segunda-feira, maio 05, 2008

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça

1) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-04-2008, proferido no processo n.º 08A1097:
"1) A medida cautelar é uma decisão interina a aguardar a definitiva do processo principal, assim logrando evitar que da indecisão resultem danos irreparáveis para uma das partes.
2) O contrato de transacção destina-se a prevenir ou fazer terminar um litígio mediante recíprocas concessões das partes.
3) No âmbito da prevenção do litígio – transacção extra judicial – podem considerar-se os acordos celebrados em procedimentos cautelares hipoteticamente instrumentais (instaurados antes da lide principal) enquanto, por não audição prévia da parte requerida, não estiver instalada a controvérsia.
4) A sentença homologatória da transacção destina-se apenas a verificar a regularidade formal e a validade do acordo encontrado, que não a decidir o mérito da questão “sub judicio”, podendo ser impugnada por via de recurso.
5) Pode, outrossim, ser intentada acção contra a transacção – acto em si mesmo, no caso de inexistir homologação judicial ou tratando-se de transacção extra judicial pura."


Nota - No caso concreto, tendo inicialmente sido intentado um procedimento cautelar, findou este por transacção, na qual foram assumidas obrigações pecuniárias por uma das partes.
Não cumpridas as ditas obrigações, foi intentada a acção na qual foi proferido o acórdão, "pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe 18.025,00 euros, acrescidos de juros". "Como “causa petendi” alegou o incumprimento do acordado nos autos de arresto".
No acórdão em análise, começa-se por amitir que o acordo para o litígio principal possa ser realizado na lide instrumental. Parece que, à partida, nada o impedirá - cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto
de 07-12-2006, proferido no processo n.º 0634625, e de 12-02-1998, proferido no processo n.º 9830021.
O presente acórdão recorre às regras gerais de interpretação dos negócios jurídicos para interpretar a transacção, o que penso ser pacífico, desde logo por se tratar de um contrato - cfr., por exemplo, o recente acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 06-12-2007, proferido no processo n.º 1071/07-1.
A principal questão levantada neste caso era a seguinte: depois de celebrada a transacção, a parte que nela assumiu obrigações pretendia demonstrar que não estava, afinal, a elas vinculada, em virtude de um alegado cumprimento defeituoso do contrato pela outra parte. Decidiu-se no acórdão, como não podia deixar de ser, que "(...) a Autora aceitou a devolução de um bem como forma de pagamento de parte da dívida, ficando a mesma reduzida ao montante de € 18.025,00, a pagar de forma diferida e desistiu da efectivação do arresto de parte dos bens já decretado. A Ré ao aceitar o pagamento daquela quantia aceitou a sua existência sem questionar a obrigação de a satisfazer, prescindindo assim do exercício de eventuais direitos que lhe assistiriam em virtude de um alegado cumprimento defeituoso do contrato por parte da Autora. (...) Ora, um declaratário normal, colocado na posição da Autora, perante a aceitação da Ré de proceder ao pagamento da quantia que acordaram estar em divida, como preço dos bens fornecidos entenderia que esta renunciava ao exercício dos eventuais direitos resultantes de um cumprimento defeituoso por parte da Autora no fornecimento dos mesmos. (...) Como nota o Acórdão recorrido: “Tendo existido concessões recíprocas no acordo celebrado entre Autora e Ré, é de qualificar o mesmo como contrato de transacção, no qual esta última renunciou aos aludidos direitos. Aliás, se assim não se entendesse, estaríamos perante uma transacção parcial inadmissível, uma vez que existia uma conexão essencial entre a parte objecto da transacção e aquela que ficava por dirimir. Com a outorga do referido contrato de transacção, vinculou-se a Ré ao cumprimento dos termos desse contrato e das obrigações nele assumidas, renunciando a quaisquer direitos resultantes de um eventual cumprimento defeituoso do anterior contrato celebrado com a Autora, sendo certo que esta renúncia, não tendo sido antecipada ao conhecimento do eventual cumprimento defeituoso, é perfeitamente válida, não estando sujeita a qualquer formalismo especial.”
No caso concreto, a transacção não havia sido homologada, o que acabou por não influenciar a decisão. Note-se, quanto à homologação da transacção, que já se tem considerado que, "tendo uma acta de transacção judicial sido elaborada em processo judicial e em diligência presidida pelo juiz do processo, com o que se pôs termo ao litígio (o que constitui uma das formas possíveis de terminar com a instância), dúvidas não há de que estamos perante um documento autêntico", com consequências quanto à possibilidade de invocação da falsidade - cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 17-05-2007, proferido no processo n.º 88/06.0TTFIG-A.C1. Ainda quanto à homologação da transacção, veja-se ainda o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-03-2008, proferido no processo n.º 08B32, no qual se decidiu que a declaração de nulidade da transacção judicial não atinge a sentença que a homologou (o que não prejudicará, todavia, a possibilidade de interposição de recurso de revisão).
Para uma hipótese em certa medida oposta àquela de que se parte aqui, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
de 30-10-2007, proferido no processo n.º 8547/2007-7 ("A transacção efectuada no processo principal, que as partes não tenham estendido ao procedimento de arresto daquele dependente, não determina a extinção da instância no arresto por inutilidade superveniente da lide (artigo 287.º, alínea e) do Código de Processo Civil)").
Quanto à unidade da transacção, podem ler-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 13-11-2007, proferido no processo n.º 539/2002.C2 e a discussão que quanto a ele se gerou, neste blog, disponível nesta ligação, bem como os restantes acórdãos citados na respectiva nota.


2)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-04-2008, proferido no processo n.º 07S3905:
"I - Ao apreciar o pedido o tribunal tem de considerar a causa de pedir enunciada na petição inicial e não pode basear a sentença de mérito em causa de pedir não invocada pelo autor – artigo 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC).
II - Os poderes inquisitórios emergentes do artigo 72.º do Código de Processo do Trabalho (CPT) – que incluem os emergentes da regra geral do artigo 264.º do CPC e permitem ao juiz atender aos factos essenciais ou instrumentais que resultam da discussão da causa, mesmo que não tenham sido articulados –, estão sujeitos a limitações, sendo uma delas, precisamente, a de que tais factos só poderão fundar a decisão se não implicarem uma nova causa de pedir, nem a alteração ou ampliação da causa ou causas de pedir iniciais.
III - O uso do poder de condenação extra vel ultra petitum, consagrado no artigo 74.º do CPT não permite ao tribunal, ainda que esteja em causa a aplicação de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, alterar ou substituir os factos jurídicos invocados como fundamento do pedido, de modo a apreciar e decidir um pedido com fundamento numa causa de pedir que não foi submetida à sua decisão.
IV - Extrapola a causa de pedir enunciada na petição inicial a sentença proferida em acção de impugnação de despedimento que, considerando inverificado o despedimento (por se não terem provado os factos que o poderiam configurar), julga procedente o pedido relativo às retribuições vencidas depois da data do alegado despedimento, com fundamento na vigência do contrato após aquela data."

Nota - Sobre os pressupostos da condenação ultra petitum em processo de trabalho, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 05-07-2007, proferido no processo n.º 07S276, de 14-03-2007, proferido no processo n.º 06S1957, de 18-06-2003, proferido no processo n.º 03S836, de 09-11-2005, proferido no processo n.º 05S1926, de 14-03-2006, proferido no processo n.º 05S4142, de 30-09-2004, proferido no processo n.º 03S3775, do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-03-2003, proferido no processo n.º 0097094, de 21-01-2004, proferido no processo n.º 7449/2003-4, de 10-11-2004, proferido no processo n.º 3741/2004-4, de 25-05-2005, proferido no processo n.º 05S249, de 11-02-2004, proferido no processo n.º 03S4053, e de 31-10-2007, proferido no processo n.º 07S2091, e do Tribunal da Relação do Porto de 09-10-2006, proferido no processo n.º 0612742, de 25-09-2006, proferido no processo n.º 0641664.
Sobre a relação entre a condenação ultra petitum e o acórdão uniformizador n.º 1/2004, de 20-11-2003, proferido no processo n.º 02S3743 (também in DR, I Série, de 09-01-2004), cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-05-2005, proferido no processo n.º 05S249.
Sobre a necessidade de audição prévia das partes no caso de condenação ultra petitum, cfr. o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 605/95.


3)
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-04-2008, proferido no processo n.º 08A1103:
"I. Sendo os avales dados a favor da subscritora de uma livrança, as relações entre os respectivos co-avalistas não são de natureza cambiária, mas de direito comum.
II. Executado um co-avalista por outro dos seis co-avalista, alegando este a sua posição de endossado da livrança, tem de se atender à simultânea posição daquele endossado como co-avalista da mesma livrança.
III. Por isso, têm de ser aplicadas ao caso, as regras legais do instituto da fiança por ser o instituto que tem maiores semelhanças com o instituto do aval.
IV. Desta forma, terá de proceder a oposição à execução no tocante a cinco sextos do valor da livrança e dos juros respectivos pedidos, por serem seis os avalistas daquela e nada ter sido alegado pelo exequente que contrarie a presunção estabelecida no art. 516º do Cód. Civil."


Nota -
Quanto ao recurso às regras da fiança para regular as relações entre os co-avalistas, designadamente no que toca ao direito de regresso, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24-10-2002, proferido no processo n.º 02A2976, (também in CJ, tomo III, pág. 120), de 15-11-2007, proferido no processo n.º 07B1296, do Tribunal da Relação do Porto de 27-02-2007, proferido no processo n.º 0626567, de 27-05-2004, proferido no processo n.º 0432601, de 12-12-2002, proferido no processo n.º 0232527, do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-10-2007, proferido no processo n.º 8179/2007-6, de 18-01-2006, proferido no processo n.º 9867/2006-02, e de 11-11-2004, proferido no processo n.º 7516/2004-6. Quanto ao efeito da remissão feita a apenas parte dos co-avalistas, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 19-02-2004, proferido no processo n.º 4019/03.
Da fundamentação do acórdão em análise retiram-se informações muito úteis, desde logo que "as relações entre os avalistas não são de natureza cambiária, tal como entendeu a Conferência de Genebra que aprovou a citada Lei Uniforme, na consideração 75 do seu relatório, ao referir “não havia entre co-avalistas relações cambiárias, mas somente de direito comum, que uma lei uniforme sobre letras não tinha de regular”", citando também, para além do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-10-2002, que já acima referi, os do mesmo tribunal de "22-04-54, no BMJ 43º, 536 , de 16-03-56, no BMJ 55º, 299 e mais recentemente no acórdão de 28-03-2000, na rev. nº 453/99".

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