quinta-feira, julho 12, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto

Chamo particular atenção para a nota que deixo ao primeiro acórdão, que penso levantar uma questão muito interessante, quer para os "práticos", quer para os "teóricos".


1)
Acórdão de 25-06-2007, proferido no processo n.º 0752896:
"É admissível a reconvenção quando o pedido reconvencional tenha a mesma causa de pedir em que se baseia o pedido da acção.
Também o será quando não se enquadrarem estritamente na causa de pedir da acção, mas emergem de facto jurídico que serve de fundamento à defesa, no sentido de que resulta de factos com os quais indirectamente se impugna os alegados na petição inicial
"
.

Nota - As presentes conclusões reproduzem, no essencial, o regime legal, pelo que não levantam qualquer dificuldade.
Mais interessante será, por isso, olhar para o caso concreto.
Objecto do recurso foi um despacho do tribunal de primeira instância, no qual se entendeu não ser admissível a reconvenção, na qual se pedia o "pagamento de quantia não inferior a € 10.000,00 a título de indemnização pelos danos morais pelos mesmos sofridos por causa da instauração da acção judicial e actuação dos sócios da Autora em consequência do diferendo existente com os réus".
A primeira instância entendeu que tal pedido não preenchia os requisitos do artigo 274.º do CPC.
A Relação entendeu que o dito pedido se enquadrava no segmento normativo que refere ser admissível o pedido reconvencional emergente dos factos que integram a defesa.
Salvo melhor opinião, parece-me que a razão esteve com a primeira instância, discordando, por isso, do juízo da Relação, neste caso.
Na acção, o autor pedia a condenação dos réus no pagamento de certa quantia, devida por trabalhos num terreno destes. Os réus contestaram o crédito, impugnado-o. Pediram, como disse, em reconvenção, uma indemnização pelos danos causados pela instauração da acção.
Quando se pede a indemnização por danos causados pela instauração da acção, aponta-se o acto da instauração como ilícito (por ser abusivo, eventualmente) e causador dos danos que se querem ver indemnizados. Estes factos, em que se apoia o pedido reconvencional, nada têm que ver, em bom rigor, com os factos da defesa, na qual os réus impugnaram o crédito que os autores invocaram sobre eles. É certo que, remotamente, ambas as alegações têm a mesma origem: os réus impugnam o crédito porque, no seu entender, ele não existe; e porque ele não existe, a instauração da acção é abusiva.
Mas tudo isto não apaga a diferença eseencial: a defesa assenta na impugnação de factos constitutivos da obrigação; a reconvenção assenta no exercício abusivo do direito de acção. São factos diferentes, ainda que remotamente relacionados por uma ideia comum. Não se verifica, por isso, a meu ver, qualquer dos requisitos do artigo 274.º do CPC.
Note-se que não é a primeira vez que a questão se coloca, na nossa jurisprudência. Conheço pelo menos uma decisão precisamente sobre este assunto, que já usei como exemplo em aulas práticas.
Curiosamente, o caso era quase igual a este, até nas decisões das instâncias. A primeira instância entendeu que a reconvenção era inadmissível, mas a Relação entendeu que era admissível, por emergir dos factos que servem de fundamento à defesa. Mas o Supremo - e, a meu ver, muito bem - entendeu que não se verificava aquela conexão - cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 22-05-2003, proferido no processo n.º 03A3141, que por sua vez invoca também o acórdão do mesmo tribunal de 02-03-1945, com nota concordante da Revista dos Tribunais, no ano 63º, pág. 169, posteriormente mantida no ano 86º, pág. 365.


2)
Acórdão de 25-06-2007, proferido no processo n.º 0712029:
"I - Nos termos do n.º 2 do art. 70º do CPT “a audiência só pode ser adiada, e por uma vez, se houver acordo das partes e fundamento legal”.
II - Não indicando o CPT quais os fundamentos legais de adiamento da audiência, é aplicável o disposto no art. 651º do C. P. Civil.
III - Se a mandatária da ré informou atempadamente o Tribunal e a parte contrária da impossibilidade de comparência e requereu o adiamento da audiência que nunca fora adiada, mostra-se preenchida a situação prevista na al. d) do n.º 1 do art. 651º do CPC, pelo que não poderia ser feito o julgamento sem se ter questionado a parte contrária sobre o seu acordo quanto ao requerido adiamento"
.

Nota - Dispõe o n.º 2 do artigo 70.º do CPT: "a audiência só pode ser adiada, e por uma vez, se houver acordo das partes e fundamento legal".
Remetendo-se, no que toca ao fundamento legal, para as normas do CPC, há que articular os artigos 155.º e 651.º deste diploma. Sobre as ditas normas, cfr.
este texto do blog, bem como os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 27-03-2007, proferido no processo n.º 0720357, de 05-07-2006, proferido no processo n.º 0633808, de 07-02-2006, proferido no processo n.º 0526897, e de 23-04-2007, proferido no processo n.º 0751008, do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-02-2007, proferido no processo n.º 10099/06-2, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 05-03-2002, proferido no processo n.º 402/2002.


3)
Acórdão de 25-06-2007, proferido no processo n.º 0515552:
"I - Nos processos em que as partes tenham constituído mandatário, todos os articulados e requerimentos autónomos que sejam apresentados após a notificação ao autor da contestação do réu, serão notificados pelo mandatário judicial do apresentante ao mandatário judicial da contraparte, no respectivo domicilio profissional, nos termos do art. 260-A (art. 229-A, n.º 1 do CPC).
II - As alegações de recurso não estão abrangidas pelo regime previsto no art. 229-A, n.º 1 do CPC, pelo que a sua notificação à parte contrária deve ser feita pela Secretaria do Tribunal - art. 254º,1 CPC"
.

Nota - A jurisprudência é (ou, pelo menos, foi) um pouco instável quanto à aplicabilidade do disposto nos artigos 229.º-A e 260.º-A do CPC às alegações de recurso. Sintomaticamente, esta decisão - da qual, aliás, discordo - contou com um voto de vencido.
Algumas decisões, tal como a agora anotada, pendem para a inaplicabilidade daqueles preceitos, considerando que tais peças não se encontram abrangidas pela sua letra (cfr., entre outros, os acórdãos
do STJ de 19-02-2004, proferido no processo n.º 03A4201, da Relação do Porto de 25-10-2001, proferido no processo n.º 0131 e da Relação de Coimbra de 10-05-2005, proferido no processo n.º 1128/05 e de 29-05-2001, proferido no processo n.º 1496/2000).
Outras, penso que maioritárias, sustentam que a norma deve ser objecto de interpretação extensiva, abrangendo igualmente as alegações de recurso, para as quais a sua letra não apontará à primeira vista (cfr., entre outros, os acórdãos
do STJ de 05-05-2005, proferido no processo n.º 04B419, e de 13-07-2004, proferido no processo n.º 04B590, da Relação do Porto de 03-12-2001, proferido no processo n.º 0150088, e de 11-06-2007, proferido no processo n.º 0752291, do Tribunal da Relação de Coimbra de 21-06-2004, proferido no processo n.º 1781/04, e de 22-05-2002, proferido no processo n.º 1239/02, e do Tribunal da Relação de Guimarães de 22-03-2006, proferido no processo n.º 493/06-1, de 28-01-2004, proferido no processo n.º 524/04-2, e de 22-10-2003, proferido no processo n.º 1617/03-1).
Parece verificar-se uma tendência recente para a prevalência da segunda daquelas correntes. Creio, aliás, ser a que corresponde ao entendimento mais razoável das normas em causa (cfr. a fundamentação dos dois acórdãos do STJ citados em abono de tal posição). Na verdade, não faria sentido libertar a secretaria da função de notificação aos mandatários por todo o processo após a contestação para, por uma vez só, a onerar novamente com tal tarefa apenas nas alegações de recurso.


4)
Acórdão de 04-07-2007, proferido no processo n.º 0752755:
"I - Da actual redacção do art. 94.º do CPC não se extrai que a lei tenha imposto a obrigatoriedade de que apenas quando todos os executados forem pessoas colectivas o exequente pode optar pelo Tribunal do lugar em que a obrigação deva ser cumprida.
II - Se um dos executados é uma sociedade colectiva que subscreveu uma livrança, sendo a ela que cabe satisfazer o cumprimento em primeiro plano, pode o exequente instaurar a execução no lugar onde a obrigação deva ser cumprida
"
.

Nota - Dispõe o artigo 94.º, n.º 1 do CPC, depois das alterações introduzidas pela Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril: "Salvos os casos especiais previstos noutras disposições, é competente para a execução o tribunal do domicílio do executado, podendo o exequente optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deva ser cumprida quando o executado seja pessoa colectiva ou quando, situando-se o domicílio do exequente na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o executado tenha domicílio na mesma área metropolitana".
Assim, podemos esquematizar a norma do modo seguinte:
1 - O tribunal do domicílio do executado é sempre competente.
2 - O tribunal do lugar onde a obrigação deva ser cumprida poderá ser competente, quando o exequente o pretender e se verifique qualquer uma das seguintes hipóteses:
(a) ser o executado uma pessoa colectiva;
ou
(b) terem exequente e executado domicílio na mesma área metropolitana (de Lisboa ou Porto).
Assim sendo, como se refere no acórdão, nenhuma das ditas hipóteses (particularmente a (a) e a (b), que estariam aqui em causa) exige que exequente e executado sejam ambos pessoas colectivas.
No mesmo sentido, cita-se um acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29-03-2007, que julgo ser
o proferido no processo n.º 0731376, no qual se decidiu que "a opção concedida ao exequente pelo artº 94º, nº 1, do CPC (redacção introduzida pela Lei nº 14/2006, de 26 de Abril) basta-se com o facto de ser pessoa colectiva o obrigado principal, sendo indiferente que outros (co)-executados o não sejam".
Sobre esta matéria, encontra-se ainda o acórdão do Tribunal da Relação do Porto
de 15-03-2007, proferido no processo n.º 0731000.

Etiquetas: , , , , , ,

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]


Página Inicial