segunda-feira, junho 30, 2008

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça

O blog regressa à vida, alguns dias mais, antes de férias.

1) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-06-2008, proferido no processo n.º 08B2080:
"I - Na coligação activa, os requisitos de admissibilidade de recurso ordinário plasmados no artº 678º nº1 do CPC, têm de verificar-se em relação a cada uma das acções (causas) cumuladas.
II - O «quantum» dos juros moratórios caídos na pendência da acção, não releva para a determinação dos requisitos a que se reporta o artº 678º nº1 do CPC - valor da causa e medida da sucumbência."

Nota - Quanto ao primeiro ponto, a questão parece ser quase pacífica, na jurisprudência, que considera que o que se verifica nestes casos é a união, num mesmo processo, de pretensões que, à partida, poderiam correr em acções separadas. Quanto a tal questão, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22-11-2006, proferido no processo n.º 06S2332, de 05-02-2003, proferido no processo n.º 03S2175 (aqui, porém, com um voto de vencido), de 25-06-1992, proferido no processo n.º 083431 (também in BMJ n.º 425, pág. 473), e de 04-07-1995, proferido no processo n.º 087410, do Tribunal da Relação do Porto de 16-01-2006, proferido no processo n.º 0514520. Para um caso de coligação seguida de reconvenção, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-05-2005, proferido no processo n.º 05S362.
Já não me parece que assim deva ser no caso de litisconsórcio, atenta a unidade da pretensão em causa.
O segundo ponto parece ser pacífico também, desde logo atendendo à circunstância de aqueles juros não relevarem para a determinação do valor da causa (cfr., nesse sentido, para além do CPC, que o afirma directamente no artigo 306.º, n.º 2, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-01-1997, proferido no processo n.º 0011466).



2) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-06-2008, proferido no processo n.º 08A1714:
"I – É materialmente competente o tribunal comum para conhecer do pedido de condenação do Município de Lisboa no pagamento do preço de um contrato de compra e venda de mobiliário, fornecido por um particular ao Município de Lisboa, sendo tal aquisição efectuada através do procedimento pré-contratual administrativo regulado pelo dec-lei 55/95, de 29 de Março .
II – A prescrição presuntiva funda-se na presunção de cumprimento .
III – A invocação da prescrição presuntiva supõe o reconhecimento de que a dívida existiu, sendo que a tal o devedor contrapõe que essa dívida se acha extinta pelo pagamento, que a lei presume .
IV - Para pode beneficiar da invocada prescrição presuntiva, o réu terá de afirmar, claramente, que o pagamento reclamado já foi efectivamente realizado.
V – Essa afirmação não pode considerar-se implícita na simples invocação da prescrição presuntiva."

Nota - Um erro frequentíssimo na alegação das prescrições presuntivas decorre do esquecimento de algo tão simples como isto: ao estabelecer uma presunção, a lei libera a parte que dela beneficia do ónus da prova, mas não a libera do ónus da alegação do facto presumido.
A jurisprudência é imensa e constante, a este respeito. Leiam-se, a título de exemplo, os seguintes acórdãos.
- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-12-2003, proferido no processo n.º 03B3894:
"As alíneas a) e c) do artº 317º do C. Civil [no acórdão refere-se, por lapso, o artigo 312.º do CC] contemplam as chamadas presunções de curto prazo ou prescrições presuntivas.
Distinguem-se tais "prescrições presuntivas" das chamadas "prescrições verdadeiras", pois que enquanto nestas, mesmo que o devedor confesse que não pagou, não deixa por isso de funcionar a prescrição, naquelas se o devedor confessa que deve, mas não paga, é condenado na mesma maneira, não funcionado pois a prescrição mesmo que invocada.
A presunção de cumprimento pelo decurso do prazo pode ser ilidida por confissão - judicial ou extrajudicial - do devedor originário - esta última só relevando quando for realizada por escrito (artº 313º, nº 2, do C. Civil).
Nas presunções deve distinguir-se entre o facto base da presunção e o facto presumido. A lei dispensa a parte que beneficia da presunção da prova do facto presumido - n° 1 do artº 350º do C. Civil. Mas não a dispensa da prova do facto que serve de base à presunção.
O devedor só poderá beneficiar da prescrição presuntiva se alegar que pagou, ou que, por qualquer outro motivo, a obrigação se extinguiu, não lhe bastando invocar o decurso do prazo.
Devem ser considerados como admitidos por acordo, porque não especificadamente impugnados, os factos alegados pelo credor acerca da não satisfação atempada pelo Réu devedor dos créditos reclamados e das respectivas interpelações para cumprimento, sendo que a não impugnação especificada desses factos é, no fundo, tradutora da prática em juízo de "actos incompatíveis com a presunção de cumprimento" - ou seja a confissão tácita de que a dívida não foi paga (artº 490º, nº 2, do CPC)".
- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13-12-1993,
in Colectânea de Jurisprudência, 1993, tomo V, pág. 240:
"I - Se a prescrição é extintiva, o devedor não necessita de alegar que nunca deveu ou que já pagou, bastando-lhe invocar o decurso do prazo. II - Mas, se a prescrição é apenas presuntiva (prescrição de curto prazo), o devedor só pode beneficiar dela desde que alegue que pagou, ou que por outro motivo a obrigação se extinguiu, não lhe bastando invocar o decurso do prazo. III - Na falta de impugnação especificada dos factos constitutivos da obrigação, entende-se que o demandado confessa tacitamente a dívida. IV - Pelo que, se a prescrição invocada é presuntiva, a acção procede logo no saneador".
- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de de 01-06-1995, proferido no processo n.º 9530095:
"I - A negação da dívida sujeita à prescrição de curto prazo presuntiva do pagamento prejudica a invocação desta prescrição.
II - O devedor de uma dívida dessas tão só pode socorrer-se de tal prescrição se alegar que pagou e que, em todo o caso, sempre tal se presumiria atenta a prescrição".
- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de de 18-10-2001, proferido no processo n.º 0131354:
"A presunção de cumprimento pelo decurso do prazo só pode ser ilidida por confissão judicial ou extrajudicial do devedor originário ou daquele a quem a dívida tiver sido transmitida por sucessão.
Considera-se confessada a dívida se o devedor se recusar a depor ou a prestar juramento no tribunal ou praticar em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento.
São exemplos de actos daquela natureza negar o devedor a existência da dívida, discutir o seu montante, invocar contra ela compensação ou remissão, invocar a gratuitidade dos serviços".
- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de de 06-06-2006, proferido no processo n.º 1498/2006-7:
"Os créditos prestados no exercício de profissão liberal prescrevem no prazo de dois anos nos termos dos artigos 312.º e 317.º, alínea c) do Código Civil.
A prescrição é presuntiva o que significa que não basta ao devedor invocar a presunção, impondo-se-lhe ainda de alegar expressamente o pagamento para beneficiar da presunção.
Ainda que se defenda que a invocação da presunção traz implícita a alegação de pagamento, a partir do momento em que o A., na petição, alega expressamente que o réu reconheceu a dívida tendo sido instado a pagá-la, mas não o tendo feito, não impugnada esta efectiva alegação, o facto em causa não pode deixar de se considerar admitido por acordo (artigo 490.º,n.º2 do Código de Processo Civil), traduzindo confissão que é precisamente o meio que a lei reconhece idoneidade para afastar a prescrição presuntiva (artigos 313.º e 314.º do Código Civil)".


3) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2008, proferido no processo n.º 08B278:
"1. É válida a cláusula estabelecida num contrato de concessão comercial, celebrado em 01.01.2002, entre uma sociedade espanhola, com sede em Madrid (concedente) e uma sociedade portuguesa, com sede em Braga (concessionária), segundo a qual a interpretação e o cumprimento do contrato, com sujeição ao convencionado sobre o direito aplicável – que é, de acordo com cláusula anterior, “o Código de Comércio, o Código Civil e as demais normas legais espanholas que sejam aplicáveis” – “ficam submetidas à jurisdição, com exclusão de quaisquer outros, dos Juízos do Tribunal de Madrid”.
2. A validade dessa cláusula pode afirmar-se quer à luz do disposto no art. 23º, n.º 1 do Regulamento (CE) 44/2001 do Conselho, de 22.12.2000 – cujas disposições são aplicáveis às acções judiciais intentadas posteriormente à sua entrada em vigor – quer face à regra, de conteúdo idêntico, do art. 17º da Convenção de Bruxelas de 27.09.1968, que o Regulamento substituiu entre os Estados-Membros.
3. Estas normas sobrepõem-se às normas de direito interno nacional que dispõem sobre os factores de atribuição da competência internacional e da competência exclusiva dos tribunais portugueses, atenta a regra do primado do direito comunitário e da sua prevalência sobre o direito nacional."

Nota - A validade do pacto decorre clara do Regulamento, não se tratando de nenhuma das excepções previstas no artigo 23.º daquele acto.
A prevalência do Regulamento sobre o direito interno também é pacífica, em face do artigo 8.º da Constituição.

Sobre o regime dos pactos de jurisdição à luz do Regulamento n.º 44/2001, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 16-12-2004, proferido no processo n.º 04B4076, de 15-05-2007, proferido no processo n.º 07B1001, de 14-11-2006, proferido no processo n.º 06A3304, e de 16-02-2006, proferido no processo n.º 05B4294, do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-10-2006, proferido no processo n.º 4661/2006-7, e de 03-11-2005, proferido no processo n.º 9115/2005-8, e do Tribunal da Relação de Guimarães de 25-10-2007, proferido no processo n.º 1977/01-1.
Sobre o regime dos pactos de jurisdição no CPC e na Convenção de Lugano, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-06-2006, proferido no processo n.º 3901/2006-6.
Quanto à possibilidade de requerer o decretamento de uma providência cautelar nos tribunais de um determinado Estado-Membro, ainda que exista pacto de jurisdição atributivo de competência aos tribunais de outro Estado-Membro, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13-03-2007, proferido no processo n.º 696/2007-7.
Cfr. ainda, sobre esta matéria, de Sofia Henriques, a obra de "Os pactos de jurisdição no Regulamento CE n.º 44/2001", Coimbra: Coimbra Editora, 2006.

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sexta-feira, junho 20, 2008

Novidade - Nova edição do CPC anotado (volume I)

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CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - ANOTADO, 2.ª Edição

(Artigos 1.º a 380.º)

Autores: José Lebre de Freitas; João Redinha; Rui Pinto

Local de edição: Coimbra
Editor: Coimbra Editora
ISBN 978-972-32-1592-2
Lançamento em: Junho - 2008
XXIV+712 págs.

€ 39,90

Prática de actos processuais - alteração da Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro

Foi hoje publicada no Diário da República a Portaria n.º 457/2008, D.R. n.º 118, Série I de 2008-06-20, que altera a Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro, que regula vários aspectos da tramitação electrónica dos processos judiciais.

(Foi só para dar a notícia. O regresso é no dia 30.)

sexta-feira, junho 13, 2008

Intermezzo

Durante as próximas duas semanas vou andar praticamente desligado da internet (também faz bem, não faz?).
O blog regressa no dia 30 de Junho.
Até já.

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça

1) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-06-2008, proferido no processo n.º 08A1432:
"- A constituição de unidades prediais distintas a partir de um único edifício passa, necessariamente, no nosso sistema jurídico, pela constituição da propriedade horizontal.
- A modificação das características físicas de uma edificação destinada a comércio e a habitação unifamiliar para um edifício em regime de propriedade horizontal está sujeita a licenciamento prévio das Câmaras Municipais.
- Constitui condição de procedência da pretensão de divisão a demonstração de estarem satisfeitos os pertinentes requisitos administrativos até ao momento em que o tribunal deva pronunciar-se sobre a questão da divisibilidade.
- Indemonstrados os requisitos administrativos de constituição da propriedade horizontal, a indivisibilidade, cujo conhecimento é oficiosamente imposto, não pode deixar de ser declarada."


Nota - A decisão segue a linha do (também nela citado) acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 29-11-2006, proferido no processo n.º 06A3355.
É uma posição que faz todo o sentido já que, de outro modo, serviria o tribunal para contornar requisitos legais (de direito administrativo) da constituição da propriedade horizontal. Cfr. ainda o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
de 22-11-2007, proferido no processo n.º 1824/07-2.
No mesmo sentido, num caso em que os herdeiros pretendiam a constituição da propriedade horizontal num prédio da herança, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 03-07-2003, proferido no processo n.º 03B1747.
Para casos em que se demonstra serem ainda necessárias obras para que o prédio preencha os requisitos necessários à constituição da propriedade horizontal, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa
de 02-03-2006, proferido no processo n.º 1539/2006-6, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 24-10-2006, proferido no processo n.º 40012-A/1985.C1.


2)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-06-2008, proferido no processo n.º 08B1558:
"I . A nulidade de acórdão da Relação, por omissão de pronúncia (1ª parte da al. d) do nº 1 do artº 668º, «ex vi» do prescrito no artº 716º nº 1, ambos do CPC), é fruto da violação do dever consignado na 1ª parte do 1 período do nº 2 do artº 660º, aplicável por mor do vazado no artº 713º nº2, os dois do aludido Corpo de Leis.
II . A nulidade por omissão de pronúncia, quando cometida pelo Tribunal da Relação, não pode ser suprida pelo STJ (artº 731º nºs 1 e 2 do CPC).

III . Também considerado o que os recursos visam (artº 676º nº 1 do CPC), não enferma da predita nulidade o acórdão da Relação que tenha omitido pronúncia sobre questão, não de conhecimento oficioso, antes a qualificar como nova, por não suscitada no Tribunal «a quo», e, consequentemente, sem mácula, não objecto de decisão na 1ª instância."


Nota (Referindo-se, ainda, ao regime dos recursos anterior à reforma, aplicável no processo em apreço) - É pacífica a solução de ordenar a baixa do processo à Relação, para conhecimento da nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do n.º 2 do artigo 731.º do CPC (já o mesmo não sucede quando a nulidade se deve a excesso de pronúncia - cfr. o n.º 1 do mesmo artigo). Assim é porque os poderes concedidos ao STJ, na revista, em caso de nulidade da decisão recorrida, não são tão amplos como aqueles que se reconhecem à Relação, nos termos do n.º 2 do artigo 715.º do CPC.É muito abundante (e constante) a jurisprudência do STJ a este respeito. Vejam-se, entre incontáveis outros, os acórdãos
de 25-01-2007, proferido no processo n.º 06B2750, de 13-03-2007, proferido no processo n.º 07A316, de 14-12-2006, proferido no processo n.º 06A4022, de 07-11-2006, proferido no processo n.º 06A3242, de 23-10-2003, proferido no processo n.º 03B1926, de 13-09-2007, proferido no processo n.º 07B2123, de 08-11-2007, proferido no processo n.º 07B2935, de 08-05-2008, proferido no processo n.º 08B559, e de 27-05-2008, proferido no processo n.º 08B1445.
Para uma análise mais detalhada dos poderes do Supremo na apreciação de nulidades de acórdãos da Relação, cfr. o acórdão
de 11-12-2003, proferido no processo n.º 03B3741.


3)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-06-2008, proferido no processo n.º 08S937:
"1. Tendo-se alegado na petição inicial que o vínculo jurídico-laboral se extinguiu por despedimento e por resolução pelo trabalhador, e pedindo-se, em simultâneo, o reconhecimento da justa causa invocada para a resolução do contrato, o pagamento das retribuições intercalares entre o despedimento e o trânsito em julgado da decisão do tribunal, bem como a indemnização pela resolução do contrato por sua iniciativa, verifica-se uma acumulação de causas de pedir e de pedidos substancialmente incompatíveis, geradores da ineptidão da petição inicial e da nulidade de todo o processo, a impor a absolvição da ré da instância.
2. A ineptidão da petição inicial, no caso de acumulação de causas de pedir e pedidos substancialmente incompatíveis, não é passível de suprimento mediante despacho de aperfeiçoamento, nos termos previstos nos artigos 61.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, 508.º, n.º 1, alínea a), e 265.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
3. Tratando-se de um vício que afecta todo o processo, a ineptidão da petição inicial não é susceptível de suprimento, salvo no caso previsto no n.º 3 do artigo 193.º do Código de Processo Civil
."


Nota - Como já uma vez referi aqui no blog, não há muita jurisprudência sobre a ineptidão da petição inicial por incompatibilidade de pedidos, sendo muito mais abundante a relativa à ineptidão por ininteligibilidade do pedido ou da causa de pedir. Creio que é a segunda vez que surge neste blog.
Assim acontece porque, por regra, a pluralidade de pedidos incompatíveis surge com os ditos pedidos em relação de subsidiariedade ou alternatividade, o que, como é evidente, não conduz à ineptidão (cfr., a propósito, a conclusão VIII do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 19-10-2004, proferido no processo n.º 04B049, e , do mesmo tribunal, o acórdão de 29-10-1998, proferido no processo n.º 98B762, bem como, da Relação do Porto, o de 11-01-1999, proferido no processo n.º 9851251, e ainda o da Relação de Guimarães de 03-07-2002, proferido no processo n.º 183/02-1). Esta dirá respeito, pois, a pedidos cumulativos incompatíveis.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 06-05-2008, proferido no processo n.º 08A966, o sentido em que deve ser entendida a incompatibilidade dos pedidos está muito bem descrito: "A incompatibilidade de pedidos, enquanto vício gerador de ineptidão da petição inicial, só justifica colher tal relevância, determinando a anulação de todo o processo, quando coloque o julgador na impossibilidade de decidir, por confrontado com a ininteligibilidade das razões que determinaram a formulação das pretensões em confronto, irrelevando, para o efeito, o antagonismo que ocorra no plano legal ou do enquadramento jurídico."
Sobre a ineptidão da petição inicial por incompatibilidade substancial dos pedidos (para distingui-la da incompatibilidade formal, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 03-12-1974, proferido no processo n.º 065549, também in BMJ n.º 242, pág. 216, e do Tribunal da Relação do Porto de 09-02-1993, proferido no processo n.º 9240946, e de 01-10-1992, proferido no processo n.º 9220846), podem ler-se os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 29-11-2006, proferido no processo n.º 06A3804, de 07-11-2002, proferido no processo n.º 02B3050, de 18-10-1994, proferido no processo n.º 085965, de 26-11-1987, proferido no processo n.º 075198, e de 06-04-1983, proferido no processo n.º 070881, também in BMJ n.º 326, pág. 400 (não parecendo este último muito exacto, na distinção entre contradição e ininteligibilidade).Sobre o mesmo assunto, podem ler-se os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 09-11-2006, proferido no processo n.º 0635865, de 28-09-2000, proferido no processo n.º 0031106, de 01-02-2000, proferido no processo n.º 9921330, de 19-05-1997, proferido no processo n.º 9750303, de 03-06-1996, proferido no processo n.º 9650371, de 03-10-1994, proferido no processo n.º 9430507, de 30-11-1993, proferido no processo n.º 9340703, de 01-02-1990, proferido no processo n.º 0224649, e de 12-10-1992, proferido no processo n.º 9250485, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 5408/2007-2, de 03-10-2000, proferido no processo n.º 0001954, e de 11-07-1996, proferido no processo n.º 0006836, de 17-03-1994, proferido no processo n.º 0068516.Sobre as consequências da ineptidão de uma primeira petição inicial de uma acção de preferência, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 02-06-1992, proferido no processo n.º 9110614.


4)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-06-2008, proferido no processo n.º 08A1873:
"I - O carácter de urgência atribuído por lei aos procedimentos cautelares implica a não suspensão dos prazos para a prática de actos durante as férias judiciais.
II - A apresentação das alegações de recurso num procedimento cautelar é um acto praticado em processo que a lei define como urgente, logo tramita em férias, não valendo aí a regra geral de suspensão dos prazos
."


Nota - Como é sabido, tem sido algo controversa a matéria sobre que se pronuncia o acórdão, havendo quem entenda que a urgência do processo se esgota com a decisão da primeira instância e outra corrente que defende que a urgência se mantém também em fase de recurso. Esta última posição, que já seria a mais correcta antes da reforma de 1995/96, parece ganhar ainda mais força com a redacção que, naquela alteração, veio a dar-se ao artigo 382.º, n.º 1 do CPC (sobre este argumento retirado do elemento literal, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 23-01-2007, proferido no processo n.º 2352/06.0TJCBR.C1).
Em sentido oposto, podem ler-se, por exemplo, os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 07-02-2006, proferido no processo n.º 0520200, e do Tribunal da Relação de Évora de 16-12-2003, proferido no processo n.º 2108/03-3 (cfr. nota 4 desta última decisão).
Ainda em matéria relacionada, no que a respeita a saber se o disposto no artigo 143.º, n.º 2 do CPC cede perante a norma do artigo 144.º, n.º 1 (é, aliás, um pressuposto lógico do problema em discussão), cfr. o já citado acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23-01-2007, proferido no processo n.º 2352/06.0TJCBR.C1, onde se decidiu-se pela positiva - e bem, a meu ver, como já defendi mais desenvolvidamente aqui, contra, entre outros, o acórdão do STJ de 28-09-2006, proferido no processo n.º 06S2453.
Questão diferente é a de saber se corre em férias o prazo para propositura da acção principal. Dela tratarei noutro momento, caso se justifique, podendo desde já avançar que é hoje praticamente assente que tal prazo não corre em férias.

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quinta-feira, junho 12, 2008

Jurisprudência Constitucional

Foram hoje publicados na II Série do Diário da República os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional:

Acórdão n.º 274/2008, D.R. n.º 112, Série II de 2008-06-12, que julga inconstitucional o anexo à Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, conjugado com os artigos 6.º a 10.º da Portaria n.º 1085-A/04, de 31 de Agosto, na parte em que impõe que o rendimento relevante para efeitos de concessão do benefício do apoio judiciário seja necessariamente determinado a partir do rendimento do agregado familiar.

Acórdão n.º 273/2008, D.R. n.º 112, Série II de 2008-06-12, que julga inconstitucional o conjunto normativo constante do anexo à Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, conjugado com os artigos 6.º a 10.º da Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto, na parte em que impõe que o rendimento relevante para efeitos de concessão do benefício do apoio judiciário seja necessariamente determinado a partir do rendimento do agregado familiar.

Sobre o tema e a jurisprudência do Tribunal Constitucional, cfr. este post anterior.

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-05-2008, proferido no processo n.º 2053/2008-2:
"I – A inscrição no Registo Nacional das Pessoas Colectivas não é condição para a relevância, na ordem jurídica, do condomínio.
II – A tramitação do procedimento cautelar comum é inadequada e inaproveitável para a nomeação judicial de administrador de condomínio prevista no nº 2 do art.º 1435º do Código Civil, a menos que esteja em causa a nomeação urgente e provisória de um administrador tendo em vista proteger um direito que seja alvo de ameaça susceptível de causar ao condómino ou condóminos lesão grave e dificilmente reparável
."


Nota - Quanto ao primeiro ponto, não conheço outra decisão, mas a decisão consagra, a meu ver, a tese mais correcta. O que penso está perfeitamente espelhado na fundamentação do acórdão:
"A lei não confere personalidade jurídica ao condomínio resultante de propriedade horizontal. Os interesses respeitantes ao prédio constituído em propriedade horizontal são titulados por cada um dos respectivos condóminos, esses sim, pessoas singulares ou colectivas, como tal providos de personalidade jurídica. No que diz respeito à administração das partes comuns, os condóminos exprimirão a sua vontade através da assembleia de condóminos, vontade essa que, concretizada em deliberações, deverá ser executada pelo administrador. Apenas para o efeito de actuação em juízo dos condóminos nas questões atinentes às partes comuns do edifício é que a lei reconhece personalidade judiciária ao condomínio (art.º 6º alínea e) do Código de Processo Civil), o qual será representado pelo administrador (art.º 1437º do Código Civil).
O Registo Nacional de Pessoas Colectivas (RNPC) tem por fim organizar e gerir o ficheiro central de pessoas colectivas, apreciar a admissibilidade de firmas e denominações, aí se contendo informação actualizada sobre as pessoas colectivas necessária aos serviços da Administração Pública para o exercício das suas atribuições. Para o mesmo fim conterá esse ficheiro central informação de interesse geral relativa a entidades públicas ou privadas não dotadas de personalidade jurídica (cfr. artigos 1º e 2º do Dec.-Lei nº 129/98, de 13.5, o qual foi objecto de diversas alterações que, porém, não buliram com as regras e artigos ora citados). Será nesta última categoria que caberá a inscrição dos condomínios no RNPC. Porém, tal inscrição não é condição para a relevância, na ordem jurídica, dos condomínios. Estes formam-se através da constituição do prédio em regime de propriedade horizontal, nos termos e com os requisitos previstos nos artigos 1417º e 1418º do Código Civil, seguida da respectiva inscrição no registo predial (art.º 2º nº 1 alínea b) do Código do Registo Predial, aprovado pelo Dec.-Lei nº 224/84, de 06.7, alterado por diversos diplomas que não modificaram o preceito citado).
Assim, a inicial omissão de inscrição do prédio no RNPC não interfere em nada com a actividade dos condóminos objecto destes autos."

Também se me afigura correcta a segunda conclusão, já que, não havendo periculum, não é possível justificar a providência antecipatória a que se refere o sumário.


2)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-05-2008, proferido no processo n.º 3072/2008-6:
"I - A pendência de acção de divórcio litigioso proposto pelo cônjuge marido, com fundamento em violação culposa dos deveres conjugais do outro cônjuge, não implica a suspensão da instância de outra acção de divórcio litigioso proposto posteriormente pelo cônjuge mulher, com base em violação culposa dos deveres conjugais do marido.
II - Propostas duas acções de divórcio, em separado, uma por cada um dos cônjuges, nenhuma delas é prejudicial em relação à outra, pelo que se não justifica a suspensão da instância.
"


Nota - Cfr. também o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 28-07-1970, proferido no processo n.º 063239, também in BMJ n.º 199, pág. 180.
Não dependendo a apreciação de cada um dos pedidos da apreciação do outro, não parece haver fundamento para a suspensão da instância.
O que poderia justificar-se, neste caso, seria, eventualmente, a apensação de processos, nos termos do artigo 275.º do CPC (ou, para os raros tribunais em que vigora o Regime Processual Experimental, a agregação de acções), por se verificarem os pressupostos da reconvenção (artigo 274.º, n.º 2, al. c) do CPC).
Contra a possibilidade de apensação, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 04-05-1978, proferido no processo n.º 067256 (também in BMJ n.º 277, pág. 184), mas a decisão perdeu a actualidade, face ao disposto no artigo 275.º na sua redacção actual (a remeter agora para o artigo 274.º, enquanto que, antes da reforma de 1995/96, remetia apenas para os pressupostos da coligação). Ainda assim, este acórdão contou, na altura, com um voto de vencido (creio que, face à lei então vigente, a posição que venceu foi a mais correcta). O mesmo se diga quanto ao acórdão do mesmo tribunal de 15-10-1980, proferido no processo n.º 068959 (também in BMJ n.º 300, pág. 340, que contou também com um voto de vencido).


3)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20-05-2008, proferido no processo n.º 3305/2008-1:
"I. A falta da causa de pedir não dá lugar ao aperfeiçoamento, nos termos do artº 508º/3 do CPC, não se podendo entender, a decisão recorrida que absolveu a ré da instância por ter julgado procedente a excepção de ineptidão da petição inicial, como constituindo uma “decisão surpresa”.
II. Em caso de falta ou ininteligibilidade dos factos jurídicos em que o A. alicerça o pedido, não deve ser este convidado a aperfeiçoar ou corrigir insuficiências ou imprecisões da p.i., pois estas não são estritamente formais ou de natureza secundária
."


Nota - Parece pacífico que, nos casos de ineptidão da petição inicial, não deve haver convite ao aperfeiçoamento da petição. Veja-se, por exemplo, entre muitos outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 21-11-2006, proferido no processo n.º 06A3687, de 04-06-2008, proferido no processo n.º 08S937, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-04-2008, proferido no processo n.º 2025/2008-2.
A segunda conclusão, porém, pode transmitir, tal como é formulada, uma ideia errada. Na verdade, constando do n.º 3 do artigo 508.º do CPC como fundamento do convite ao aperfeiçoamento da petição inicial a "insuficiência" na exposição da matéria de facto, será de admitir que, em certos casos, o convite à correcção tenha por fundamento a falta de um facto constitutivo do direito, numa causa de pedir complexa (em pormenor, Lopes do Rego, CPC anotado, 2.ª edição, Almedina, 2004, vol. I, pág. 431), pelo que há que ler com cautela a jurisprudência sobre esta matéria (por exemplo, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-09-2006, proferido no processo n.º 06B2772), que, sendo correcta, não afasta em absoluto aquela possibilidade, em casos contados, embora o sumário possa enganar à primeira vista.

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quarta-feira, junho 11, 2008

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Coimbra

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 27-05-2008, proferido no processo n.º 400/2002.C1:
"I – Dispõe a al. a) do art.6º do CPC, que têm ainda personalidade judiciária “a herança jacente e os patrimónios autónomos semelhantes cujo titular não estiver determinado”.
II - Segundo o art. 2046º/C.C., diz-se jacente a herança aberta, mas ainda não aceite nem declarada vaga a favor do Estado.
Enquanto permanece sem aceitação ou declaração de vacatura a favor do Estado, a herança assume provisoriamente o lugar do de cujus e considera-se titular dos direitos e obrigações que a compõem.
III - A indeterminação do titular pode resultar de indeterminação dos sucessíveis ou dos sucessores. Num e noutro caso, a herança é jacente e o seu titular não é determinado. As fórmulas dos citados arts. 2046º e 6º são equivalentes.
IV - A herança impartilhada de titulares determinados não goza de personalidade, e os direitos a ela relativos devem ser exercidos por ou contra todos os herdeiros.
V - Sendo os herdeiros conhecidos, estão determinados. Ainda que não tenham expressamente aceite a herança, pode inferir-se do seu comportamento que tacitamente aceitaram a herança. A aceitação é a conduta normal, para a vida e para a lei.
VI- Embora indivisa mas estando os seus titulares determinados, são eles que têm de figurar como partes numa acção judicial – artº 2091º C. Civ.. A herança ainda não partilhada carece de personalidade judiciária.
VII - Como vem sendo entendimento jurisprudencial e foi decidido no recente acórdão do STJ de 4.12.07 para fixação de jurisprudência, na acção de impugnação de escritura de justificação notarial, tendo sido os RR. que nela afirmaram a aquisição por usucapião do direito de propriedade sobre um imóvel, inscrito definitivamente no registo a seu favor, com base nessa escritura, incumbe-lhes a prova dos factos constitutivos desse direito, sem poderem beneficiar da presunção do registo decorrente do artigo 7º do C. R. Predial."

Nota - Por coincidência, volta aqui, após poucos dias, uma hipótese que levanta o problema da personalidade judiciária da herança.
No dia 5 de Junho, deixei aqui um texto sobre a necessidade de aceitação ou repúdio por todos os herdeiros para que a herança deixe de se considerar jacente (para ele remeto agora - v. aqui).
O caso sobre o qual versa o acórdão anotado é bem mais simples, todavia, pois parece claro que todos os herdeiros haviam aceitado, apenas faltando partilhar a herança. Ora, é pacífico que a herança que foi por todos aceite e ainda não foi partilhada já não goza de personalidade judiciária.
Chama-se, todavia, a atenção para o que se escreveu na conclusão terceira: "A indeterminação do titular pode resultar de indeterminação dos sucessíveis ou dos sucessores. Num e noutro caso, a herança é jacente e o seu titular não é determinado. As fórmulas dos citados arts. 2046º e 6º são equivalentes."
A aceitação que põe termo ao estado de jacente da herança pode, claro está, ser tácita, como se refere no acórdão e é também pacífico (v., por exemplo, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 05-07-2005, proferido no processo n.º 1238/05).
Sobre a representação em juízo da herança jacente (nos casos, claro está, em que tenha personalidade judiciária), cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 09-03-2004, proferido no processo n.º 4090/03, e do Tribunal da Relação de Évora de 15-03-2007, proferido no processo n.º 325/07-2.
Uma vez aceite a herança, terão de intervir na acção herdeiros. Saber se têm de intervir todos os herdeiros ou se basta apenas um é problema ao qual responde o direito substantivo, estabelecendo a regra segundo a qual o exercício dos direitos deve passar por todos eles (cfr. artigo 2091.º do CC), o que se traduz processualmente em litisconsórcio necessário (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-04-2007, proferido no processo n.º 2859/2007-6), regra essa em relação à qual se abrem, porém, excepções (cfr. artigos 2078.º e 2088.º a 2090.º do CC). Para exemplos de aplicação deste princípio, vejam-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 09-10-2007, proferido no processo n.º 47-A/1986.C1, e do Tribunal da Relação do Porto de 09-05-2007, proferido no processo n.º 0720560, e de 07-11-2006, proferido no processo n.º 0622574. Em particular sobre a hipótese do artigo 2089.º, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-01-2004, proferido no processo n.º 03B4310.
Sobre o pedido a formular por um credor da herança já aceite, contra os herdeiros, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31-01-2006, proferido no processo n.º 05A3992.
Ainda a propósito, e para finalizar, chamo a atenção para o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05-07-2006, proferido no processo n.º 0633036: "O tribunal pode, oficiosamente, notificar um executado para, no prazo que lhe for concedido, esclarecer se aceita ou repudia a herança aberta por óbito de outro executado, com a advertência de que, na falta de declaração de aceitação, ou não sendo apresentado documento de repúdio, se tinha a herança por aceite."


2) Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13-05-2008, proferido no processo n.º 380-B/1999.C1:
"I – No processo especial de inventário requerido em consequên­cia da dissolução do casamento, os bens que integram a comunhão são relaciona­dos pelo cabeça-de-casal, o qual indicará o valor que lhes atribui – art.º 1345º e 1346º, ambos do C. P. Civil.
II - O inventário é caracterizado pelo princípio da universalidade, sendo o seu objectivo a partilha de todos os bens e direitos que integram essa comunhão, seja hereditária ou conjugal, uma só vez, visando-se, desse modo, uma partilha igualitá­ria. Com este processo pretende-se colocar termo a uma comunhão que engloba todos os bens que dela fazem parte, independentemente do local onde se situem.
III - Com fundamento no princípio da universalidade dir-se-ia que todos os bens a partilhar, independentemente do local onde se encontrem, deveriam ser relacionados e objecto de partilha, mesmo aqueles situados no estrangeiro.
IV - No entanto, tendo presente que o processo de inventário admite desvios àquele princípio, nomeadamente com a realização de partilhas adicionais ou a remessa dos interessados para os meios comuns, com vista ao apuramento da exis­tência dos bens e/ou da sua titularidade, parece-nos que, quanto aos bens situados no estrangeiro, também aquele princípio terá que ser postergado, quando não esteja assegurada, por convenção ou tratado, a eficácia da partilha efectuada pelo Tribunal Português de bens situados em país estrangeiro.
V - Assim, não existindo qualquer convenção ou tratado do qual Portugal e os E.U.A. sejam subscritores, que assegure a eficácia da sentença de partilha que venha a ser proferida em processo a correr termos nos tribunais nacionais, não deve ser aqui efectuada a partilha dos bens situados nos E. U. A."

Nota - O problema aqui em análise - saber se os tribunais portugueses podem proceder à partilha de bens localizados no estrangeiro - tem dividido os nossos tribunais.
Como se salienta na fundamentação, "a jurisprudência tem vindo a manifestar uma tendência para admitir que o valor dos bens situados no estrangeiro seja tido em conta, somente para o cálculo da quota disponível e correlativamente da legítima, embora esses bens não sejam partilhados". Citam-se, na decisão, os seguintes acórdãos: "S. T. J., de 21.3.85, relatado por Belmiro Cerqueira, BMJ 345, pág. 355, S. T. J., de 25.6.98, relatado por Almeida e Silva, com sumário acessível em www.dgsi.pt, proc. 98B327, T. R. Porto, de 11.4.78, relatado por Costa e Sá, C. J., Ano III, pág. 806, T. R. Porto de 25.10.94, relatado por Paz Dias, com sumário acessível em www.dgsi.pt, proc. 9410188" (estes no sentido da decisão anotada) e "ac. do T. R. Porto, de 11.9.07, relatado por Henrique Araújo, acessível em www.dgsi.pt, proc. 0722005" (este no sentido oposto).
Problema diferente, mas de algum modo relacionado, é o de saber se, partilhados bens imóveis localizados em Portugal num tribunal estrangeiro que não seja um Estado-Membro, e pedida a revisão de sentença estrangeira em Portugal, o disposto na alínea a) do artigo 65.º-A do CPC impedirá a revisão. Sobre este problema, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13-01-2005, proferido no processo n.º 04B3808, do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-05-2007, proferido no processo n.º 5499/2006-6, e de 08-03-2007, proferido no processo n.º 9936/2006-6, do Tribunal da Relação de Coimbra de 03-10-2006, proferido no processo n.º 11/06.2YRCBR, e do Tribunal da Relação de Guimarães de 10-12-2003, proferido no processo n.º 619/03-1, com a advertência, porém, de que é difícil sustentar a aplicabilidade directa do artigo 65.º-A, al. a) do CPC, hoje em dia, já que o artigo 22.º do Regulamento 44/2001 parece forçar a sua aplicação sobre aquela norma, ainda que as partes não se encontrem domiciliadas num Estado-Membro. Mas esta "conversa" terá que ficar para outro momento.


3) Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13-05-2008, proferido no processo n.º 372/04.8TAAND.C1:
"I – A possibilidade de conhecimento do Tribunal da Relação em caso de impugnação da decisão de 1ª instância sobre matéria de facto está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados, com os pressupostos estatuídos no artº 690º-A, nºs 1 e 2,do CPC.
II – Os concretos pontos de facto impugnados devem constar das respectivas conclusões, porque delimitadoras do âmbito do recurso e constituírem o fundamento da alteração da decisão.
III – Já quanto à especificação dos meios probatórios, a lei não impõe que seja feita nas conclusões, podendo sê-lo no corpo da motivação, mas, em todo o caso, impõe-se a obrigatoriedade de conexionar cada facto censurado com os elementos probatórios correspondentes.
IV – Verificando-se uma total omissão sobre o ónus de especificação, por ausência de individualização da matéria questionada, impõe-se a rejeição do recurso sobre a matéria de facto.
V – O artº 181ºda OTM estabelece o incidente de incumprimento quanto ao acordado ou decidido relativamente à situação do menor no âmbito do exercício do poder paternal, onde está abrangido todo e qualquer incumprimento à regulação do poder paternal, incluindo apenas a pensão alimentar, cuja cobrança coerciva se efectiva pelo artº 189º da OTM.
VI - Dado que a obrigação de alimentos assume natureza creditícia, uma vez provado o incumprimento presume-se a culpa do devedor de alimentos, nos termos do artº 799º, nº 1, do C. Civ., pelo que é o devedor quem terá de demonstrar que o não pagamento não procedeu de culpa sua."

Nota - Sobre o recurso em que se impugna a matéria de facto e quais os elementos que devem conter-se nas conclusões, cfr., antes de mais, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08-11-2006, proferido no processo n.º 06S2074, bem como as notas que a ele deixei anteriormente.
Igualmente em sentido semelhante ao constante da decisão anotada, v. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30-10-2007, proferido no processo n.º 07A3366, entendendo, pois, que a indicação do local das gravações onde se encontra(m) o(s) depoimento(s) em que se apoia o recurso deve constar das alegações mas não necessariamente das conclusões. Parece-me ser esta a solução mais razoável. Se a identificação dos pontos da gravação se encontra nas alegações, não há razão para sobrecarregar as conclusões (que devem ser breves) com essa repetição, bastando que delas conste apenas a matéria de facto que se pretende ver alterada. Esta parece ser, actualmente, a jurisprudência dominante no STJ, encontrando-se facilmente outros acórdãos no mesmo sentido (cfr., por exemplo, os de 08-03-2006, proferido no processo n.º 05S3823, e de de 01-03-2007, proferido no processo n.º 06S3405), embora seja possível encontrar jurisprudência do mesmo tribunal em sentido oposto (cfr., por exemplo, o acórdão de 05-02-2004, proferido no processo n.º 03B4145). Na Relação de Lisboa, porém, encontram-se algumas decisões a exigir que as conclusões contenham também os concretos meios de prova que levam a decisão diversa (cfr. os acórdãos de 02-06-2005, proferido no processo n.º 1598/2005-4, de 02-11-2005, proferido no processo n.º 1812/2005-4, e de 18-01-2006, proferido no processo n.º 10696/2005-4). Quanto ao que deverá entender-se como identificação concreta do ponto da gravação onde se encontra o depoimento, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-10-2006, proferido no processo n.º 06A2642.
Quanto ao dever de enunciar quais os concretos pontos de facto que o recorrente entende deverem merecer resposta diferente da que foi dada na decisão recorrida, vejam-se os recentes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21-03-2007, proferido no processo n.º 07P330, de 06-06-2007, proferido no processo n.º 07S742, e de 29-03-2007, proferido no processo n.º 2338/06-3.
Considerando que a falta de indicação das voltas onde se encontram os depoimentos deve dar lugar ao convite ao aperfeiçoamento das alegações, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-02-2007, proferido no processo n.º 06S3541. No entanto, já se entendeu também que "se a falta ou deficiência das conclusões escaparem à análise quer do relator, quer dos juízes-adjuntos e a tramitação do recurso avançar para a fase do julgamento, já não poderá ocorrer o convite a que alude o nº4 do artigo 690 do CPC, por se encontrar ultrapassado o respectivo momento processual e para não se arrastar no tempo o conhecimento dos demais recursos que devam ter lugar no mesmo julgamento" e que tal convite "não tem lugar no âmbito do artigo 690-A do CPC" - cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-10-2005, proferido no processo n.º 05B2407.

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segunda-feira, junho 09, 2008

Jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto

Os dois primeiros acórdãos foram-me gentilmente enviados. Em boa hora, pois não os tinha visto. Tratam de aspectos diferentes do regime de registo das acções.

1) Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24-04-2008, proferido no processo n.º 0831244:
"Proferida decisão final em acção sujeita a registo e cuja instância não foi, por tal, declarada suspensa após os articulados, torna-se irrelevante e anódina a arguição de tal omissão apenas em sede de recurso interposto daquela decisão."

Nota - Quanto ao ponto destacado no sumário, o acórdão não desenvolve muito mais do que ali surge.
Desenvolvendo um pouco mais, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-10-2006, proferido no processo n.º 06A2629, escreveu-se:
"Argui portanto o recorrente a nulidade da não suspensão da acção findos os articulados, por falta de registo da demanda, a que sustenta estar sujeita. Todavia, a existir tal nulidade, devia ter sido invocada perante o juiz da 1ª instância, o que não foi feito, não podendo ser esgrimida ex novo, como acontece, em sede de recurso de revista. Não teria de resto sentido a suspensão da instância de uma qualquer acção sujeita a registo, tendo ela prosseguido depois dos articulados sem cumprimento de tal formalidade e com julgamento e decisão da 2ª instância já proferida." Enquadra, pois, o problema à luz do regime das nulidades processuais, o que me parece ajustado.
No mesmo sentido, pode ler-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-02-2003, proferido no processo n.º 02A4033, do qual não é disponibilizado sumário, onde se pode ler o seguinte, desenvolvendo um pouco mais o que resultava já da decisão anteriormente citada:
"As acções sujeitas a registo não terão seguimento após os articulados sem se comprovar a sua inscrição, salvo se o registo depender da respectiva procedência. A acção em causa está sujeita a registo por se pretender o reconhecimento do direito de propriedade (artigos 3º nº 1, alínea a) e nº 2 e artigo 2º nº 1, alínea a) do C. Registo Predial). O fim visado pela imposição do registo das acções é, na essência, aquele que é assinalado no artigo 1º do referido diploma, ou seja, dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário e, implicitamente, a protecção de terceiros, isto, não obstante, o registo predial ter entre nós, fundamentalmente, uma eficácia meramente declarativa. Sendo a acção sujeita a registo e não tendo este tido lugar, está-se face a uma irregularidade, uma vez que se omitiu um acto que a lei prescreve. A omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva só produz nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa (artigo 201º nº 1 do CP Civil). Tal não acontece no caso em apreço. Não só a lei não impõe qualquer sanção para a não observância, como a referida irregularidade não influi na causa, destinando-se a exigência, como está dito, a conceder uma certa segurança no comércio jurídico e a proteger terceiros - Ac. RL de 02.03.89, CJ 2. Aliás, a existir qualquer nulidade, desde há muito que estaria sanada (artigo 205º do C. Processo Civil). Não só nenhuma das partes a arguiu tempestivamente, como a questão não foi por qualquer forma suscitada a não ser em via de recurso para este Tribunal. Não há assim qualquer justificação para anular o processado ou para proceder a uma intempestiva suspensão."
Cfr. ainda os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26-02-1998, proferido no processo n.º 98B060, de 22-11-1995, proferido no processo n.º 087169, e de 23-09-1997, proferido no processo n.º 97B151, do Tribunal da Relação do Porto de 18-11-1999, proferido no processo n.º 9931298, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 04-05-2004, proferido no processo n.º 949/04 (sustentando o conhecimento oficioso da omissão).
Note-se que, enquadrando-se o problema no regime das nulidade processuais secundárias, o conhecimento oficioso, embora sustentável, exige algum cuidado na fundamentação, para enquadrar a hipótese na parte final do artigo 202.º do CPC, já que a lei não oferece tal solução expressamente, sem prejuízo do prazo de arguição pelas partes decorrente do disposto no artigo 205.º do CPC.



2) Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-04-2008, proferido no processo n.º 0830511:
"Faltando o registo da acção, as sentenças só produzem efeitos “inter parter”, resultando, claramente, do artº 271º, nº 2 do CPC que o registo da acção tem o objectivo de ampliar os efeitos do caso julgado, tornando a sentença oponível a terceiros estranhos ao processo e que sobre (o prédio) tenham adquirido direitos incompatíveis com o invocado pelo autor."

Nota - No mesmo sentido, cfr. os acórdãos (todos citados, também, na nota anterior) do Supremo Tribunal de Justiça de 26-02-1998, proferido no processo n.º 98B060, e de 23-09-1997, proferido no processo n.º 97B151.


3) Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24-04-2008, proferido no processo n.º 0832420:
"Face ao preceituado no art. 89º, nº1, al. c) da lei nº 3/99, de 13.01 (LOFTJ), é da competência material do tribunal do comércio – e não do tribunal comum – a preparação e julgamento de acção que vise a condenação no reembolso de suprimento efectuado à sociedade."

Nota - Cfr., no mesmo sentido, os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 20-05-2002, proferido no processo n.º 0250621, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 31-01-2002, proferido no processo n.º 0008012.

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sexta-feira, junho 06, 2008

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça

Segue-se alguma jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça.
Para além das habituais decisões anotadas, deixo outras, não anotadas, que julgo poderem ter algum interesse.

1) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2008, proferido no processo n.º 08B948:
"1. Os factos relatados nos autos de medição realizados pelos serviços de Divisão de Obras de uma Câmara Municipal, dona da obra, mais não traduzem do que actos de acompanhamento e fiscalização da obra feitos pelo respectivo dono, para fins de comprovação da sua conformidade com os termos do contrato e consequente autorização de pagamento. E foi a percepção desses factos por parte de um seu funcionário que lhe permitiu ajuizar dessa conformidade e emitir a respectiva autorização de pagamento.
Este documento não foi emitido pela Câmara Municipal no uso das suas funções específicas enquanto órgão da administração local, mas enquanto dona da obra e para os fins apontados.
Ora, não tendo este documento sido emitido nos limites da competência ou actividade legal da entidade emitente, não tem força probatória plena e, como tal, está sujeito à livre apreciação do julgador.
2. O contrato dos autos foi concluído e firmado por recorrente e recorrida por decisão da mesma pessoa, agindo simultaneamente em representação das duas sociedades contratantes.
E esta intervenção isolada do representante de duas entidades, distintas dele próprio, configura uma situação clara de dupla representação em que o perigo de se conseguirem contratos favoráveis para um dos representados à custa do outro poderá existir realmente, assim se possibilitando a fragilização contratual de um das partes.
A figura do contrato consigo mesmo pode verificar-se quando alguém revestido de poderes de gerência de duas sociedades diferentes, actuando como representante das duas, celebra determinado contrato."

Nota - Parece-me acertada a decisão de não qualificar, neste caso, o documento camarário como "autêntico", pelas razões constantes do sumário.
Quanto à força probatória dos documentos autênticos, cfr. a nota que deixei aqui ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-05-2007, proferido no processo n.º 07A1334, bem como este outro post.
Para além de toda a jurisprudência que se encontra nesses textos, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-03-2004, proferido no processo n.º 04B370 ("I - A força probatória material dos documentos autênticos restringe-se, nos termos do artigo 371, nº1 do Código Civil, aos factos praticados ou percepcionados pela autoridade ou oficial público que emanam os documentos, já não abarcando, porém, a sinceridade, a veracidade e validade das declarações prestadas perante essa mesma autoridade ou oficial público; II - Dois atestados emitidos pela Junta de Freguesia da respectiva residência e uma certidão dos serviços de Finanças sobre a liquidação do seu IRS nada provam, só por si, sobre a carente situação económica alegada pela autora, porquanto: um dos atestados é omisso sobre a razão de ciência do que atesta; o outro atesta com base no que foi declarado pela própria autora; a liquidação do IRS é calculada pelo que é declarado pelo próprio contribuinte.").


2) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-06-2008, proferido no processo n.º 08A1110:
"I. A competência territorial fixada no art. 73º do Cód. de Proc. Civil – foro da situação dos bens - está numa relação de especialidade em relação à competência territorial fixada no art. 74º do mesmo diploma – foro para cumprimento de obrigações.
II. Assim sempre que uma acção se refira a um direito real ou pessoal de gozo sobre imóvel, a competência territorial pertence à comarca da situação do imóvel, independentemente de nessa acção ser pedido o cumprimento de uma obrigação ou a resolução de um contrato que incida sobre o referido imóvel."

Nota - Decisão interessante para mim, esta, pois venho defendendo o mesmo nas aulas, invocando precisamente os dois principais argumentos que o acórdão anotado refere: por um lado, a articulação lógica entre os dois preceitos sugere a relação de especialidade do primeiro face ao segundo; por outro lado, o argumento histórico, apoiado no comentário de Alberto dos Reis. Sobre este último, refere-se na fundamentação: "É este o entendimento do Prof. José Alberto dos Reis, no seu “Comentário ao Cód. de Proc. Civil”, vol. 1º, pág. 193, onde refere que o texto do art. 73º teve origem no art. 91 º do projecto primitivo, enquanto o art. 74º teve origem no art. 92º do mesmo projecto e este último começava com a expressão “ Quando a acção não esteja abrangida pela disposição do artigo anterior...”."
A propósito, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-02-2008, proferido no processo n.º 10408/2007-8:
"A acção em que se pede a resolução de contrato promessa que tem objecto um imóvel sito em Coimbra e consequente condenação dos RR a restituírem determinada quantia correspondente ao sinal então entregue não tem perspectiva real mas, apenas, obrigacional pelo que não lhe é aplicável o disposto no art. 73 do C.P.C."


3) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-05-2008, proferido no processo n.º 08B856:
"I - A presunção resultante do registo predial (artº 7º do C.R. Predial) não abrange os factores descritivos do prédio, como as áreas, limites ou confrontações.
II - A ampliação a que alude o artº 729º nº3 do CPC só é consentida no tocante a factos de que ao tribunal seja lícito conhecer ou articulados pelas partes (artº 264º do CPC) que se perfilem revelantes para o consignado no primeiro dos normativos neste número invocados."


4) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-05-2008, proferido no processo n.º 08B332:
"O locatário tem legitimidade para exercer contra o vendedor todos os direitos relativos ao bem locado, incluindo o direito de anulação ou de resolução do contrato de compra e venda, nomeadamente, no caso do bem não satisfizer as características que haviam sido exigidas pelo locatário e garantidas pelo vendedor à data do contrato de compra e venda e que eram essenciais ao fim a que o bem se destinava.
A declaração de nulidade do contrato de compra e venda é oponível ao locador e acarreta, consequencialmente, a nulidade do contrato de locação financeira.
Os efeitos, para este contrato - consequência da declaração de nulidade do contrato de compra e venda - produzem-se, em relação ao locador, afectando as próprias “prestações e rendas recebidas”, devendo, mutuamente, ser restituído tudo o que houver sido prestado; os seus efeitos são, pois, retroactivos."


5) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-05-2008, proferido no processo n.º 07S4106:
"I – A arguição de nulidades de acórdãos da Relação deve, por força do estatuído nas disposições combinadas dos artigos 716.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), e 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (CPT), ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, sob pena de se considerar extemporânea e não se conhecer das nulidades arguidas somente nas alegação de recurso.
II – A rejeição do recurso em matéria de facto, por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 690.º-A, n.os 1, 2 e 5, e 712.º do CPC, não configura qualquer dos vícios típicos da sentença, mas erro de interpretação e aplicação de lei processual, pelo que tal questão, por não estar contemplada no citado artigo 77.º do CPT, não está sujeita à limitação consignada neste preceito, do que decorre que pode ser conhecida pelo Supremo, quando suscitada na alegação da revista, conforme dispõe o artigo 722.º, n.º 1, do CPC.
III – O facto de a parte recorrente impugnar toda a decisão proferida sobre a matéria de facto não é motivo de rejeição, desde que, na alegação, cumpra integralmente as exigências contidas no referido artigo 690.º-A, n.os 1, 2, podendo e devendo o recurso ser parcialmente rejeitado, quanto à matéria de facto impugnada em relação à qual seja pedida, pura e simplesmente, a reapreciação de provas produzidas em 1.ª instância, em manifestação de genérica discordância com o decidido.
IV – A ampliação da matéria de facto, prevista no artigo 729.º, n.º 3, do CPC, passa não só pela averiguação de factos que, tendo sido alegados, não foram apurados, mas também pela reapreciação de factos que, também alegados, terão sido deficientemente aquilatados, designadamente porque a Relação, indevidamente, não cuidou de proceder à reapreciação das provas gravadas, posto que o objectivo da ordem de ampliação da matéria de facto é o de fazer averiguar factos de que o tribunal pode tomar conhecimento e que não foram apurados ou que o foram deficientemente, mostrando-se o apuramento de tais factos indispensável para a decisão de direito.
V – Deve ser ordenada a ampliação da decisão proferida sobre a matéria de facto, quando, sendo controvertidos os factos invocados para a resolução com justa causa do contrato de trabalho por parte do trabalhador, para fundamentar o pedido de indemnização por danos não patrimoniais, e para fundamentar a condenação no pagamento de diferenças salariais, as instâncias não emitiram pronúncia sobre aqueles factos.
VI – Em face do disposto nos artigos 3.º, n.º 1, e 8.º, n.º 1, parte final, da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho, aos créditos retributivos vencidos depois de 1 de Dezembro de 2003, aplica-se o regime deste diploma, estando os que venceram antes daquela data sujeitos ao regime anteriormente vigente.
VI – Em ambos os regimes, ao trabalhador que reclama o pagamento prestações retributivas, incumbe, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, o ónus de alegar e provar os factos concretos de que emergem os correspondentes créditos – a prestação do trabalho, a categoria profissional respectiva, e, quando for o caso, as condições específicas em que tal sucedeu determinantes de atribuições patrimoniais que excedam a remuneração de base; sobre o empregador impende o ónus de impugnar aqueles factos ou de alegar e demonstrar que as correspectivas prestações foram satisfeitas (artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil).
VII – Em face do disposto nos artigos 7.º e 8.º do Regime Jurídico das Relações Colectivas de Trabalho e 552.º e 553.º do Código do Trabalho, as normas dos Contratos Colectivos de Trabalho não têm aplicação directa às relações individuais de trabalho se não se provou, nem foi alegada, a filiação do empregador em alguma das associações de empregadores subscritoras.
VIII – As normas constantes do Contratos Colectivos de Trabalho (CCT’s) celebrados entre a UNIHSNOR – União das Associações da Hotelaria e Restauração do Norte de Portugal e a FESHOT – Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal e outros, e entre a mesma associação de empregadores e a FESAHT – Federação dos Sindicatos da Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal e outros, e respectivas alterações, aplicam-se às relações individuais de trabalho estabelecidas entre trabalhadores e empregadores do sector de actividade económica neles contemplada, exercida no distrito do Porto, independentemente da filiação nas associações sindicais e empresariais subscritoras, na medida em que foram objecto de extensão por via administrativa, através de Portarias de Extensão.
IX – O reconhecimento do direito ao subsídio de alimentação, em substituição da alimentação em espécie, reportado ao período de efectiva prestação de trabalho, previsto nos referidos CCT’s, depende da alegação e prova, pelo trabalhador, de que o estabelecimento, onde o serviço é prestado, não confecciona ou não serve refeições; e do mesmo subsídio, em períodos de férias, da alegação e prova, pelo trabalhador, de que, nesses períodos, não lhe podia ser fornecida alimentação, ou de que o trabalhador optou por não tomar as refeições no estabelecimento onde presta serviço.
X – O reconhecimento do direito a perceber o “prémio de conhecimento de línguas”, consignado nos mesmos CCT’s, depende da alegação e prova, pelo trabalhador, da utilização, no exercício das respectivas funções, de conhecimentos de idiomas estrangeiros.
XI – O reconhecimento do direito a perceber “abonos para falhas”, previsto para os trabalhadores com a categoria de recepcionista, naqueles CCT’s, pressupõe a alegação e prova, pelo trabalhador, do exercício de funções de caixa."


6) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2008, proferido no processo n.º 08B1168:
"1. Terminada a fase administrativa, entra-se na fase judicial e a primeira diligência a efectuar é a adjudicação da propriedade e eventualmente da posse do bem ao expropriante.
De acordo com o processado especial aqui preconizado, não está prevista a audição prévia dos interessados. E compreende-se que assim seja. Primeiro, porque eles puderam acompanhar a par e passo todo percurso processual que até aí se desenrolou e adoptar os procedimentos que entendessem convenientes. Segundo, porque a fase judicial só começa verdadeiramente com o despacho de adjudicação. Finalmente, porque é a própria declaração de utilidade pública a criar o carácter forçado da transferência do bem. No despacho de adjudicação, o juiz apenas pode exercer controle sob aspectos formais da tramitação do procedimento expropriatório até aí decorrente.
Não revestia qualquer interesse, digno de protecção legal, a notificação da expropriada previamente à prolação do despacho de adjudicação da propriedade do bem.
2. Vigora em matéria de expropriação o princípio da suficiência, ou seja, o sacrifício a impor ao particular deve limitar-se ao estritamente necessário para realização do fim público a prosseguir.
Este princípio admite excepções, a mais importante das quais é, desde logo, a expropriação total que é instituída em benefício do interessado. Desde que a parte do prédio não necessária à realização do interesse público não ofereça as mesmas vantagens que oferecia o conjunto ou deixe de se revelar economicamente viável, o expropriado pode requerer a expropriação de todo ele.
Não faria qualquer sentido que, declarada a utilidade pública de parte de um prédio e pretendendo o expropriado fundadamente obter a sua expropriação total, fosse obrigada a expropriante a obter uma DUP abrangente da parte restante. Aliás, e porque a expropriante nem terá, normalmente, qualquer interesse nessa expropriação, que para si é forçada, nem a parte restante se apresentará já necessária à satisfação de qualquer interesse público, não havia fundamento para provocar essa declaração.
Esta situação não se configura, por isso, como uma verdadeira expropriação. Este foi o meio encontrado para minorar o prejuízo do expropriado com o fraccionamento do imóvel, enquanto para o expropriante acaba por constituir um encargo acrescido na medida em que tem de adquirir parte de um imóvel não necessária a um fim de utilidade pública.
Requerida a expropriação total do prédio, uma vez concedida, apresenta-se ela como o desenvolvimento da declaração de expropriação inicial, não havendo sequer fundamento para provocar uma nova DUP."

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