terça-feira, janeiro 16, 2007

Jurisprudência do STJ

Deixo aqui alguns acórdãos hoje disponibilizados em www.dgsi.pt.

1) Acórdão de 09-01-2007, proferido no processo n.º 06A4236 - "Face ao disposto no art.º 152º do C.P.E.R.E.F., na redacção dada pelo Dec. - Lei n.º 315/98, de 20/10, com a declaração de falência extinguiam-se de imediato os privilégios creditórios que garantiam créditos do Estado, das autarquias locais e das instituições da segurança social, mas não a hipoteca legal que garantisse créditos dessas entidades, uma vez que aquele dispositivo era insusceptível, quer de aplicação analógica, quer de interpretação extensiva, a tal hipoteca".

2) Muito interessante é este
acórdão de 09-01-2007, proferido no processo n.º 06A4403, que trata o seguinte problema: se o concreto regime de bens do casamento não foi alegado pelos autores casados, poderá o tribunal presumir que os mesmos se encontram casados no regime da comunhão de adquiridos, sendo a determinação de tal regime essencial para a solução do pleito? A primeira instância considerou que não pode presumir-se o regime de bens, a Relação teve opinião contrária e o STJ decidiu contra a Relação, no mesmo sentido do tribunal de comarca.
É evidente que, se o casamento tivesse sido provado por certidão (como devia), o problema estaria resolvido, porque tal documento mencionaria o regime de bens. No entanto, as instâncias deram como provado o casamento sem que fosse junta a certidão respectiva e nenhuma das partes impugnou aquele facto, com fundamento em não ter sido provado pelo meio legalmente exigido (como, excepcionalmente, poderia, nos termos dos artigos 729.º, n.º 2 e 722.º, n.º 2, parte final do CPC), no recurso para o STJ.
O Supremo viu-se, pois, obrigado a aceitar como provado o casamento mas não o regime de bens (!), razão pela qual a questão se lhe coloca nos termos expostos.
Eis parte da fundamentação do acórdão, que me parece enquadrar corectamente o problema.

"Ora, postas as coisas nos termos referidos, no ponto concreto que nos preocupa, o busílis está em saber o regime de bens pelo qual os AA. regem a sua vida matrimonial e isto pela singela razão que só nos regimes de comunhão é que é defensável a comunicabilidade do arrendamento não habitacional (in casu, arrendamento comercial).
Como resulta do facto enumerado sob o nº 1, o contrato de arrendamento foi outorgado apenas entre os então proprietários do locado e o A. AA.

Aceitando como certo que, então, os AA. já estavam casados um com o outro, interessa, então, saber se a posição locatícia se comunicou à A. não arrendatária.
E, como se poderia saber isso?

À luz das regras do direito processual civil vigente, a resposta só pode ser esta: através da alegação por parte dos AA. da verificação de tal facto, como resulta da al. d) do nº 1 do art. 467º do CPC.
E foi precisamente esta ideia que o Mº juiz da 1ª instância realçou ao negar aos AA. a consagração da sua tese por mor da verificação da excepção da caducidade: "no quadro factual delineado pelos autores, nada vem articulado a tal respeito, pelo que nenhum efeito jurídico se pode retirar".

Não foi esse o caminho seguido pela Relação: esta entendeu, louvando-se no art. 264º do CPC (o qual consagra o princípio do dispositivo no nosso direito adjectivo), dever presumir, face à comprovação do estado de casados dos AA., muito embora tenha reconhecido que tal "comunicabilidade" não foi alegada por estes.

Salvaguardado o muito respeito que temos pelas opiniões de outrem, não podemos deixar de expressar aqui a nossa total discordância com a tese advogada pela Relação.
Desde logo, porque o art. 264º do CPC (com a redacção dada pelo legislador de 95) só veio dizer que, o juiz pode (e deve) basear a sua decisão também nos chamados factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa.

Ora, por factos instrumentais entendem-se os que, por natureza, não carecem de alegação, antes se destinam a permitir alcançar a prova dos factos principais, sendo, por isso mesmo, oficiosamente considerados desde que resultem da discussão da causa.

Mas as coisas passam-se de modo diferente no que tange aos factos principais: aqui impera a ideia de respeito e responsabilidade das partes, incumbindo-lhes - a elas e só a elas - a alegação dos factos constitutivos do direito invocado (isto do lado do A.) ou dos factos modificativos, impeditivos ou extintivos (por banda dos RR.).
A falta de invocação de tais factos acarreta para a parte que deles deveria aproveitar a total improcedência das suas pretensões (absolvição do pedido no 1º caso, não consagração da excepção no 2º).

É para esta regra que o legislador chama a atenção do julgador no art. 664º do CPC: "...só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264º".
Não tendo os AA. alegado (e, consequentemente, não provado) o regime de bens que regula a sua relação matrimonial), nunca podia o tribunal, de motu proprio, substituindo-se àqueles, transgredindo a regra de ouro do nosso processo civil (a regra que consagra o princípio dispositivo), presumindo que o mesmo era de comunhão.

É bem certo que a Relação, na sua qualidade de tribunal de instância, pode tirar presunções na sua tarefa de elaboração definitiva da base factual provada.
Mas se o pode fazer por via da sua competência própria, a verdade é que tal só lhe é permitido desde que a base da presunção esteja provada.
Ora, valha a verdade: nada nos autos permitia à Relação a extracção da presunção do que os AA. estão casados sob um regime de comunhão.
Ilegítima a presunção tirada pela Relação, por um lado, e falta de alegação de facto considerado como principal (porque integrador do direito alegado), por outro, são motivos suficientes para que a tese colocada na mesa da discussão pelo Tribunal da Relação de Coimbra não possa ter aqui aceitação.

Assim, não tendo os AA. na petição inicial, alegado que, por força do regime de casamento, o contrato comercial celebrado entre os então proprietários e o A. marido, se comunicou à A., o problema do cumprimento das regras da preferência só se podiam colocar em relação ao A.- arrendatário."

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