domingo, junho 03, 2007

Aos meus alunos - jurisprudência sobre a audiência final e a decisão da matéria de facto

Na sequência da aula prática de sexta-feira, cumpre-me aqui deixar alguma jurisprudência sobre a matéria de que então se falou.


1) O primeiro caso tratava da possibilidade de adiamento da audiência por falta do mandatário de alguma das partes.

Na primeira sub-hipótese, a designação da data para realização da audiência não havia sido feita por acordo prévio com os mandatários, nos termos do artigo 155.º do CPC.
Ora, nestes casos, a leitura atenta da alínea c) do n.º 1 do artigo 651.º do CPC revela-nos que basta a falta do advogado para que, sem qualquer necessidade de justificação, a audiência seja adiada.
Algumas decisões dos tribunais superiores confirmam este entendimento, por exemplo:
- o
acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23-04-2007, proferido no processo n.º 0751008: "Não sendo a data do julgamento marcada por acordo das partes mas por imposição do Tribunal e tendo o mandatário logo informado que estaria impedido de comparecer em tal data, não tem que voltar a comunicar que se encontra impedido noutra diligência, pedindo o adiamento. II - Assim como não tem que justificar a falta com diligência judicial ou outra, não podendo ser condenado nas custas do incidente";
- o
acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05-07-2006, proferido no processo n.º 0633808: "O DL nº 183/2000 de 10/8 veio alterar o regime do adiamento por falta advogado distinguindo duas situações: aquela em que o juiz haja providenciado pela marcação por acordo prévio com os mandatários judiciais, observando o artº 155-1 e aquela em que não tenha feito. Quando se verifica esta última situação a falta de advogado continua a ser, sem outra indagação, motivo de adiamento tal como se referiu e como é previsto na alínea c) do nº 1 do artº 651º do CPC".
- o
acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27-03-2007, proferido no processo n.º 0720357: "Não tendo a marcação de julgamento sido precedida de acordo prévio com os mandatários, basta a simples falta de algum deles para conduzir ao adiamento, não se aplicando neste caso, o preceituado no art. 155.ºn.º5 do CPC".

Na segunda sub-hipótese, considerou-se que teria havido designação da data da audiência final por acordo entre o tribunal e os mandatários. Neste caso, a possibilidade de adiamento depende da justificação da falta, pelo mandatário, invocando os motivos da impossibilidade de comparecer.
Nesta invocação, há que ter algum cuidado, uma vez que o critério do tribunal quanto ao que seja uma justificação suficiente pode variar. Os motivos genericamente indicados ("compromissos profissionais", "outras diligências", "motivos inadiáveis", etc.) poderão satisfazer um tribunal mas não outro, tendo em conta que o n.º 5 do artigo 155.º do CPC, ao referir-se a "circunstâncias impeditivas", parece exigir alguma concretização. Assim, por exemplo:
- enquanto que o Tribunal da Relação de Évora aceitou uma justificação muito genérica: "I – Tendo a data do julgamento sido designada mediante acordo prévio, não tendo ainda havido qualquer adiamento e tendo o advogado faltoso comunicado ao tribunal no dia anterior ao julgamento que não podia estar presente por "imponderáveis e inadiáveis motivos de ordem pessoal", esta comunicação satisfaz o exigido pelo artigo 155º-5 do CPC. II – Assim há que concluir que a falta de advogado é aqui motivo de adiamento da audiência de julgamento por força do disposto no artigo 651º 1-d) do mesmo Código. III – A realização da audiência sem a presença do advogado nas apontadas circunstâncias constitui nulidade susceptível de influir no exame e discussão da causa" (acórdão de 16-01-2003, in Colectânea de Jurisprudência, ano 2003, tomo I, pág. 237);
- já o tribunal da Relação do Porto foi mais exigente em outro processo: "A comunicação de Advogado na véspera da data designada para continuação de julgamento, em que alega apenas que “por motivos de ordem profissional” não lhe era possível comparecer, não constitui motivo bastante para deperminar o adiamento pretendido, em virtude de não indicar, em concreto, a circunstância impeditiva da comparência do mandatário" (
acórdão de 13-06-2006, proferido no processo n.º 0622143).

Lembrem-se que a melhor jurisprudência é a "jurisprudência das cautelas", pelo que será aconselhável concretizar o mais possível o motivo da falta.


2) No segundo caso, vimos uma decisão da matéria de facto cuja fundamentação assentava apenas no seguinte: "com base no depoimento das testemunhas a, b e c, considero provados os factos x, y e z".
Procurava-se saber se, com tal expressão, se daria cabal cumprimento ao dever de fundamentação de tal decisão.
Deve entender-se que não, pois o n.º 2 do artigo 653.º do CPC impõe que, na decisão da matéria de facto, o juiz deve analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, o que não é compatível com uma indicação genérica dos meios de prova tidos em consideração.
No mesmo sentido, podem encontrar algumas decisões dos nossos tribunais, por exemplo:
- o
acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-12-2001, proferido no processo n.º 0150489 - "O tribunal não pode, como fundamentação da matéria de facto, limitar-se a apresentar os simples meios de prova, como, por exemplo, os depoimentos prestados pelas testemunhas e a inspecção ao local, devendo especificar os fundamentos decisivos para a sua convicção";
- o
acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-09-2004, proferido no processo n.º 0453624 - "Não satisfaz a exigência legal de fundamentação da matéria de facto dizer, meramente, que certo facto (considerado provado) teve como base um concreto documento e as testemunhas inquiridas".

Bom estudo e boas leituras!

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