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 08-03-1994, proferido no processo n.º 085031, de 14-10-1999, proferido no processo n.º 99B499, e de 16-12-1999, proferido no processo n.º 99B1047.
Para mais desenvolvimentos, cfr. LEBRE DE FREITAS, A acção executiva, 4.ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2004, pág. 198, contendo uma interessante nota histórica a este repeito.

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