terça-feira, maio 29, 2007

Jurisprudência do STJ (parte 1 de 2)

1) Acórdão de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07A1528:
"O exercício, ou não, pela Relação dos poderes das alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 712º do CPC é incensurável pelo STJ sendo a respectiva decisão irrecorrível.
O STJ é essencialmente um Tribunal de revista, vocacionado para a uniformização de jurisprudência.
O uso da faculdade do nº 3 do artigo 729º do CPC é excepcional e dela só pode lançar-se mão se se concluir pela existência de contradições essenciais, desconsideração do alegado pelas partes ou matéria de conhecimento oficioso, tudo em pontos de facto, sem cuja eliminação, consideração ou esclarecimento fique comprometida a decisão final.
A redacção do artigo 690º-A do CPC introduzida pelo Decreto-Lei nº 183/2000 de 18 de Agosto, dispensa o recorrente, que impugna a matéria de facto, de proceder à transcrição das passagens da gravação em que se funda, mas impõe-lhe a indicação dos pontos concretos da matéria de facto que considera incorrectamente julgada que deve constar da alegação, nos termos do nº 1, alínea a) do artigo 690º A do CPC, sob pena de rejeição do pedido de reapreciação
"
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Nota - A primeira conclusão que não impede, porém (como a decisão anotada expressamente admite) que o STJ sindique o mau uso dado ao n.º 2 do artigo 712.º do CPC (designadamente por infracção das normas que regem a força probatória dos vários meios de prova). No que toca e este ponto, bem como ao uso, pelo STJ, da faculdade prevista no n.º 3 do artigo 729.º do CPC (ordenar a ampliação da matéria de facto), cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08-05-2007, proferido no processo n.º 07A759, e a anotação que a ele deixei aqui.
Sobre o ónus previsto no artigo 690.º-A do CPC, cfr. os acórdãos do STJ
de 10-05-2007, proferido no processo n.º 06B1868 (e a nota que a ele deixei aqui), do Tribunal da Relação de Coimbra de 13-03-2007, proferido no processo n.º 1877/03.3TBCBR.C1 (e a nota que a ele deixei aqui), e de 08-11-2006, proferido no processo n.º 06S2455 (e a nota que a ele deixei aqui).


2) Acórdão de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07A1655:
"Para que possa formar-se maioria, o acórdão da secção deve culminar com, pelo menos, dois votos concordantes, quer quanto à decisão, quer quanto à fundamentação.
Se um dos adjuntos vota vencido e o outro apenas vota a decisão o presidente da secção deve intervir para desempatar nos termos do nº 5 do artigo 709º do Código de Processo Civil.
Não apresentando dois votos concordantes quanto à fundamentação e quanto à decisão, o Acórdão é nulo por não ter o necessário vencimento, nulidade não suprível nos termos do nº 1 do artigo 731º CPC que apenas admite o suprimento no caso do acórdão ser lavrado contra o vencido.
Face ao artigo 716º CPC a nulidade resultante de falta de vencimento não é de conhecimento oficioso.
O requerente de prestações por morte de beneficiário da Segurança Social que com ele vivia tem de alegar e provar a situação de união de facto, há mais de dois anos, à data da morte; a necessidade de alimentos; a impossibilidade de obter alimentos da herança do falecido ou das pessoas elencadas nas alíneas a) a d) do artigo 2009º do Código Civil"
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Nota - Interessantíssimo (e espécime raro) é este acórdão, que se pronuncia sobre a função e os efeitos processuais dos votos de vencido e dos votos que apenas abrangem a decisão.
A nulidade não foi declarada, por se ter entendido não ser de conhecimento oficioso.
Sobre este tema do sentido e efeitos dos votos de vencido e dos votos que apenas abrangem a decisão o acórdão anotado cita um outro, do mesmo tribunal, de 20 de Março de 1974, in BMJ n.º 235, pág. 181, segundo o qual "a ausência de dois votos concordantes quanto à fundamentação gera a nulidade do Acórdão" (apesar de ter concluído pelo conhecimento oficioso da nulidade - no entanto, este encontra fundamento no processo penal, como era o caso).
No entanto, há mais contributos, ainda que raros, para este tema, na jurisprudência constitucional.
No acórdão do Tribunal Constitucional
n.º 464/94, de 28-6-1994 (também in BMJ n.º 438, pág. 128), decidiu-se o seguinte:
"I – Muito embora uma declaração de voto de um juiz faça parte integrante da decisão tomada em sede de tribunais funcionando colegialmente, não é ela, seguramente, contribuitiva, ou para a formação da maioria que vai expressar o conteúdo decisório, ou para a maioria na qual se ancora a fundamentação que conduz à decisão. II – Essa declaração representa, antes e tão-só, o ponto de vista do juiz emitente, e não a óptica do juízo decisório do tribunal ou a corte de razões que a ele levou. Neste contexto, não pode tal declaração ser perspectivada como decisão de um tribunal. III – Sendo assim, e porque o recurso das alíneas a) do nº 1 do artigo 280º da Lei Fundamental e a) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 tem, necessariamente, de ser interposto de uma decisão judicial, ponderando que na decisão tomada pelo acórdão recorrido não houve recusa de aplicação de qualquer normativo com fundamento num juízo de desconformidade com o diploma básico, torna-se claro inexistir um dos respectivos pressupostos – justamente o da recusa de aplicação de uma norma numa decisão de um tribunal. IV – Acresce que, tendo o recurso de constitucionalidade uma natureza instrumental, a decisão eventualmente a tomar pelo Tribunal Constitucional quanto à questão de inconstitucionalidade suscitada na declaração de voto do juiz vencido, e ainda que concluísse pela existência de um tal vício na norma ínsita no nº 2 do artigo 372º do Código de Processo Penal, não teria qualquer repercussão no decidido no acórdão recorrido. V – Sendo a junção de uma declaração de voto na sentença proferida pelo tribunal colectivo um acto proibido por lei (artigo 372º, nº 2, do Código de Processo Penal), na hipótese de junção, seguramente se haverá de proporcionar aos interessados um meio de reacção, de molde a poder provocar, sobre ela, uma decisão daquele tribunal, decisão essa que, após ser tomada, poderá ser impugnada pelos meios legais, designadamente, se for caso disso, por intermédio de recurso visando a fiscalização concreta da constitucionalidade normativa".
E no acórdão do mesmo Tribunal n.º 58/95, de 16-02-1995, in BMJ, n.º 446 (suplemento), pág. 342, considerou-se o seguinte (podendo a segunda conclusão adaptar-se perfeitamente ao processo civil):
"I – Muito embora na Lei nº 28/82 não exista norma específica que preveja a arguição de nulidades de acórdão tirado pelo Tribunal Constitucional em sede de fiscalização abstracta da constitucionalidade, preventiva ou sucessiva, é admissível tal arguição, nos termos genericamente previstos no ordenamento adjectivo comum, relativamente a decisões insusceptíveis de recurso. II – Quando o nº 2 do artigo 42º da Lei nº 28/82 estabelece que a decisão é tomada por maioria, deve entender-se que a votação tem de incidir – e a maioria formar-se – tanto sobre a decisão propriamente dita como sobre os fundamentos que a ela conduzem. III – Quando, em sede de fiscalização preventiva, se equacionam diversos possíveis fundamentos da inconstitucionalidade – de índole formal e material – deve o Tribunal compartimentar cada uma destas questões, autonomizando-as e, em consequência, tomando, relativamente a cada uma delas, a sua decisão, só se pronunciando pela verificação de cada um dos tipos de inconstitucionalidade em causa quando se alcance uma maioria de votos no sentido de esse concreto vício se ler por assente. IV – Na verdade, só assim será possível dar ao legislador a indicação precisa sobre o procedimento a adoptar com vista à expurgação das normas julgadas inconstitucionais".


3) Acórdão de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07A979:
"As Relações não podem, com fundamento em presunções judiciais, alterar as respostas aos quesitos ou aos pontos da base instrutória, nomeadamente considerando provados por inferência factos que a 1ª instância deu como não provados após contraditório e imediação da prova produzida.
Podem as Relações tirar ilações da matéria de facto, mas desde que não alterem os factos provados, antes neles se baseando de forma a que os factos presumidos sejam consequência lógica daqueles.
O S.T.J., embora não possa recorrer a presunções judiciais, pode censurar o seu uso pela Relação sempre que feito em condições irregulares, quer quanto aos pressupostos, quer quanto ao concreto raciocínio efectuado, nomeadamente atendendo à circunstância de o facto presumido nem sequer ter sido articulado"
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Nota - Tem esta decisão a virtude de introduzir alguma moderação (que se tem revelado, por vezes, necessária) no uso das presunções judiciais pelos tribunais da Relação.
Sobre presunções judiciais já escrevi bastante neste blog (
cfr. aqui a ligação à busca pela categoria "presunção judicial"). Em particular, sobre a possibilidade de controlo, pelo STJ, do uso, pelas Relações, de presunções judiciais, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-03-2007, proferido no processo n.º 06A4002 (e a anotação que a ele deixei aqui). O Supremo Tribunal de Justiça não pode sindicar o simples uso ou não uso da presunção judicial, embora possa controlar, como aqui o fez, um uso que se traduza na alteração das respostas dadas à matéria de facto - cfr., neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 05-07-1984, proferido no processo n.º 071754, de 03-11-1992, proferido no processo n.º 082011, de 09-03-1995, proferido no processo n.º 086250, de 26-09-1995, proferido no processo n.º 087078, de 31-10-1995, proferido no processo n.º 087288 (estes dois últimos com um voto de vencido), de 20-01-1998, proferido no processo n.º 97A460, 09-07-1998, proferido no processo n.º 98B430, de 07-07-1999, proferido no processo n.º 99A588, de 20-06-2000, proferido no processo n.º 00A407, de 19-03-2002, proferido no processo n.º 02B656, de 10-02-2003, proferido no processo n.º 03B1837, de 15-02-2005, proferido no processo n.º 04A4577, e de 07-11-2006, proferido no processo n.º 06A3564.
Em particular para a definição de presunção judicial, cfr. a nota ao
acórdão do STJ de 05-12-2006, proferido no processo n.º 06A3883, que deixei aqui.


4) Acórdão de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07B1480:
"O recurso previsto no n.º 4 do art. 678.º do CPC, só é admissível, quando não o for por motivo estranho à alçada do tribunal, se cumulativamente for admissível em razão da alçada".

Nota - Cfr., no mesmo sentido, os acórdãos de 24-05-2007, proferido no processo n.º 07B1215, e de 17-05-2007, proferido n.º processo n.º 07B1379.
Sobre os requisitos dos recursos especiais previstos no artigo 678.º do CPC, cfr. o acórdão do STJ
de 15-06-2005, proferido no processo n.º 04S3167.

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