sexta-feira, abril 13, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 1 de 2)

1) Acórdão de 29-03-2007, proferido no processo n.º 372/2007-6:
"O facto de o CPI, aprovado pelo Decreto Lei n.º 36/2003, de 5 de Março, restringir a intervenção das partes a apenas dois articulados não permite postergar os princípios constitucionalmente consagrados, como é o princípio do contraditório, o qual encontrou expressão, como se referiu, na lei ordinária - artigo 3º do Código de Processo Civil -, garantindo uma participação efectiva das partes no desenrolar do litígio num quadro de lealdade processual que lhes impõe o dever de participar na decisão, em paridade, trazendo ao processo todos os elementos com relevo para a mesma.
Não pode negar-se à recorrente - notificada da resposta apresentada pela recorrida ao recurso por si interposto da decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que concedeu protecção à marca da recorrida, tendo esta invocado nesse articulado a nulidade do registo da marca de que a recorrente é titular e na qual esta fundou a sua pretensão de recusa do registo da recorrida - a oportunidade de tomar posição sobre tal questão, que constitui matéria de excepção, sob pena de violação do princípio do contraditório, posto que não lhe era razoavelmente exigível que previsse que a mesma iria ser suscitada pela recorrida na sua resposta e que a ela tivesse antecipadamente de responder no seu articulado de interposição de recurso"
.

Nota - Esta é uma decisão que reflecte correctamente o sentido do direito ao contraditório. É inegável que este impõe a possibilidade de resposta às excepções alegadas no último articulado admissível.
A única questão que pode aqui levantar-se é a do mecanismo processual mais adequado para concretizar o contraditório, quando a lei (como é o caso do CPI) apenas prevê dois articulados e decisão final, sem uma audiência intercalar onde se possa dar cumprimento ao n.º 4 do artigo 3.º do CPC.
Neste caso, só parecem existir dois caminhos: admitir o articulado não previsto na lei ou abrir uma audiência (também não prevista na lei) para que nela se possa exercer o contraditório. Entre as duas, prefiro a primeira, já que o meio normal de resposta às excepções é o articulado. O n.º 4 do artigo 3.º do CPC, para não tornar o processo mais pesado, aproveita um acto já previsto (uma audiência) para nele encavalitar uma resposta a excepções. Quando não haja acto processual que possa ajustar-se a este fim, considero que será preferível remeter a parte para o meio normal (e mais adequado) ao exercício do contraditório, que é o articulado.
De qualquer forma, a outra solução não me chocaria. Imprescindível é permitir que a parte possa pronunciar-se sobre a matéria de excepção cuja alegação não pôde razoavelmente antecipar. Trata-se de uma exigência, como bem se colocou em destaque no acórdão, com directa implicação constitucional, por derivar do princípio da igualdade das partes, por sua vez ancorado no princípio geral da igualdade.
Para outras aplicações que me parecem importantes do princípio do contraditório, nas suas várias vertentes (entre as partes e entre estas e o tribunal) cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 04-10-2006, proferido no processo n.º 06S2069, de 13-01-2005, proferido no processo n.º 04B4031, de 15-10-2002, proferido no processo n.º 02A2478, de 06-11-2003, proferido no processo n.º 03B3134, e de 29-09-1998, proferido no processo n.º 98A801.
Na jurisprudência constitucional, para além do
acórdão n.º 259/2000, citado na decisão, sobre o contraditório no (e antes do) processo executivo (com dois votos de vencido), cfr. ainda os acórdãos números 209/2004, e 82/2007.


2)
Acórdão de 26-03-2007, proferido no processo n.º 1716/2007-7:
"Não tem subida imediata, mas diferida,ou seja, a subir com o recurso que, interposto, venha a subir imediatamente (decisão final, em princípio) o recurso da decisão que, a título provisório nos termos do artigo 157.º da Organização Tutelar de menores, fixa quantia a título de alimentos provisórios (artigos 185.º da O.T.M. e 734.º a contrario e 735.º do Código de Processo Civil)".

Nota - Sobre a reacção ao despacho do relator de não recebimento do recurso, cfr. o post do próximo Domingo, 15 de Abril.


3)
Acórdão de 22-03-2007, proferido no processo n.º 1935/2007-8:
"A Lei nº 14/2006, de 26 de Abril ao consagrar o domicílio do devedor como “ critério relevante para aferição do tribunal competente” insere-se no declarado objectivo de descongestionamento dos tribunais na sequência do Plano de Acção para o Descongestionamento dos Tribunais conforme Resolução do Conselho de Ministros nº 100/2005, de 30 de Maio, o que expressamente se salienta na Resolução do Conselho de Ministros nº 122/2006 de 7 de Setembro de 2006, DR. Iª Série, nº185 de 25 de Setembro de 2006 e é confirmado na exposição de motivos constante da Proposta de lei nº 389/2005, de 24 de Novembro de 2005 que deu origem à Lei nº 14/2006.
Esse objectivo de descongestionamento, de interesse público não se exprimiu na letra da lei (ver artigo 74.º do Código de processo Civil) limitando a regra de competência territorial apenas às acções enquadráveis na designada litigância de massas; a lei, muito mais ampla, tutela o interesse do consumidor e o acesso aos tribunais de modo efectivo com a alteração em matéria de competência territorial que tem como corolário o pretendido objectivo de descongestionamento dos tribunais
Por isso, à luz do texto legal e das respectivas motivações evidenciadas pelo legislador, pode o intérprete considerar que foi inequívoca a intenção os legislador de revogar a lei especial em matéria de competência territorial constante do artigo 21.º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro pela lei geral constante das alterações introduzidas pela lei nº 14/2006, de 26 de Abril conquanto não sejam atingidas - e não são - as finalidades procedimentais e de direito material que são visadas nos diplomas de natureza especial onde se consagra o especial regime de competência territorial
Não afectadas tais finalidades, pode entender-se que a Lei nº 14/2006, de 26 de Abril revogou o artigo 21º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro"
.

Nota - Esta decisão diverge de outras já analisadas neste blog, designadamente os acórdãos do mesmo tribunal
de 15-02-2007, proferido no processo n.º 1180/2007-8, e de 06-03-2007, proferido no processo n.º 7958/2006-1, (cfr., respectivamente, aqui e aqui). Em conjunto com a decisão anotada, constituem as únicas três decisões que conheço sobre esta matéria (como também já referi, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14-09-2006, proferido no processo n.º 6952/2006-8, embora, à primeira vista, trate de questão semelhante, ocupa-se de outra: a inaplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 54/75 de 12/02 ao mutuante que tem a seu favor inscrita registo de reserva de propriedade de veículo automóvel).
Embora a argumentação que se encontra na decisão anotada seja interessante, não me convence ao ponto de considerar que o legislador pretendeu revogar a lei especial, continuando, pois, na linha dos outros dois acórdãos, convencido da vigência do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 54/75 de 12/02, que não terá sido revogado pela Lei n.º 14/2006 (ou seja, sigo o princípio de que a revogação da lei geral não implica a revogação da lei especial, por entender que não há motivos evidentes para concluir que foi outra a vontade do legislador).
Finalmente, ainda sobre o Decreto-Lei n.º 54/75 de 12/02, designadamente sobre a possibilidade de os mecanismos desta lei poderem ser desencadeados pelo mutuante, cfr.
este post anterior.


4)
Acórdão de 22-03-2007, proferido no processo n.º 1669/2007-6:
"As custas consistem nas despesas que as partes são obrigadas a fazer para a condução do processo, afora as remunerações (honorários) dos seus advogados e as despesas pessoais das próprias partes, isto é, os encargos.
Preparos são as importâncias que vão sendo exigidas às partes a título de antecipação de custas, antes de chegar à altura em que estas devem ser contadas e satisfeitas.
A sentença, ou outra decisão final, deve regular entre as partes o encargo das custas, condenando no respectivo montante uma delas, ou distribuindo-o por ambas, conforme os critérios legais. Com esta condenação é que surge a obrigação das custas, sendo a sentença, nesta parte, sempre constitutiva, e não durante a lide como obrigação eventual ou condicional. Aqueles critérios legais constam principalmente dos artigos 446º e 449º do Código do Processo Civil. Os mais importantes são dois: a) – paga as custas quem dá causa a elas; b) – paga as custas quem tira proveito do processo.
Apesar de à Autora ter sido denegado o benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de preparos e demais custas judiciais, não lhe foram exigidos adiantamentos monetários a título de antecipação de custas já que foi atribuído efeito suspensivo ao recurso desta decisão, prosseguindo, por isso, os autos seus termos, sem que a autora tivesse que pagar taxa de justiça inicial ou subsequente ou tivesse suportado qualquer outro encargo.
Assim, porque é a sentença que regula entre as partes o encargo das custas e tendo a Autora obtido ganho definitivo da acção, não tem esta que suportar as custas, razão por que inexiste qualquer interesse da agravante em ver decidido o recurso por si interposto
"
.

Etiquetas: , , , , ,

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]


Página Inicial