quarta-feira, outubro 03, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Coimbra (parte 2 de 2)

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18-09-2007, proferido no processo n.º 408-A-2001.C1:
"O exequente que obteve a penhora do mesmo bem objecto do arresto requerido por outrem não tem, porque terceiro, legitimidade para requerer a extinção do arresto com base inércia do arrestante na instauração da execução, na expectativa de com a caducidade ver o seu crédito graduado em 1º lugar.
O art. 410º do CPC não é aplicável ao caso de execução de sentença homologatória de uma transacção na qual se constituiu a obrigação exequenda a cumprir no prazo de seis meses"
.

Nota
- O entendimento constante da decisão anotada quanto ao conhecimento oficioso da caducidade da providência cautelar não é pacífico na jurisprudência.
A decisão em causa considerou que o tribunal não deveria conhecer oficiosamente dessa caducidade. No mesmo sentido (até mais generoso, considerando que o conhecimento oficioso da caducidade da providência não ocorre em caso algum), pode ler-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 11-01-2000, proferido no processo n.º 2674/99. Numa hipótese de embargo de obra nova, perfilhou entendimento semelhante ao da decisão anotada o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16-11-1999, proferido no processo n.º 9921166, e já o acórdão do mesmo tribunal de 14-04-1994, proferido no processo n.º 9341295, tinha seguido a mesma linha, embora tenha aplicado o CPC na redacção anterior à reforma de 1995/96, onde a solução encontrava apoio legal mais explícito.
Em sentido oposto - entendendo, pois, que a caducidade da providência é de conhecimento oficioso, desde que comprovada nos autos, claro está -, podem ler-se os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto
de 07-12-2006, proferido no processo n.º 0634625, de 09-06-1999, proferido no processo n.º 9930709, de 03-02-2000, proferido no processo n.º 9931240, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-02-2001, proferido no processo n.º 0114468, e de 06-12-2001, proferido no processo n.º 00111468.
Entendo que esta última posição - a favor do conhecimento oficioso da caducidade da providência - resulta com bastante clareza da redacção actual do n.º 4 do artigo 389.º do CPC, sendo difícil, em face de tal norma, sustentar a posição contrária. Parece, aliás, ter sido precisamente essa a intenção da comissão revisora, ao adoptar a redacção em causa (cfr. Lebre de Freitas/Montalvão Machado/Rui Pinto, Código de Processo Civil anotado, vol. II, Coimbra: Coimbra Editora, 2001, pág. 56, e Carlos Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, Coimbra: Coimbra Editora, 2004, pág. 359).


2)
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18-09-2007, proferido no processo n.º 357/98.1GBAGD-C.C1:
"A partilha extrajudicial do património comum do casal, efectuada posteriormente ao registo da penhora sobre ele incidente, apenas cabendo tornas ao executado, é inoponível ou ineficaz relativamente à execução.
Consequentemente, improcede a oposição deduzida contra a penhora pelo cônjuge do executado
"
.

Nota - No sentido da decisão anotada, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 28-04-1975, in BMJ n.º 246, pág. 114, e
de 30-03-2006, proferido no processo n.º 05B3646 (a decisão cita ainda outros acórdãos, sem mencionar a data, podendo encontrar-se tal referência na fundamentação, seguindo a ligação respectiva).
Considerando também ser inoponível ao exequente a divisão de coisa comum penhorada, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 25-03-2004, proferido no processo n.º 04B584, e do Tribunal da Relação do Porto de 13-05-2003, proferido no processo n.º 0322275.


3)
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-09-2007, proferido no processo n.º 1093/05.0TTLRA.C1:
"Na impugnação da matéria de facto, o ónus resultante para o impugnante do artº 690º-A, nº 1, als. a) e b), do CPC, impõe-se para que, em sede de recurso, se possa, adequadamente e mediante as correctas indicações, proceder ao exame crítico das provas que servem de base para formar a convicção probatória.
Deste modo, ao recorrente não basta indicar as provas a partir das quais entende dever formar-se convicção diversa, mas deverá expor os concretos motivos que o levaram a considerar aquelas provas como idóneas e relevantes, bem como de expor os critérios utilizados na apreciação daquelas e o substrato racional que deverá conduzir à convicção diversa.
Tem entendido a jurisprudência maioritária que só quando os elementos dos autos conduzam inequivocamente a uma resposta diversa da dada em 1ª instância é que o tribunal superior deve alterar as respostas que ali foram dadas.
Perante elementos de prova contraditórios deve prevalecer a resposta dada em 1ª instância, no domínio da convicção que formou com fundamento no princípio da sua livre convicção e liberdade de julgamento".


Nota - Quanto aos poderes da Relação na alteração da matéria de facto, cfr. a nota ao
acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22-03-2007, proferido no processo n.º 1474/05-3, que deixei aqui.
As limitações da segunda instância na reapreciação da prova, por não beneficiar da imediação de que gozou a primeira instância têm sido muitas vezes referidas na jurisprudência. Vejam-se, entre muitos outros, os seguintes acórdãos: "ao fundamentar a sua decisão sobre a factualidade controvertida, a Exma. Juíza do tribunal recorrido explicitou os motivos por que considerou determinada matéria de facto e não outra, sendo que a credibilidade que entendeu dar às testemunhas é pela própria natureza das coisas praticamente insindicável pelo tribunal de recurso, que não dispõe da imediação na percepção das provas, factor decisivo para a formação da convicção em que assenta a decisão sobre a matéria de facto” – acórdão do Supemo Tribunal de Justiça
de 14-12-2006, proferido no processo n.º 06S1623; “tem[-se] entendido, com respeito pelos princípios da imediação, oralidade e contraditório, que a alteração da matéria de facto pela Relação só ocorrerá se, dos meios prova indicados pelo recorrente, valorizados no amplexo global da prova produzida, se verificar que tais elementos probatórios, em concreto, se revelam inequívocos no sentido pretendido” – acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-05-2007, proferido no processo n.º 0644648; “Tem, assim, que cuidar o recorrente que foi o Sr. Juiz, em primeira instância, que viu a face, os olhos, a mãos, a postura e o olhar das pessoas que depuseram em audiência de julgamento e que terá sido em vista do depoente no seu todo, que o Sr. Juiz decidiu. Pelo que nós, os Desembargadores, poderemos avaliar as palavras, os documentos, mas não o rosado da face, os olhares para o advogado e um sem número de trejeitos que não podem ser dissociados. De facto, é hoje pacífico que o intérprete, entenda-se, o julgador, ignora o significado de um sorriso e, ou de uma lágrima, as quais, nas gravações fonográficas são absolutamente imperceptíveis!” – acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-09-2004, proferido no processo n.º 0434100; “Na realidade, o tribunal de segunda instância não vai à procura de uma nova convicção mas à procura de saber se a convicção expressa pelo tribunal “a quo” tem suporte razoável naquilo que a gravação de prova – com os mais elementos existentes nos autos - pode exibir perante si. Quem efectua o julgamento e contacta directamente com as testemunhas tem, necessariamente, uma percepção da prova muito mais completa do que aquilo que é trazido, mediante a gravação, aos juízes do tribunal de recurso.” – acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02-11-2006, proferido no processo n.º 5173/2006.2.


4)
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11-09-2007, proferido no processo n.º 265/06.4TBCDN-A.C1:
"A circunstância de parte do crédito do reclamante IGFSS gozando de privilégio mobiliário geral ter-se constituído e vencido em data anterior à penhora e a outra parte em data posterior à penhora não autoriza cindir-se tal crédito para graduar uma parte antes e a outra parte depois do crédito do exequente garantido pela penhora.
A regra do art. 822º do CC não é aplicável ao concurso entre esses créditos
"
.

Nota - Sendo muito simples e sucinta a fundamentação, passo a transcrevê-la:
"Estamos em presença de crédito do IGFSS por contribuições e respectivos juros, em concurso com um crédito comum da exequente, apenas garantido pela penhora. E o bem penhorado é móvel.
Embora o Código Civil de 1966 tenha passado a reger a generalidade dos privilégios creditórios, logo no art. 8º nº 2 do Decreto-Lei preambular ressalvou a vigência de regimes especiais. E nestes regimes especiais contam-se, entre outros, os relativos a créditos da previdência, depois Segurança Social.
Os créditos das instituições da Segurança Social (antes caixas de Previ­dência) pelas contribuições e respectivos juros passaram a gozar das garantias que constavam do DL nº 512/76 de 3-7 e que constam dos art. 10º a 13º do DL nº 103/80 de 9-5. Trata-se de regime especial, específico das contribuições respecti­vas, que afasta o que em adverso consta do regime geral, designadamente no que respeita à graduação.
Assim, e apenas na parte que no caso interessa, por força do art. 10º do DL nº 103/80, os referidos créditos «por contribuições e respectivos juros de mora gozam de privilégio mobiliário geral, graduando-se logo após os créditos referidos na al. a) do nº 1 do art. 747º do Código Civil» (nº 1), privilégio este que prevalece sobre qualquer penhor ainda que de constituição anterior (nº 2).
Os créditos do regime geral da Segurança Social gozam pois de privilégio mobiliário geral, nos termos daquele art. 10º nº 1, sem qualquer restrição tem­poral à eficácia desse privilégio. Asserção essa que engloba os «respectivos juros».
Por fim, deve notar-se que o invocado art. 822º do CC preceitua no seu nº1 que, «salvo nos casos especialmente previstos na lei, o exequente adquire pela penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior»"
.
Note-se que está em causa aqui um privilégio mobiliário e não um privilégio imobiliário.
Quanto ao privilégio mobiliário da Segurança Social e à sua graduação, cfr. ainda o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 26-09-1995, proferido no processo n.º 087303 (também in BMJ n.º 449, pág. 339).

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