quinta-feira, maio 08, 2008

Jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto

1) Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-04-2008, proferido no processo n.º 0820348:
"I - A acção de prestação de contas para efeitos do disposto no art. 936º nº 1 do CPC é instaurada por apenso à respectiva execução para prestação de facto e no tribunal competente para esta.
II - É desse tribunal também a competência para a sua preparação para julgamento; a competência para julgamento pertence, porém, às Varas Cíveis, para onde deverá ser remetido para esse efeito, se a acção, atento o valor, prosseguir, depois da contestação, os termos do processo ordinário
."


Nota - Sobre a competência para julgamento na acção de prestação de contas, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto
de 26-11-2002, proferido no processo n.º 0120611.
Trata-se da única decisão que conheço sobre a matéria, para além da agora anotada, embora haja muitas sobre outros conflitos de jurisdição que diria "típicos" (designadamente quanto a acções de interdição e ao julgamento dos embargos nos processos de execução).



2)
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22-04-2008, proferido no processo n.º 0820286:
"I - O Regulamento (CE) nº 1346/2000, do Conselho, de 29.05.2000, aplicável a processos de insolvência, assenta em três princípios nucleares:
- o princípio de que o processo de insolvência principal seja aberto no Estado-Membro em que se situa o centro de interesses principais do devedor;
- o princípio do reconhecimento imediato e automático por todos os Estados-Membros das decisões relativas à abertura, tramitação e encerramento dos processos de insolvência;
- o princípio de que deve aplicar-se a lei do Estado-Membro da abertura do processo.
II - Prevê o Regulamento um regime de excepção para as acções pendentes à data da abertura do processo de insolvência, que se regem exclusivamente pela lei do Estado-Membro em que as referidas acções se encontram pendentes.
III - Sendo esta acção proposta em Portugal, em data posterior ao "momento da abertura do processo" de insolvência, o caso não será de inutilidade superveniente, nem de impossibilidade (como seria mais próprio), mas de incompetência absoluta dos tribunais portugueses.
"


Nota - São ainda muito raras (e, por isso mesmo, especialmente interessantes) as decisões que aplicam o chamado "processo civil comunitário". De entre estas, a grande maioria diz respeito à aplicação do Regulamento 44/2001 (sobre este, podem encontrar-se algumas referências seguindo
esta ligação para busca no blog), sendo poucos os acórdãos sobre o Regulamento 1346/2000. Será, talvez, oportuno dar algumas ideias muito breves sobre este diploma.
o Regulamento (CE) n.º 1346/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, relativo aos processos de insolvência, pode ser encontrado, na sua versão actualizada (foi alterado pelo Regulamento (CE) n.º 603/2005 do Conselho de 12 de Abril de 2005, pelo Regulamento (CE) n.º 694/2006 do Conselho de 27 de Abril de 2006, pelo Regulamento (CE) n.º 1791/2006 do Conselho de 20 de Novembro de 2006, e pelo Regulamento (CE) n.º 681/2007 do Conselho de 13 de Junho de 2007, para além dos actos de adesão dos novos Estados-Membros), seguindo
esta ligação.
Destacaria, deste Regulamento, as seguintes regras (sem cuidar, aqui, das excepções a algumas delas):
- Os órgãos jurisdicionais do Estado-Membro em cujo território está situado o centro dos interesses principais do devedor são competentes para abrir o processo de insolvência. Presume-se, até prova em contrário, que o centro dos interesses principais das sociedades e pessoas colectivas é o local da respectiva sede estatutária (artigo 1.º, n.º 1);
- No caso de o centro dos interesses principais do devedor se situar no território de um Estado-Membro, os órgãos jurisdicionais de outro Estado-Membro são competentes para abrir um processo de insolvência relativo ao referido devedor se este possuir um estabelecimento no território desse outro Estado-Membro. Os efeitos desse processo são limitados aos bens do devedor que se encontrem neste último território (artigo 1.º, n.º 2);
- Quando um processo de insolvência for aberto ao abrigo do disposto no n.º 1, qualquer processo de insolvência aberto posteriormente ao abrigo do disposto no n.o 2 constitui um processo secundário. Este processo deve ser um processo de liquidação (artigo 1.º, n.º 3);
- Salvo disposição em contrário do presente regulamento, a lei aplicável ao processo de insolvência e aos seus efeitos é a lei do Estado-Membro em cujo território é aberto o processo, a seguir designado «Estado de abertura do processo» (artigo 2.º, n.º 1);
- Os efeitos do processo de insolvência nos contratos de trabalho e na relação laboral regem-se exclusivamente pela lei do Estado-Membro aplicável ao contrato de trabalho (artigo 10.º);
- Qualquer decisão que determine a abertura de um processo de insolvência, proferida por um órgão jurisdicional de um Estado-Membro competente por força do artigo 3.o, é reconhecida em todos os outros Estados-Membros logo que produza efeitos no Estado de abertura do processo (artigo 16.º);
- As decisões relativas à tramitação e ao encerramento de um processo de insolvência proferidas por um órgão jurisdicional cuja decisão de abertura do processo seja reconhecida por força do artigo 16.º, bem como qualquer acordo homologado por esse órgão jurisdicional, são igualmente reconhecidos sem mais formalidades (artigo 25.º, n.º 1).
Nos tribunais portugueses, não tem sido abundante a jurisprudência sobre este Regulamento, como já referi. Do Supremo, não conheço nenhuma. Da Relação do Porto, para além desta decisão que agora se anota, foi o mesmo referido nuns autos de arresto, mas não passava por tal diploma a decisão (uma das partes tentava esgrimir o Regulamento para evitar um arresto, mas claramente sem razão - cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto
de 24-01-2008, proferido no processo n.º 0737312). Também no Tribunal da Relação de Lisboa o Regulamento surgiu lateralmente a propósito de um arresto (em termos aproximados aos que se colocaram na Relação do Porto - cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-05-2007, proferido no processo n.º 3145/2007-6).
Com mais substância na aplicação do Regulamento conheço apenas o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
de 13-09-2007, proferido no processo n.º 1143/07-1, que se ocupa da lei aplicável aos processos de insolvência. Nesta última decisão discute-se, também, a fronteira entre a inutilidade superveniente da lide e a incompetência internacional, por força da aplicabilidade do Regulamento.


3)
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22-04-2008, proferido no processo n.º 0821088:
"I - Em matéria de fundamentação de facto, há que distinguir o exame crítico previsto no art. 653º nº 2 do CPC daquele que é referido no art. 659º nº 2 do mesmo diploma.
II - O primeiro incide sobre as provas constantes do processo e as produzidas em audiência de julgamento que relevaram para a formação da convicção do julgador, relativamente aos factos controvertidos que constavam da base instrutória; o segundo já não respeita a essas provas e a esses factos, mas às provas relativas a outros factos que na sentença venham a ser considerados provados por acordo, por documentos, por confissão reduzida a escrito ou por presunção judicial.
III - Na fundamentação da decisão de facto é essencial que o julgador dê a conhecer os meios de prova em que assentou a sua convicção relativamente a cada facto ou conjunto de factos, e os motivos por que decidiu dessa maneira e não de outra maneira diferente, tendo em conta as diversas perspectivas em que se manifestaram a diversas provas realizadas.
IV - Não é necessário que fundamente sempre individualmente cada facto em concreto.
"


Nota - O exame crítico das provas a que se refere o n.º 3 do artigo 659.º do CPC não se confunde com o exame crítico das provas a que se refere o n.º 2 do artigo 653.º do CPC, referindo-se esta última norma aos meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador. Sobre a primeira, veja-se
este post, no ponto "2)". Sobre a segunda, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20-10-2005, proferido no processo n.º 05B3070, de 11-10-2005, proferido no processo n.º 05B3035, de 16-02-2006, proferido no processo n.º 06B311, de 05-05-2005, proferido no processo n.º 05B870, e de 15-04-2004, proferido no processo n.º 04B1023. Especificamente sobre a diferença entre o "exame crítico das provas" numa e noutra, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 31-10-2006, proferido no processo n.º 06A2900, e de 10-05-2005, proferido no processo n.º 05A963 (neste, embora o STJ centre a sua argumentação no artigo 655.º, as considerações que tece referem-se mais propriamente o artigo 653.º, n.º 2), de 16-12-2004, proferido no processo n.º 04B3896, e de 16-03-2004, proferido no processo n.º 03A4381.
Para além destes acórdãos, mais gerais, podem ler-se especificamente sobre a possibilidade de fundamentação conjunta da decisão da matéria de facto os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 13-03-2003, proferido no processo n.º 03B058 (e a jurisprudência e doutrina citadas ali, na nota 6, que transcrevo tal como lá se encontra: "ARC de 18/4/69, JR, 15º/516, ARP de 17/7/74 e de 12/12/89, BMJ 239/263-I e 392/516-2º-II, e Ac.STJ de 18/3/75, BMJ 245/477-III. Tal assim mesmo se outro o espírito da lei, segundo refere Antunes Varela, RLJ 129º/290, nota 16"), do Tribunal da Relação do Porto de 19-02-2004, proferido no processo n.º 0350455, do Tribunal da Relação de Lisboa de 04-12-2006, proferido no processo n.º 9443/2006-6 e de 25-10-2007, proferido no processo n.º 7640/2007-6, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 04-02-2003, proferido no processo n.º 3961/02. Nesta matéria, a jurisprudência tem citado, principalmente, Lebre de Freitas/Montalvão Machado/Rui Pinto, Código de Processo Civil anotado, vol. II, Coimbra: Coimbra Editora, 2001, pág. 629.

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