quinta-feira, março 01, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 3 de 4)

1) Acórdão de 08-02-2007, proferido no processo n.º 9880/2006-8:
"A Lei nº 14/2006, de 26 de Abril, que alterou o disposto na alínea a) do nº1 do artigo 110º do Código de Processo Civil, aplica-se apenas às acções e aos requerimentos de injunção instaurados ou apresentados depois da sua entrada em vigor.
A cláusula contratual que estipula como competente o foro da comarca de Lisboa com expressa renúncia a qualquer não pode ser reconhecida pois o pacto de aforamento, que tal cláusula traduz, extravasa os limites da autonomia contratual consagrada no artigo 405.º n.º 1 do Código Civil.
O princípio da aplicação imediata da lei processual assenta no facto de o direito processual ser um ramo de direito público e que apenas regula o modo como as partes podem exercer os seus direitos e, de acordo com tal princípio, a nova lei processual deve aplicar-se imediatamente, não apenas ás acções que venham a instaurar- -se após a sua entrada em vigor, mas a todos os actos a realizar futuramente, mesmo que tais actos se integrem em acções pendentes.
IV- No caso da Lei nº 14/2006 foi introduzida uma restrição, já salientada, de a lei processual se aplicar apenas às acções instauradas depois da sua entrada em vigor.
V- A norma em causa não ofende o princípio constitucional da proporcionalidade ou da proibição do excesso nem o princípio da exigibilidade nem o princípio da não retroactividade da lei considerando, quanto a este último, que a nova lei não conduz a uma alteração inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente que atinja expectativas fundadas e razoáveis dos cidadãos e da comunidade".

Nota - Não há muito a dizer já sobre esta decisão. Ela insere-se em jurisprudência rigorosamente constante, quer da Relação de Lisboa, quer do Tribunal Constitucional, de que já falei aqui (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-11-2006, proferido no processo n.º 9244/2006-8, acórdão do Tribunal Constitucional n.º 691/2006, de 19 de Dezembro de 2006 e acórdão do Tribunal Constitucional n.º 41/2007, de 23 de Janeiro).


2) Acórdão de 08-02-2007, proferido no processo n.º 10077/2006-6:
"Quando se verificar a imperceptibilidade da gravação, estar-se-á em face de omissão de formalidades que a lei prescreve, constituindo tal omissão uma nulidade já que a irregularidade cometida é susceptível de influir no exame ou na decisão da causa.
Trata-se, todavia, de uma nulidade secundária que não é de conhecimento oficioso e que deve ser considerada sanada se não for arguida dentro do prazo de dez dias, a partir da data em que as gravações foram entregues pela Secretaria ao requerente, e apenas perante o tribunal onde ocorreu.
Tendo sido ouvidas testemunhas, sem que tivessem sido registados os seus depoimentos, ainda que a quesitos diferentes daqueles cujas respostas se questionam, a Relação não pode alterar a matéria de facto apurada pela 1ª instância, com fundamento na alínea a) do n.º 1 do artigo 712º CPC, porque podem ter influenciado, ainda que indirectamente, tais respostas".

Nota - A questão em análise (consequência da deficiência de gravação dos depoimentos) não está ainda muito bem definida na jurisprudência.
Considerou-se nesta decisão que tal constitui nulidade secundária que deve ser considerada sanada se não for arguida dentro do prazo de dez dias, a partir da data em que as gravações foram entregues pela Secretaria ao requerente, e apenas perante o tribunal onde ocorreu.
No acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29-11-2006, proferido no processo n.º 0625494, considerou-se que nem sempre tal omissão ou deficiência configuraria nulidade processual, o que me suscitou algumas dúvidas (cfr. aqui).
A decisão em análise tem apoio nos acórdãos do STJ de 06-07-2006, proferido no processo n.º 06B1899, de 29-01-2004, proferida no processo n.º 03B1241, de 20-05-2003, proferido no processo n.º 03A944,
No entanto, no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 31-10-2006, proferido no processo n.º 222/03.2TBALB.C1, considerou-se que
"essa nulidade deve ter-se como arguida pelos recorrentes quando nas suas alegações de recurso levantam a questão, insurgindo-se contra a aludida situação de deficiência e, em consequência, se pede a repetição do julgamento", considerando que não deve contar-se o prazo de 10 dias a contar da entrega das cassetes (com um argumento muito interessante: se a parte tem 40 dias para preparar o recurso, não deve esperar-se que ouça a gravação nos primeiros 10).
Posição parecida encontra-se também nos acórdãos do STJ de 12-03-2002, proferido no processo n.º 01A4057, do Tribunal da Relação do Porto de 27-04-2006, proferido no processo n.º 0630901, embora aqui se entenda que a arguição deve fazer-se na primeira instância, no prazo para alegações.
Ou seja: uma corrente defende que a arguição da nulidade deve fazer-se na primeira instância, contando-se 10 dias a partir da entrega das cassetes; outra que deve arguir-se na primeira instância, dentro do prazo de recurso; e a outra considera que ela poderá fazer-se apenas nas alegações de recurso.
Uma espécie de ponte encontra-se no acórdão do STJ de 14-12-2005, proferido no processo n.º 04S4452 (em processo laboral, mas aplicando, nesta parte, as regras do CPC), onde se decidiu que
"tendo a parte arguido, claramente, a nulidade resultante de deficiências técnicas na gravação da prova, embora impropriamente formalizada em alegação de recurso, essa arguição deve ser aproveitada e entendida como requerimento dirigido ao juiz do processo onde foi cometida, de harmonia com o princípio da economia processual, de que se extrai uma regra de máximo aproveitamento dos actos processuais, que aflora, mormente, nos artigos 199.º, 201.º e 687.º, n.º 3, todos do Código de Processo Civil, e porque corresponde ao exercício de um direito da parte, artigos 203.º e 205.º do Código de Processo Civil e artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95".
Ainda é possível encontrar outras correntes, como, por exemplo, que os dez dias para a arguição da nulidade se contam da data em que se operou a transcrição dos depoimentos, se esta ocorrer (cfr. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12-10-2004, proferida no processo n.º 0422727).

Esta indefinição é diabólica, para os advogados. É bom que haja, em breve, harmonização de decisões.

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