quarta-feira, março 28, 2007

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (parte 2 de 2)

1) Acórdão de 22-03-2007, proferido no processo n.º 06A3279:
"A prescrição pode ser interrompida pelo reconhecimento do direito, expresso ou tácito, efectuado perante o respectivo titular .
O reconhecimento do direito é uma mera declaração de ciência, quanto ao conhecimento do direito do titular .
Para que o reconhecimento interrompa a prescrição, não é de exigir que o seu autor o faça com essa intenção de interromper a prescrição .
Mostrar-se disponível junto do credor para proceder ao pagamento da dívida ou da indemnização, fazer pedido de prorrogação do prazo ou alegar impossibilidade momentânea para o fazer, é reconhecer inequivocamente o direito do credor".

Nota - Cfr. também os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23-3-2000, in CJ 2000, I, pág. 288 ("I - O reconhecimento da dívida constitui um negócio, que deve ser interpretado com o sentido que lhe daria um declaratário normal. II – Se da declaração não for de concluir que o devedor reconheceu a dívida e se compromete a pagar, essa declaração não interrompe a prescrição."), do Tribunal da Relação de Coimbra de 09-01-1990, in CJ 1990, I, pág. 82 ("I – Não é relevante o reconhecimento da obrigação feito perante terceiro "nem o reconhecimento tácito que não se baseie em factos que inequivocamente o exprimem". II – Os trabalhadores de uma empresa, pública ou privada, só pelo facto de o serem, não são representantes da entidade patronal. III – Pelo que respeita aos bancos e outras empresas públicas são os respectivos gestores e membros do conselho de administração que têm como função os actos relativos a objectivos das empresas e representá-las. IV – Tendo ficado apenas provado que o executado reconheceu perante funcionários do banco embargado a dívida em questão prometendo sempre pagá-la, e não também que tais funcionários eram representantes deste, não pode ter-se por interrompida a prescrição.").


2) Acórdão de 22-03-2007, proferido no processo n.º 06A4449:
"As decisões judiciais constituem actos jurídicos a que se aplicam, por analogia, as normas que regem os negócios jurídicos (art. 295º C. Civil), valendo, na respectiva interpretação, as normas do n.º 1 dos arts. 236º e 238º C. Civil;
Importa, porém, ter em consideração que, não se estando de um verdadeiro negócio jurídico, a decisão judicial não traduz uma declaração pessoal de vontade do julgador, antes exprimindo “uma injunção aplicativa do direito, a vontade da lei” no caso concreto, que o declarante se situa “numa específica área técnico jurídica”, investido na função de aplicador da lei, que, por sua vez, está obrigado a interpretar, em conformidade com as regras estabelecidas no art. 9º C. Civil, dirigindo-se outros técnicos de direito.
A lei – DL n.º 29/95, de 15/12 – é omissa quanto à fixação de prazo para arguição de anomalias verificadas na gravação de prova;
Tratando-se de nulidade secundária de acto processual, a regra é que prazo seja de 10 dias, contado da data em que foi cometida a irregularidade;
Porém, como o acto viciado se encontra oculto e o seu conhecimento depende de um acto da parte – audição do registo – instrumental de outro acto processual – a alegação de recurso -, mas praticado fora do processo, o prazo para invocar a irregularidade/nulidade de inaudibilidade terá de ser o que está a decorrer para a prática do acto de que a regularidade do acto omitido é condição necessária e cuja regularidade igualmente pressupõe, isto é, o prazo para a apresentação das alegações, salvo se se demonstrar que o reclamante teve conhecimento do vício mais de dez dias antes do termo desse prazo".

Nota - Como referi já anteriormente (cfr. aqui), é muito controvertido na jurisprudência o regime da nulidade por deficiências na gravação da prova. Na ligação anterior, é possível encontrar o levantamento que efectuei das várias correntes.
No entanto, a posição subscrita no acórdão em análise (e que também se encontra nos acórdãos do STJ de 12-03-2002, proferido no processo n.º 01A4057, e do Tribunal da Relação do Porto de 27-04-2006, proferido no processo n.º 0630901) parece-me ser a mais equilibrada, e a sua fundamentação parece-me também particularmente feliz e bem conseguida. Apesar de ser um pouco extensa para uma anotação, deixo-a aqui, por merecer o destaque.
" O art. 2.º do DL n.º 39/95, de 15-2, diploma que estabelece o regime do registo da prova nas audiências finais, é omisso quanto à fixação, seja de início, seja de termo, de qualquer prazo para arguição das anomalias verificadas na gravação, limitando-se a prevenir que "se, em qualquer momento, se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que for essencial ao apuramento da verdade" (art. 9.º cit.).
Mais se dispõe aí que incumbe ao tribunal facultar, no prazo máximo de oito dias após a realização da respectiva diligência, cópia do registo á parte que a requeira, incumbindo ao requerente que use da faculdade fornecer ao tribunal as fitas magnéticas necessárias - art. 7.º-2 e 3.
Porém, apesar da falta de indicação expressa da lei, afigura-se-nos que ela fornece duas linhas de orientação incontornáveis:
- por um lado, até ao encerramento da audiência, pelo menos, a repetição do registo deve ter lugar sempre que, em qualquer momento, se tomar conhecimento da anomalia; e,
- por outro lado, as partes não estão sujeitas a qualquer prazo para solicitar a entrega da cópia, mas apenas a Secretaria Judicial, e, por isso, se a parte interessada na obtenção do registo o pede quando está a correr o prazo para apresentação da sua alegação, cumprido que seja pela Secretaria o prazo máximo para a entrega, terá ela (parte) de sofrer as inerentes consequências que corresponderão, pelo menos, a um encurtamento do prazo que lhe era legalmente concedido para a prática o acto recursivo, prazo que, no limite, pode ficar reduzido a apenas um dia.
Tratando-se de nulidade processual, e ultrapassado o campo de aplicação do art. 9.º, o prazo para a arguição é de dez dias e conta-se do dia em que, depois de cometida a irregularidade, «a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que não tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência» - art.s 205.º-1 e 153.º-1 CPC.
Ora, afigura-se-nos que o caso dos autos se não "encaixa" directamente na previsão legal sobre o momento de conhecimento do acto viciado para efeitos de início do prazo preclusivo de sanação.
Com efeito, o acto processual viciado não está patente no processo por forma a poder ser directamente detectado através de exame dos autos, como supõe o regime estabelecido no art. 205.º-1.
Diferentemente, o acto viciado encontra-se oculto e o seu conhecimento depende da prática de um outro acto material da parte, instrumental de outro acto processual - a alegação de recurso -, mas praticado fora do processo. Por isso, terá a norma sobre o momento de conhecimento de ser entendida à luz dessa especial situação e a ela devidamente adaptada.
Isto posto:
O momento do conhecimento de eventuais irregularidades que inviabilizem o efeito útil dos registos fonográficos coincidirá, como é natural, com o momento da sua audição;
A lei não fixa, nem prevê, quaisquer prazos, quer para que a parte proceda ao pedido e levantamento dos suportes de registo da prova, quer para que leve a efeito o seu exame e audição para, a partir deles, denunciar vícios de gravação;
Assim, apesar da extensão do prazo para alegações por dez dias (art. 698.º-6), nada impede, e bem pode acontecer, que a parte proceda à audição das cassetes apenas no último dia do prazo para apresentação da alegação, desde que ainda em tempo de praticar o acto - entrega do suporte da alegação de que pudesse constar a impugnação da matéria de facto - em juízo, sem ou com alguma das multas previstas no art. 146.º-5 e 6.
De facto, o último dia de um prazo processual é, como o seu primeiro, tempo útil para a prática válida do acto e, a nosso ver, do mesmo modo que não pode presumir-se que pelo facto de ter levantado as cassetes a parte logo tomou conhecimento dos defeitos de registo, também não pode ter-se por exigível que proceda à audição em termos de invocar eventuais anomalias, seja nos dez dias subsequentes a essa entrega, seja em qualquer outro prazo de dez dias que não seja o da data do efectivo conhecimento do vício - data que, por se tratar de acto praticado fora do processo, não se vê como demonstrar - que integra a nulidade e, por via disso, taxar de negligente a conduta da parte.
Consequentemente, entende-se que o prazo para arguir a nulidade terá de ser o que está a decorrer para a prática do acto de que a regularidade do acto omitido é condição necessária e cuja regularidade igualmente pressupõe, isto é, o prazo para a apresentação das alegações, sem ou com multa, salvo se se demonstrar que o reclamante teve conhecimento do vício mais de dez dias antes do termo desse prazo".

3) Acórdão de 22-03-2007, proferido no processo n.º 07A296:
"Havendo litisconsórcio necessário, o recurso interposto apenas por uma das partes aproveita aos seus compartes que não tenham recorrido nem assumido a posição de recorrentes principais, no sentido de, além de impedir o imediato trânsito em julgado da decisão recorrida quanto aos não recorrentes, estes só poderem ver a decisão que lhes foi desfavorável ser alterada quanto a eles se também o for quanto ao recorrente".

Nota - O mesmo efeito (aproveitamento do recurso), é admitido também em relação a hipóteses de litisconsórcio voluntário, como é o caso da acção movida contra devedores solidários - cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-03-2006, proferido no processo n.º 06A243 (embora aqui com algumas limitações, como decorre do disposto no artigo 683.º do CPC).


4) Acórdão de 22-03-2007, proferido no processo n.º 07B708:
"(...)
O efeito cominatório próprio da revelia absoluta operante não ocorre quanto a factos para cuja prova a lei exija documento escrito, independentemente de a vontade das partes ser ou não eficaz para a produção do efeito jurídico que pela acção se pretende obter.
Seja qual for o tipo de acção em causa, o contrato de casamento só pode ser considerado provado desde que conste do processo a respectiva certidão ou boletim de registo."

Nota - Quanto à prova do casamento, já foi aqui analisada uma questão sui generis (as instâncias deram como provado o casamento sem que fosse junta a certidão respectiva e nenhuma das partes impugnou aquele facto, com fundamento em não ter sido provado pelo meio legalmente exigido no recurso para o STJ, vendo-se este obrigado a aceitar como provado o casamento mas não o regime de bens e confrontado com a questão da possibilidade de presumir esse regime, concluindo pela negativa - cfr. o acórdão de 09-01-2007, proferido no processo n.º 06A4403, analisado aqui).

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