terça-feira, setembro 25, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 2 de 4)

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4830/2007-1:
"Os créditos que tiverem sido verificados ou reconhecidos no processo de execução não têm de ser reclamados novamente na fase de falência e, se o forem não podem ser desatendidos, pois a sentença de verificação e reconhecimento proferida na fase executiva constitui caso julgado em todo o processo, excepto quanto à graduação. Esta fica sem efeito, devendo ser substituída por outra a fazer oportunamente na falência, sendo o que resulta do disposto nos artºs 188º/4 e 196º/4, ambos do CPEREF.
Se, anteriormente o credor/reclamante não reclamou expressamente os juros de mora e, adoptou em sede de recurso uma posição completamente contraditória com o comportamento por si anteriormente assumido, actua claramente num “venire contra factum proprium”, o que constitui uma das vertentes do abuso de direito e, portanto, inadmissível"
.

Nota - A verificação de créditos impor-se-á, à luz das normas citadas do já revogado CPEREF, a saber:
"Artigo 188.º
Reclamação de créditos
(...)
4 - Consideram-se devidamente reclamados o crédito do requerente da falência, bem como os créditos exigidos nos processos em que já tenha havido apreensão de bens do falido ou nos quais se debatam interesses relativos à massa, se esses processos forem mandados apensar aos autos da falência dentro do prazo fixado para a reclamação, e ainda os créditos reclamados no processo de recuperação que tenha antecedido o processo de falência, sem prejuízo da possibilidade de os credores apresentarem nova reclamação, em substituição da anterior, se nisso tiverem interesse.

Artigo 196.º
Saneamento do processo
(...)
4 - Consideram-se reconhecidos os créditos não impugnados e os que tiverem sido aprovados na tentativa de conciliação; consideram-se ainda reconhecidos os demais créditos que possam sê-lo face aos elementos de prova contidos nos autos."

Não fazendo sentido aproveitar a graduação da execução, em face da presença de novos credores na falência, o aproveitamento da verificação dos créditos implica que o acórdão tenha considerado (embora não analise esta questão explicitamente) que os credores da falência que não intervieram na execução são terceiros juridicamente indiferentes em relação à decisão de verificação (embora eventualmente afectados economicamente por ela) - daí estender-se-lhes a força do caso julgado.
Sobre a distinção entre terceiros juridicamente indiferentes e terceiros juridicamente interessados para efeitos de extensão do caso julgado, particularmente no que toca a reflexos desta qualificação na verficação e graduação de créditos, cfr.
este post anterior, em anotação ao acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08-05-2007, proferido no processo n.º 267/04.5TBOFR-A.C1.
Quanto ao segundo ponto, parece-me que bastaria, para negar a pretensão de reclamação (tardia) de juros de mora a menção de que, não tendo estes sido reclamados oportunamente, a sua consideração violaria o princípio do pedido (argumento que o acórdão invoca na sua fundamentação), não me parecendo tão evidente que esta reclamação tardia configure um venire contra factum proprium (o reclamante não assume uma posição contrária à anterior, apenas pretendendo um "plus" em relação a ela; não pretende o oposto, mas um complemento).



2)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4133/2007-6:
"O embargo de obra nova, seja o embargo de obra nova judicial ou extrajudicial, tem em vista suspender provisoriamente uma obra, cuja execução ofenda o direito de propriedade, singular ou comum, qualquer outro direito real de gozo ou a posse do requerente e cause ou esteja na iminência de lhe causar prejuízos.
A vistoria
ad perpetuam rei memoriam consubstancia uma diligência de produção antecipada de prova obrigatória nos processos de expropriação urgentes, que se insere na fase administrativa do processo expropriativo, anterior à fase da arbitragem, destinada a fixar os elementos de facto susceptíveis de desaparecerem e cujo conhecimento seja de interesse ao julgamento do processo (artigos 15º nº 2 e 20º nº 1 al. c) do citado Código das Expropriações).
Este auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam mune a expropriante do poder de “utilizar” a parcela expropriada para os fins da expropriação, lavrando o auto de posse administrativa e dando início aos trabalhos.
A natureza meramente declarativa do registo predial não permite radicar o juízo relativo à integração ou não de uma parte do edifício na parcela expropriada, no confronto da descrição predial relativa ao prédio, só parcialmente expropriado, com a inscrição subsequente à expropriação"
.

Nota - Estava em causa, aqui, o embargo de uma obra de demolição, no âmbito de um processo expropriativo, de uma parte de um edifício que os requerentes entenderam não estar incluído na parcela expropriada.
Sobre a competência dos tribunais comuns para o conhecimento deste pedido, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
de 04-12-2006, proferido no processo n.º 6131/2006-8 ("O procedimento cautelar é sempre dependência de causa que tenha por fundamento o direito acautelado (artigo 383.º,n.º1 do Código de Processo Civil). A providência cautelar de ratificação de embargo de obra nova visando a demolição de parte do edifício, relativamente à qual se discute a inclusão em área expropriada a favor da requerida, não se encontra na dependência do processo de expropriação visto que neste o que está em causa é a determinação do montante indemnizatório devido aos expropriados."). A posição deste acórdão não é, porém, pacífica na jurisprudência, encontrando-se, em sentido oposto, pelo menos um outro, do Tribunal da Relação do Porto, de 07-06-2001, proferido no processo n.º 0130815.
A parte restante do sumário acaba por dizer respeito à prova que decorre da junção de uma certidão de registo predial, que não abrange a descrição do prédio (cfr., neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 14-12-2006, proferido no processo n.º 06B3684, e de 10-03-1998, proferido no processo n.º 97A710, e do Tribunal da Relação do Porto de 26-10-2006, proferido no processo n.º 0634775; para maior desenvolvimento sobre a função e efeito probatório do registo predial, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10-10-2006, proferido no processo n.º 2015/06.6YRCBR).
No caso concreto, à falta de melhor prova do que a certidão junta, a requerente não logrou provar a titularidade da parte da parcela em causa.



3)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 5455/2007-6:
"O Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores apenas assegura o pagamento das prestações de alimentos devidas a menores, em substituição do devedor originário, a partir do momento em que ocorre a notificação da decisão do tribunal, não tendo aplicação, no caso, a regra inserta no artigo 2006º do Código Civil, segundo o qual os alimentos são devidos desde a proposição da acção.
Aquela prestação social não visa substituir definitivamente uma obrigação legal de alimentos devida a menor, antes propiciar uma prestação a forfait de um montante por regra equivalente, mas que pode ser maior ou menor, ao que fora fixado judicialmente, revestindo natureza subsidiária, visto que é seu pressuposto legitimador a não realização coactiva da prestação alimentícia já fixada através das formas previstas no art. 189º da OTM
Tal prestação é uma prestação actual, independente ou autónoma da anteriormente fixada, em que esta constitui apenas um dos elementos a ponderar na fixação daquela, pois que conforme dispõe o art. 2º da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, o tribunal deve atender na fixação do montante, a não exceder 4 UC por cada devedor, à capacidade económica do agregado familiar da pessoa a cuja guarda se encontre, ao montante da prestação de alimentos anteriormente fixada pelo tribunal e às necessidades específicas do menor"
.

Nota - Sobre a matéria citada existem três correntes jurisprudenciais diferentes - cfr.
este post anterior e ainda este, de ontem, em anotação ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4961/2007-8, bem como a jurisprudência citada nos ditos textos.
O próprio acórdão em análise não foi tirado por unanimidade, assim indiciando aquela divisão.


4)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 3920/2007-6:
"Tendo sido ordenada a citação da requerida para os termos do recurso e da causa no despacho que admitiu o recurso de agravo do indeferimento liminar da petição do procedimento cautelar interposto pelos requerentes, sobre este despacho, que não foi impugnado e versou unicamente sobre a relação processual, formou-se caso julgado formal, adquirindo força obrigatória dentro do processo (artigo 672º), não sendo já passível de qualquer juízo de reponderação.
Vindo a requerida, na sequência do mesmo despacho, oferecer a sua oposição, à qual os requerentes responderam através da apresentação de nova alegação de recurso, é manifesto que a oposição da requerida é extemporânea por ter sido apresentada antes de tempo, visto que o prazo para a prática de tal acto só se iniciaria com a notificação em primeira instância da eventual revogação do despacho de indeferimento liminar. (nº 4 do artigo 234º-A).
Dessa extemporaneidade não deriva qualquer consequência, designadamente a sua inadmissibilidade. Tal como sucede quando as partes oferecem os meios de prova com a petição inicial nos casos em que deveriam fazê-lo apenas no momento previsto no artigo 512º, praticado o acto antes de tempo, apenas se aguardará que surja o momento processual adequado para ser tomado em consideração e, nesse caso, dele extrair as consequências legais.
Assim, a oposição apresentada não conferia aos requerentes o direito de apresentar nova alegação de recurso, ainda que sob o pretexto do exercício do direito do contraditório, só podendo agir dentro do quadro legal subsequente ao exercício do contraditório previsto nos artigos 385º a 388º.
Fixando a citação “os elementos definidores da instância”, é lícito ao autor ou requerente proceder à modificação subjectiva ou objectiva da instância desde que a mesma preceda a citação, só sendo a instância alterável, depois da citação ocorrer, se a lei geral ou especial o permitir, nomeadamente o disposto nos artigos 269º a 273º.
Aos titulares de direito real de habitação periódica é reconhecido o direito de integrar a respectiva assembleia geral, pressupondo a sua participação nesta o prévio conhecimento das questões que nela serão objecto de discussão e que lhes sejam facultados todos os elementos necessários a essa participação, nomeadamente, as contas respeitantes à utilização das prestações periódicas pagas pelos referidos titulares e as dotações do fundo de reserva (artigos 34º e 35º do DL nº 275/93, de 5 de Agosto, alterado pelo DL 180/99, de 22 de Maio, e pelo DL 22/2002, de 31 de Janeiro), diploma que teve, além do mais, em vista reforçar o grau de protecção dos adquirentes de direitos reais de habitação periódica.
Tendo a requerida pedido a suspensão das deliberações e tendo ocorrido a citação de, pelo menos, um dos requeridos no respectivo procedimento cautelar, não podem tais deliberações ser executadas, pelo que não permitem que os requerentes nelas se fundamentem para alcançar o que propõem com o presente procedimento cautelar (artigo 397º nº 3).
Donde a falta a demonstração, mesmo sumária, da existência de lesão grave ou dificilmente reparável do direito invocado pelos requerentes, o que não significa desprotecção dos direitos que se arrogam, uma vez que podem sempre impugnar as deliberações que vierem eventualmente a ser tomadas e que considerem contrárias à lei e lesivas dos seus interesses
"
.

Nota - Note-se que a citação para os termos do recurso e da causa, simultaneamente, não deve ocorrer quando o requerido não deva ser ouvido antes do decretamento da providência (cfr. o n.º 3 do artigo 234.º-A do CPC), o que aqui não esteve em causa apenas porque a citação não foi oportunamente impugnada.
A comparação, feita no terceiro parágrafo, entre a remessa antecipada da oposição, no procedimento cautelar, e o oferecimento da prova na petição inicial não é a mais perfeita, pois esta última hipótese encontra, ao contrário da primeira, consagração legal expressa (cfr. o artigo 467.º, n.º 2 do CPC). Não me parece de subscrever a posição, sustentada na decisão anotada, de admitir a oposição (intempestiva) no momento da subida do recurso, nem sequer numa lógica de aproveitamento dos actos processuais. Isto porque o acto corre o risco de se tornar inútil, se a Relação confirmar a decisão de indeferimento liminar (como, no caso concreto, veio a acontecer). Cfr., a propósito, o disposto no artigo 137.º do CPC.

É acertada (diria indiscutível) a decisão de não admitir novas alegações na sequência da apresentação intempestiva da oposição.
Parece-me correcta a conclusão final, no sentido segundo o qual as deliberações sociais cuja execução os requerentes, em outro procedimento cautelar, lograram paralisar não constituem factos indiciadores de risco de lesão grave dos direitos destes mesmos requerentes.

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