segunda-feira, maio 12, 2008

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa

Segue-se a habitual selecção de jurisprudência com notas breves. Neste post, porém, e considerando que há muitas decisões que não vou anotar mas poderão ter interesse, transcrevo, no final, outros acórdãos, sem notas.


1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-04-2008, proferido no processo n.º 1384/2008-2:
"I - O simples promitente-comprador de uma fracção autónoma tem legitimidade para pedir alteração do título constitutivo da propriedade horizontal, mas não para arguir a nulidade.
II - O regime da nulidade cominada no art. 1418.º n.º 3 do C. Civil não é diferente do estabelecido nos art.s 1416.º e 1419.º, designadamente no que respeita à legitimidade para a sua invocação."

Nota - Salvo melhor opinião, não me parece de subscrever a primeira parte da primeira conclusão ("O simples promitente-comprador de uma fracção autónoma tem legitimidade para pedir alteração do título constitutivo da propriedade horizontal").
Atente-se na fundamentação, quanto a este ponto:
"A legitimidade activa para os pedidos que visam a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal não se enquadra nos artigos 1416.º a 1419 do C.Civil, ficando, pois, reduzida à sua condição de simples pressuposto processual, definido nos art.s 26.º e ss do CPC. E, nos termos deste preceito legal, o demandante é parte legítima quando tem interesse directo em demandar, interesse que é expresso pela utilidade derivada da procedência da acção.
Assim limitado o conceito de legitimidade, parece seguro que o A. é parte legítima, não apenas em relação ao pedido de indemnização, para o qual a legitimidade é manifesta, mas também para os referidos pedidos de alteração do título constitutivo da propriedade horizontal. Não relevando, nesta sede, a viabilidade dos pedidos formulados, a legitimidade do A. depende apenas da utilidade que para ele decorre da sua hipotética procedência. Utilidade que está adequadamente justificada nos autos."
Ora, na análise do artigo 26.º do CPC, não se pode fazer esquecer que: (i) o interesse da parte tem que ser
directo; (ii) para qualificar o interesse em demandar como directo não se pode perder de vista a relação material controvertida, a posição que, nela, ocupam as partes e o efeito que a procedência da acção pode vir a ter para as partes, enquanto titulares dessa relação.
Numa hipótese, como esta, em que está em causa o estatuto
real da propriedade horizontal, em que são partes todos os proprietários de fracções (ergo, comproprietários das partes comuns), o promitente-comprador não é, a nenhuma luz, parte na relação material controvertida. A proceder a acção, a sentença não produziria nenhuns efeitos que se reflectissem directamente em direitos ou obrigações do autor.
Diz-se no acórdão que o autor tem um "interesse" em demandar. Tem-no, de facto. Mas não é qualquer interesse que sustenta a intervenção no processo enquanto parte principal. O promitente-comprador tem um interesse que justificaria a sua intervenção enquanto parte acessória, mais concretamente no regime da assistência. Na verdade, numa acção em que o pedido fosse formulado pelo promitente-vendedor, ainda proprietário, o promitente-comprador poderia facilmente demonstrar ter um
"interesse jurídico em que a decisão do pleito seja favorável a essa parte" (artigo 335.º, n.º 1).
Na qualidade de promitente-comprador, o autor não faz valer qualquer direito próprio, podendo até imaginar-se a hipótese de o contrato prometido nunca vir a ser celebrado e termos, por via de sentença, a alteração do título constitutivo a pedido de alguém que nunca foi titular de um direito real sobre qualquer fracção, eventualmente contra a vontade do proprietário-condómino.
O processo civil é instrumental, ancilar do direito substantivo. Por sua via não se criam direitos subjectivos que este não preveja ou consinta.
Eis, num rápido resumo, as razões da minha discordância.



2) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-04-2008, proferido no processo n.º 2596/2008-7:
"1. A reserva de propriedade configura-se como uma autêntica retenção do direito de propriedade, destinada a assegurar o vendedor contra os efeitos da aplicação da regra geral estabelecida no art.º 408.º, n.º 1, do C. P. Civil, qual seja, ficar despido do seu direito de propriedade sem receber a contrapartida, o preço.
2. Esta definição conceptual da figura da reserva de propriedade impede a sua aplicação no âmbito do contrato de mútuo, a favor do mutuante, pela própria natureza do contrato, ainda que consentida pelo mutuário e objecto de cedência, em documento particular, posterior à celebração do contrato de mútuo, assinado pelo vendedor, com reserva de propriedade registada a seu favor, uma vez que este acto - de cedência da reserva de propriedade - se não configura como cessão da posição contratual.
3. O mutuante que, ainda assim, logrou registar a reserva de propriedade a seu favor, não pode fazer uso do procedimento cautelar previsto no art.º 15.º do Dec. Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, o qual é dependência da acção de resolução do contrato de compra e venda e não da acção de resolução do contrato de mútuo."

Nota - Trata-se de um tema que tenho vindo a acompanhar por aqui. Embora estas notas sejam relativamente simples, porque aproveito as anteriores, não quero deixar de actualizar, a cada nova decisão, a lista de jurisprudência sobre a matéria, pois sobre ela a jurisprudência ainda se vai construindo sem rumo definido. Aliás, este acórdão conta, como muitos sobre o mesmo assunto, com um voto de vencido.
O Decreto-Lei n.º 54/75, referido no sumário, trata de vários aspectos do regime da reserva da propriedade.
Problemas relacionados com a interpretação destas normas têm vindo a ser sucessivamente colocados aos tribunais superiores, já que, em vez da normal relação de dois pólos (vendendor-comprador), a reserva de propriedade surge cada vez mais em relações triangulares (adquirente-vendedor-financiador), sendo cada vez mais frequente a constituição de reserva de propriedade como instrumento de protecção do financiador. Ou seja, a reserva de propriedade passa a salvaguardar não o pagamento do preço ao vendedor (que terá sido assegurado pelo financiador), mas sim o pagamento das prestações ao financiador.
A jurisprudência tem vindo a interpretar, creio que ainda maioritariamente, o preceito do artigo 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75 no sentido de se referir apenas ao incumprimento das obrigações do contrato de compra e venda, o que impediria que o financiador dela beneficiasse.
No entanto, em outras decisões tem admitido a possibilidade de: (i) a reserva ser constituída a favor de crédito de terceiro; e (ii) interpretar extensivamente o artigo 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75, no sentido de abranger "o contrato de mútuo conexo com o de compra e venda cujo cumprimento esteve na origem da reserva de propriedade" (texto citado do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 31-05-2007, proferido no processo n.º 3901/2007-2).
Quanto ao primeiro ponto (possibilidade de a reserva ser constituída a favor de crédito de terceiro), cfr. o acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-03-2003, in CJ, 2003, tomo II, pág. 74, e, recentemente, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2006, proferido no processo n.º 06A1901 e de 02-10-2007, proferido no processo n.º 07A2680.
Quanto ao segundo ponto (possibilidade de interpretar extensivamente o artigo 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75), cfr. o já citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2006, proferido no processo n.º 06A1901 . Contra: acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-12-1997, in CJ, 1997, tomo V, pág. 120, do Supremo Tribunal de Justiça de 12-05-2005, proferido no processo n.º 05B538 (argumentando que o vendedor não pode já exercer o direito à resolução porque recebeu já a totalidade do preço, logo não poderá exercer o direito de apreensão, conexo com aquele primeiro - a decisão conta com um voto de vencido), e do Tribunal da Relação do Porto de 01-06-2004, proferido no processo n.º 0422028, e de 15-04-2008, proferido no processo n.º 0821988.
No Tribunal da Relação de Lisboa, temos a seguinte "contagem de espingardas":
- no sentido de que a reserva de propriedade pode constituir-se em favor de crédito de terceiro não vendedor, cfr. os acórdãos de 26-04-2007, proferido no processo n.º 1614/2007-6, de 06-03-2007, proferido no processo n.º 1187/2007-7, de 01-02-2007, proferido no processo n.º 733/2007-6, de 22-06-2006, proferido no processo n.º 3629/2006-6, de 27-06-2006, proferido no processo n.º 937/2006-1 (este, se bem o interpreto, apenas quanto à primeira vertente, ou seja, da possibilidade de constituição da reserva a favor de terceiro), de 22-06-2006, proferido no processo n.º 4667/2006-6, de 30-05-2006, proferido no processo n.º 3228/2006-7, de 28-03-2006, proferido no processo n.º 447/2006-7 (com um voto de vencido, apoiado no citado acórdão do STJ de 12-05-2005), de 20-10-2005, proferido no processo n.º 8454/2005-6, de 05-05-2005, proferido no processo n.º 3843/2005-6, de 18-03-2004, proferido no processo n.º 2097/2004-6 (concordando com, pelo menos, o primeiro ponto supra citado, já que o segundo não se levanta no processo, e com um vonto de vencido, que não abrange, em rigor, essa matéria), de 27-06-2002, proferido no processo n.º 0053286, de 26-04-2007, proferido no processo n.º 3076/2007-6, e de 26-07-2007, proferido no processo n.º 6792/2007-1.
- contra: acórdãos de 08-02-2007, proferido no processo n.º 957/2007-2, de 12-10-2006, proferido no processo n.º 3814/2006-2, de 22-06-2006, proferido no processo n.º 4927/2006-8, de 29-06-2006, proferido no processo n.º 4888/2006-2, e de 14-12-2004, proferido no processo n.º 9857/2004-7, e de 13-12-2007, proferido no processo n.º 9887/2007-8.
Outros assuntos relativos à reserva de propriedade já analisados neste blog foram relação entre as regras de competência constantes do DL 54/75 e as novas regras da Lei 14/2006 (cfr. aqui o último levantamento sobre este assunto) e a renúncia à reserva de propriedade e penhora pelo titular da reserva.


3) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2523/2008-8:
"1 - Só é possível deixar para liquidação a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora provada a sua existência, não existam elementos para fixar o montante, nem sequer recorrendo à equidade.
2 - Provando-se apenas que o autor causou prejuízos ao réu de montante não concretamente apurado, não fornecendo o processo elementos para determinar o objecto ou a quantidade da condenação, a única solução jurídica é proferir condenação ilíquida, não sendo caso de recorrer a juízos de equidade nos termos do artigo 566º nº 3 do Código Civil, pois os factos provados não fornecem os limites legais exigíveis para aplicar esse conceito."

Nota - Quanto aos requisitos da condenação genérica, mais concretamente a necessidade de se encontrar comprovada a obrigação, desconhecendo-se apenas o seu montante, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 03-06-2003, proferido no processo n.º 03A1441, do Tribunal da Relação do Porto de 22-02-2001, proferido no processo n.º 0031748, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2523/2008-8, cujo sumário está infra transcrito como acórdão "9)". Ainda quanto à opção entre a condenação genérica e o recurso à equidade, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07-12-2006, proferido no processo n.º 0636403.
Sobre: (i) a possibilidade de, remetido o processo ao tribunal de execução para liquidação de uma condenação genérica proferida em sentença arbitral, este tribunal estadual conhecer oficiosamente da preterição do tribunal arbitral; (ii) a competência do tribunal arbitral para proceder à liquidação das suas decisões de condenação genérica; e (iii) competência (tribunal comum ou tribunal de execução), e processo próprio, em caso de condenação genérica em sentença proferida em tribunal arbitral, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23-10-2007, proferido no processo n.º 0623032. Ainda sobre a condenação genérica em tribunal arbitral, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2514/2008-6, referido infra como acórdão "5)".
O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 26-06-2007, proferido no processo n.º 558/2001.C1, versa sobre o dever de fundamentação da decisão de liquidação.
Sobre a alteração do regime do incidente da liquidação com o DL 38/2003, que passou a correr no próprio processo declarativo, cfr. especialmente os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 16-04-2007, proferido no processo n.º 0750228, de 08-02-2007, proferido no processo n.º 0730237, e de 24-04-2007, proferido no processo n.º 0721491, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 07-12-2005, proferido no processo n.º 9182/2005-8.


4) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-04-2008, proferido no processo n.º 3523/2008-7:
"1.O Tribunal de Família e Menores é materialmente incompetente para apreciar a providência cautelar de restituição provisória de posse por apenso a uma acção de divórcio litigioso, ainda que tenha como objecto a casa de morada de família.
2.Entre a restituição provisória de posse e a acção de divórcio verifica-se ainda a falta do nexo de instrumentalidade exigido pelo art. 383º do CPC.
3.O facto de a atribuição provisória da casa de morada de família poder ser decidida no âmbito da acção de divórcio litigioso, nos termos do art. 1407º do CPC, não é suficiente para que seja preterido o referido pressuposto da competência absoluta e o aludido nexo de instrumentalidade."

Nota - Não conheço qualquer outra decisão sobre esta matéria. Suscitou, por isso, e desde logo, o meu interesse.
Transcrevo as partes que me pareceram mais significativas, na fundamentação, que me parece de subscrever e, sendo cristalina, dispensa outras considerações.
"(...) Os tribunais de família têm a sua competência limitada às questões enunciadas nos arts. 81º e 82º da LOFTJ. Integrando naturalmente as acções de divórcio, a competência especializada abarca outras questões conexas atinentes ao direito a alimentos, à indemnização por danos morais decorrentes do divórcio (art. 1792º, nº 2, do CC), à regulação do exercício do poder paternal ou à atribuição da casa de morada de família.
O destino que pode ser atribuído à casa de morada de família, em casos de divórcio, está regulado no art. 1793º do CC, admitindo-se que qualquer dos cônjuges possa promover a sua regulação. Em termos definitivos, tal pode ser feito através de processo de jurisdição voluntária autonomamente instaurado (da competência da Conservatória do Registo Civil, nos termos do art. 5º, nº 1, al. b), do Dec. lei nº 272/01, de 13-10) ou por apenso à acção de divórcio litigioso, nos termos do art. 1413º do CPC.
Porém, enquanto não se proceder à resolução definitiva dessa questão, pode justificar-se a regulação provisória. (...)
A atribuição da casa de morada de família constitui uma questão de natureza eminentemente familiar, integrada na esfera de competência especializada dos Tribunais de Família e de Menores, bem distante de uma discussão, de matriz essencialmente patrimonial, centrada em torno dos factos ou dos pressupostos relevantes para a tutela provisória ou definitiva da posse ou do direito de propriedade.
A decisão sobre a utilização da casa de morada de família não está dependente da natureza do direito que lhe está subjacente, sendo compatível com uma situação de arrendamento da casa a ambos os cônjuges ou a qualquer deles, com o facto de constituir bem comum do casal ou, como sucede no caso concreto, com o facto de o imóvel ser propriedade exclusiva de um dos cônjuges.
Em termos materiais, não existe qualquer coincidência entre a restituição provisória da posse e a atribuição da casa de morada de família. Enquanto àquela importa sobremaneira a defesa da qualidade de possuidor contra quem não detenha sobre a coisa título que legitime a sua ocupação, a atribuição da casa de morada de família pode ser decidida independentemente do título que subjaz à fixação da morada familiar.
Por seu lado, em termos meramente formais, a restituição provisória da posse, fundada na posse, no esbulho e na violência, é necessariamente decidida à revelia da contraparte (art. 394º do CPC), sem que a esta seja antecipadamente dada a possibilidade de se defender, passando o exercício do direito de defesa para depois do decretamento da restituição. Ao invés, a regulação incidental da atribuição da casa de morada de família, inscreve-se incidentalmente na própria acção de divórcio, sendo a questão decidida com base nos elementos pertinentes que puderem ser observados e no confronto com as posições assumidas pelas partes que, em regra, deverão ser ouvidas antes do seu decretamento.
Neste contexto, ainda que o objecto imediato da providência de restituição provisória da posse seja a casa de morada de família, torna-se evidente a falta de competência do Tribunal a quo para sobre a mesma se pronunciar.
(...)
Acresce a ausência do nexo de instrumentalidade e de dependência, como excepção dilatória atípica e específica dos procedimentos cautelares.
Os procedimentos cautelares não gozam, em regra, de autonomia. Visando a tutela provisória de um direito, mediante um juízo meramente sumário sobre a sua existência (art. 387º, nº 1, do CPC), e pressupondo a verificação de uma situação de periculum in mora (art. 381º, nº 1), a providência cautelar está naturalmente dependente da confirmação declarada em processo dotado de mais solenidade e que terá de ser instaurado nos termos do art. 389º do CPC.[1] Quando assuma a natureza preliminar, exige-se que seja posteriormente instaurada a acção principal relativamente à qual se verifique o nexo de dependência funcional (art. 383º do CPC). Quando instaurado por apenso a acção já pendente, deve manter com esta o mesmo nexo de instrumentalidade e de dependência.
Ainda que não tenha de existir total correspondência entre o objecto do procedimento cautelar e o objecto da acção principal, a função instrumental que a lei atribui às providências cautelares não é compatível com o total “divórcio” entre os respectivos objectos, impondo-se, ao menos, que o facto que serve de fundamento à providência integre a causa de pedir da acção principal ou da respectiva reconvenção.
A verificação dessa correspondência mínima torna-se mais evidente em casos em que a providência cautelar é requerida por apenso à acção pendente, sendo, em tais circunstâncias, mais fácil verificar se e em que medida a providência visa prevenir ou antecipar efeitos que se pretendem extrair do pedido formulado na acção, em conjugação com a respectiva causa de pedir.
Ora, o que acima se disse quanto à falta de competência conexa com o objecto da acção de divórcio, revela bem a ausência do referido nexo de instrumentalidade. A restituição provisória da posse é instrumental em relação à acção de restituição da posse que de modo algum se inscreve nos limites da competência especializada atribuída aos Trib. de Família e de Menores.
(...)
No caso concreto, o requerente usou um meio inadequado para tutelar o seu direito à utilização da casa de morada de família, enquanto este não for regulado de modo definitivo. Apesar da existência de instrumento específico que, com facilidade, poderia ter sido usado para regular provisoriamente a situação, o Tribunal a quo enveredou pelo deferimento da pretensão deduzida pelo requerente sem ponderar que a sua área de competência está circunscrita às questões de natureza eminentemente familiar, bem longe dos aspectos ligados à tutela da posse ou do direito de propriedade.
O facto de, em concreto, a casa de morada de família estar dividida por duas fracções confinantes, no mesmo prédio é bem revelador da facilidade com que se poderia ter concretizado aquela regulação provisória, compatibilizando razoavelmente as diversas exigências e interesses, sem que o Tribunal a quo tivesse de abdicar do cumprimento de regras imperativas sobre a competência especializada ou de passar ao largo (muito ao largo, aliás) das exigências formais colocadas pela instrumentalidade e dependência relativamente à acção de divórcio pendente.
(...)
Ao enveredar pela restituição provisória da posse o requerente, sem a necessária filtragem do tribunal a quo, conseguiu que a providência fosse decidida sem audição da parte contrária.
Ora, nem sempre os fins justificam os meios. Ainda que a requerida tenha circunscrito a sua defesa à dedução do presente recurso de agravo, tal não significa que este Tribunal da Relação possa considerar supervenientemente superados aspectos de ordem formal que foram desrespeitados."


5) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2514/2008-6:
"I. Se a decisão arbitral condenar em termos genéricos, nos termos do n.º 2 do art. 661.º do CPC, o credor, para lhe conferir exequibilidade, necessita previamente de deduzir o incidente de liquidação, no respectivo tribunal arbitral, nos termos do n.º 2 do art. 378.º do CPC, com a aplicação do regime específico previsto no art. 380.º-A do CPC.
II. A falta de exequibilidade do título executivo, por falta de liquidez da obrigação exequenda, não suprível no início do processo executivo, constitui um dos fundamentos, expressamente admitidos, de oposição à execução baseada em sentença – alíneas a) e e) do art. 814.º do CPC.
III. Com a prestação de caução pelo executado, procurou-se obter um justo equilíbrio entre, por um lado, os interesses do exequente, que pretende a satisfação coerciva, em prazo razoável, do direito de crédito, e, por outro, os interesses do devedor, a quem assiste o direito de se opor, designadamente à execução do património, garantindo-se a eficiência do processo executivo.
IV. Ao deixar de subsistir, no processo de execução, a motivação que sustentava a prestação da caução, por procedência da respectiva oposição e pagamento da quantia exequenda, é admissível o levantamento da caução.
V. A circunstância da decisão sobre a procedência da oposição à execução ainda não ser definitiva, em resultado da sua impugnação, não releva, em virtude de ter sido fixado, ao respectivo recurso, o efeito meramente devolutivo.
VI. Se a interposição do recurso tivesse um efeito negativo, quanto à caução, sempre se poderia reduzir o seu montante, levando em consideração o valor da obrigação já satisfeita."

Nota - Cfr., sobre o primeiro ponto, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23-10-2007, proferido no processo n.º 0623032, já referido em nota ao segundo acórdão.
Ainda sobre a condenação genérica, cfr.
o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2523/2008-8, cujo sumário está infra transcrito como acórdão "9)"


Outras decisões, não anotadas.

6) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-04-2008, proferido no processo n.º 1409/2008-2:
"I – Num processo de execução, o requerimento de remessa dos autos à conta para liquidação, quando não se mostra garantido o pagamento da quantia exequenda nem que ocorreu qualquer outro facto extintivo da execução, não constitui um acto de impulsão do processo.
II – Assim, tal requerimento não obsta a que os autos sejam remetidos à conta nos termos do art.º 51º nº 2 do C.C.J. (paragem do processo por inércia das partes)."


7) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 868/2008-2:
"I- A declaração, na matéria provada, de que a letra subscrita pelos executados foi “substituída” por outras três, não pode ser interpretada como querendo dizer que a respectiva obrigação cambiária foi considerada extinta pelas partes, em virtude da emissão das novas letras: com esse sentido, a referida palavra assumir-se-ia como um conceito de direito, uma conclusão jurídica.
II – A extinção, por novação, da primitiva obrigação cambiária, exige uma inequívoca manifestação de vontade nesse sentido, a qual não se presume, nomeadamente quando a letra primitiva continuou na posse da exequente e as novas letras foram subscritas tão só pelo filho dos executados, subscritores da letra primitiva, não sendo crível que a exequente aceitasse perder o acréscimo de garantias do seu crédito constituído pelo aceite cambiário formalizado pelos pais do devedor."


8) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 1083/2008-2:
"I - Ao deduzir a sua pretensão em juízo, o demandante tem de identificar bem aquilo que pede, formulando o pedido, e de indicar os respectivos fundamentos, sendo estes a causa de pedir. Esta é sempre constituída por factos concretos, e não por conclusões, ou categorias abstractas.
II - Nas acções fundadas em incumprimento contratual, só relevam como causa de pedir as concretas situações de incumprimento que foram invocadas.
III - A posterior invocação de outra situação concreta de incumprimento contratual, como fundamento da ampliação do pedido de indemnização, traduz também uma ampliação da causa de pedir que, nos termos do art. 273.º n.º 1 do CPC, só é admissível na réplica."


9) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2523/2008-8:
"1 - Só é possível deixar para liquidação a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora provada a sua existência, não existam elementos para fixar o montante, nem sequer recorrendo à equidade.
2 - Provando-se apenas que o autor causou prejuízos ao réu de montante não concretamente apurado, não fornecendo o processo elementos para determinar o objecto ou a quantidade da condenação, a única solução jurídica é proferir condenação ilíquida, não sendo caso de recorrer a juízos de equidade nos termos do artigo 566º nº 3 do Código Civil, pois os factos provados não fornecem os limites legais exigíveis para aplicar esse conceito."


10) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-04-2008, proferido no processo n.º 8950/2007-2:
"I - O artigo 715º do CPCivil, ao prever a regra da substituição ao Tribunal recorrido, pressupõe que o processo, sem embargo da nulidade cometida, contém todos os elementos para decidir.
II - Se por via da nulidade, isso não acontecer, vg, por existir matéria controvertida não considerada pelo Tribunal recorrido, o Tribunal de recurso não deverá conhecer do mérito da causa, apenas lhe sendo licito anular a sentença."


11) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 8720/2007-2:
"I- A notificação implícita no disposto no art.º 484º, n.º 2, do Código de Processo Civil é sucessiva, que não concomitante.
II- Porém, não tendo a A. apresentado alegações, a preterição de tal ordem sucessiva em nada belisca o princípio do contraditório.
II- A retroactividade da Lei Nova (LN) expressa na norma transitória do art.º 26º do NRAU, traduzindo-se na aplicabilidade do novo regime da resolução contratual aos contratos de arrendamento anteriormente celebrados, não vai ao ponto de fazer aplicar as novas regras de resolução a esses anteriores contratos, quando a causa de resolução seja um facto ocorrido antes da entrada em vigor daquele regime."


12) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-04-2008, proferido no processo n.º 867/2008-7:
"I - Nas acções de simples apreciação, não significa que os interessados tenham já visto o seu pretenso direito violado ou ameaçado por outrem que dele se arrogue; este tipo de acções potencia a paz social, prevenindo futuros litígios, fixando-se atempadamente a certeza da existência ou inexistência do direito ou de um facto;
II - O direito do Réu – Estado de herdeiro da falecida (artº1254 do Código Civil) pré -existe à instauração da acção, não constitui simples expectativa, e para fazer valer o seu direito não precisa de o reclamar, e em lado algum, disse renunciar a tal direito;
III - A melhor interpretação do disposto no artº343 do Código Civil aponta para que nas acções de simples apreciação, a lei faz impender sobre o Autor a obrigação de provar os factos impeditivos e extintivos, enquanto, ao Réu caberá a prova dos factos constitutivos;
IV - O Réu dispensou-se de alegar factos que demonstrassem que os bens e valores descritos pelos Autores eram da plena propriedade da falecida, pelo que jamais podia o Tribunal levá-los à base instrutória, como é dito nas alegações;
V - O non liquet do julgador converte-se contra a parte que tem o ónus de prova, de acordo com o estabelecido no artº8, nº1 do Código Civil."


13) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2301/2008-8:
"1º - A nova disciplina do arrendamento urbano passou a ser regulada pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, diploma que revogou o anterior regime de arrendamento urbano (RAU ) e aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).
2º - Resulta dos artigos 26º nº 1, 59º nº 1 e 60º nº 1 do NRAU que o novo regime se aplica aos arrendamentos vigentes à data da sua entrada em vigor, sendo de aplicação imediata as normas que dispõem directamente sobre o conteúdo da relação de arrendamento e abrangem as relações já constituídas, com excepção das ressalvadas no mencionado artigo 26º nºs 2 a 6.
3º - A questão colhe ainda outro argumento se analisada à luz dos princípios consagrados quanto à aplicação das leis no tempo, no nº 2 do artigo 12º do Código Civil, segundo o qual, a lei, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.
4º - No caso sub judice, porque está em causa a instauração de uma acção judicial de despejo com fundamento na falta de residência permanente, situação que não se mostra excepcionada pelo artº 26º, pode-se concluir que o novo regime de arrendamento urbano – NRAU – tem aqui plena aplicação, inexistindo fundamentação legal para arredar os seus princípios ou subtrairmos do seu campo de aplicação o caso em análise.
5º - Tendo o réu deixado de usar o locado por mais de um ano, verifica-se o incumprimento por parte do réu do dever de usar efectivamente a coisa para o fim do contrato, o que constitui motivo para a resolução do contrato.
6º - Passando a viver num lar com carácter de permanência por virtude da sua doença (incapacidade física permanente fixada em 75%, como carácter definitivo, com incapacidade de viver sozinho, carecendo de cuidados permanentes), tais motivos tornam injustificável a não ocupação do locado, sendo inexigível ao autor a manutenção do arrendamento."


14) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2080/2008-8:
"1.Não tendo sido paga, total ou parcialmente, a taxa de justiça inicial devida, a secretaria deverá recusar o recebimento da petição ou requerimento inicial.
2.Não o tendo feito, caberá ao juiz proferir despacho ordenando a respectiva devolução ao apresentante.
3.O apresentante dispõe de 10 dias, contados da data de notificação desse despacho, para apresentar nova petição ou requerimento inicial, procedendo ao prévio pagamento da taxa de justiça inicial.
4.Se o fizer, considera-se a acção proposta na data da anteriormente apresentada."


15) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 2919/2008-6:
"I. No regime de custas anterior ao introduzido pelo DL 324/2003, de 17/12, nas ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide, que devam ser tributadas segundo os princípios que regem a condenação em custas, a taxa de justiça é fixada pelo juiz em função da sua complexidade, do processado a que deu causa ou da sua natureza manifestamente dilatória entre metade de 1 UC e 10 UC (art. 16º do CCJ).
II. Decidir se determinado depoimento de parte deve ser admitido no âmbito da produção de prova é decidir de uma questão incidental, questão estranha ao desenvolvimento normal da lide e que não é essencial à resolução desta, e cuja utilidade económica não é determinável, pelo que se trata de ocorrência processual tributável com a taxa de justiça prevista pelo art. 16º do CCJ, com afastamento da taxa de justiça prevista no art. 18º/2 do mesmo código.
III. Assim sendo a taxa de justiça aplicável aos recursos de Agravo contados no processo não era a taxa de justiça prevista no art. 18º/2 (metade da constante na tabela), mas antes a prevista no art. 16º, a fixar, nas respectivas decisões entre metade de 1 UC e 10 UC. "


16) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-04-2008, proferido no processo n.º 1832/2008-8:
"1. O documento que consubstancia um contrato de concessão de crédito pessoal é título executivo, em execução fundamentada no incumprimento do mesmo contrato e na respectiva resolução pelo credor, quando a quantia exequenda coincide com o valor das prestações não pagas.
2. Neste caso não estamos perante uma indemnização mas antes mera restituição ou reembolso da quantia mutuada. "

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