quinta-feira, maio 10, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa

1) Acórdão de 26-04-2007, proferido no processo n.º 3210/2007-6:
"No requerimento de arresto deve o credor alegar factos tendentes à formulação de um juízo de probabilidade da existência do crédito e justificativos do receio invocado. Na fórmula genuína do «justo receio de perder a garantia patrimonial» cabe uma variedade de casos, tais como os de receio de fuga do devedor, de sonegação ou ocultação de bens e de situação deficitária, não bastando que o requerente se limite a alegar meras convicções, desconfianças ou suspeições de tais situações.”
Se a requerente se limitou a alegar que os requeridos «andam praticando actos comerciais abusivos», que «levam já a algum tempo uma vida comercial irregular, no sentido de pretenderem dissipar os bens» e que a sua situação económica é «muito precária devido à crise que se verifica e que se instalou no país e que é do conhecimento geral» não cumpriu, a requerente, o ónus de alegação fáctica que sobre ela impendia, uma vez que não integra factos concretos passíveis de prova e que possam conduzir à demonstração, ainda que sumária, do perigo da insatisfação do direito invocado (artigos 342º nº 1 do Código Civil e artigos 264º nº 1 e 467º nº 1 al. c) do Código de Processo Civil)"
.

Nota - Esta matéria foi já tratada num post anterior - cfr.
aqui, pelo que escusado será repeti-la agora. Às decisões então citadas limito-me a acrescentar - na mesma linha - uma outra citada na decisão: o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-01-2000, proferido no processo n.º 99B1201. Na ligação referida para o post anterior, é possível encontrar algumas aplicações concretas do critério que a maioria da jurisprudência tem seguido, a este respeito.


2)
Acórdão de 24-04-2007, proferido no processo n.º 8939/2006-1:
"Os poderes do julgador no domínio da qualificação jurídica não são arbitrários nem ilimitados: eles estão balizados pelo respeito que deve, simultaneamente, aos factos demonstrados e à causa de pedir invocada, que é inalterável por sua iniciativa - art.ºs 264º e 664º in fine, do CPC. Devendo, assim, existir identidade entre a causa de pedir e a causa de julgar.
As respostas aos quesitos apenas podem, por princípio, corresponder a um “provado” ou “não provado”. E, quando muito, podem ser restritivas, ou, mesmo explicativas, mas apenas em aspectos circunstanciais, adjacentes ou adjuvantes relativamente ao facto nuclear perguntado e nunca - extravazando este - podendo acarretar a superveniência de matéria nova, essencial para a decisão da causa, que não tenha sido alegada e quesitada.
Verifica-se este extravazamento e fere-se aquela identidade – com relevantes e diferentes consequências na posterior subsunção jurídica - quando a autora alega que acordou com a ré entregar-lhe certo montante para que esta, com o mesmo, adquirisse ouro e lho entregasse - o que foi plasmado na BI - e o Sr. Juiz responde que as partes anuíram que a entrega da verba pela autora à ré, tinha como contrapartida, não a posterior entrega de artigos de ouro, mas a comparticipação nos lucros decorrentes de uma actividade comercial de compra e venda destes artigos por parte da ré.
Devendo, a factualidade extravazante ser dada como não escrita"
.

Nota - Sobre a coincidência entre a causa de pedir e a causa de julgar, cfr. os acórdãos do STJ
de 14-11-2006, proferido no processo n.º 06B3290, de 16-01-2007, proferido no processo n.º 06A4009, de 20-06-2006, proferido no processo n.º 06A1023 (este analisando a medida em que deve considerar-se uma resposta como meramente explicativa), de 13-02-1996, proferido no processo n.º 087337, de 02-07-1992, proferido no processo n.º 082088, e de 05-05-1988, proferido no processo n.º 075979, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 09-12-1993, proferido no processo n.º 0074852.
O uso mais alargado (embora ponderado) da resposta explicativa permitiria, na minha opinião, compreender muito melhor a resposta aos quesitos em alguns processos nos quais ela se revela demasiado despida de contexto.



3)
Acórdão de 26-04-2007, proferido no processo n.º 1614/2007-6:
"É admissível a constituição da reserva de propriedade com vista a garantir um direito de crédito de terceiro, abrangendo a referência, no art. 18º, nº 1 do DL 54/75, ao “contrato de alienação” também o contrato de mútuo conexo com o de compra e venda e que esteve na origem da reserva de propriedade.
Parece perfeitamente admissível a constituição da reserva de propriedade com vista a garantir os direitos de crédito emergentes de um contrato de mútuo cuja finalidade última é a de assegurar o pagamento do preço da coisa ao seu alienante, o que, de resto, sempre acolheria protecção na própria lei, que permite como condicionante à transferência da propriedade, “a verificação de qualquer outro evento”, que não apenas o cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de compra e venda, (cfr. parte final do art. 409º, 1, do C. Civil).
A lei permite que se o devedor cumprir com dinheiro ou outra coisa fungível emprestado por terceiro pode sub-rogá-lo nos direitos do credor. Esta situação de sub-rogação não carece do consentimento do credor e depende de declaração expressa, no documento do empréstimo, de que a coisa se destina ao cumprimento da obrigação e de que o mutuante fica sub-rogado nos direitos do credor (art. 591º do Código Civil).
A referência ao "contrato de alienação"constante do disposto no artº 18º, nº 1 do DL nº 54/75, tal como a constante do art. 409º do C. Civil é de entender como extensiva ao contrato de mútuo conexo com o de compra e venda e cujo cumprimento esteve na origem da reserva de propriedade"
.

Nota - O problema da reserva da propriedade constituída a favor do mutuante não vendedor já foi repetidamente tratado neste blog (cfr., em particular,
este post), pelo que me limito a remeter para a referida ligação, lembrando que a resposta a esta questão é determinante para responder à pretensão do mutuante de exercer os direitos previstos no DL n.º 54/75, especialmente o uso do procedimento de apreensão de veículo.
Questão também muito discutida, quanto à reserva de propriedade, é a da possibilidade de a ela se renunciar nos autos de execução (sem pedir o cancelamento do registo), tendo igualmente sido analisada em post anterior (cfr.
aqui).

Etiquetas: , , , , ,

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]


Página Inicial