quarta-feira, junho 06, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto

1) Acórdão de 28-05-2007, proferido no processo n.º 0751166:
"Na lei actual, caso o valor da oposição seja inferior ao da alçada do Tribunal da Relação, o julgamento da respectiva matéria de facto competirá ao respectivo Juiz singular.
Se, ao contrário, o valor da oposição for superior ao da alçada da Relação, então o julgamento da matéria de facto será sempre efectuado pelo Juiz Presidente do Tribunal Colectivo (Juiz de Círculo)
"
.

Nota - A decisão cita e adere ao acórdão do mesmo tribunal de 04-12-2006, proferido no processo n.º 0655190 (embora, por lapso, a identifique como sendo de 14 de Dezembro), considerando também que se mantém a doutrina do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-05-1993, in CJ/STJ, 1993, Tomo II, p. 106 a 107 (na citação de um excerto desta decisão, pelo acórdão anotado, há um lapso manifesto, como houve também no citado acórdão de 04-12-2006, proferido no processo n.º 0655190, pois indica-se duas vezes o "artigo 79.º", sendo que, na primeira dessas indicações, a referência que se faz é ao artigo 791.º do CPC, na redacção anterior à reforma de 1995/96). O teor do dito acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-05-1993 é essencialmente semelhante ao do mesmo tribunal de 12-03-1996, proferido no processo n.º 88283, in BMJ n.º 455, pág. 402 (texto integral em ligação a ficheiro PDF), embora se considere na decisão anotada que as referências ao "tribunal colectivo" acórdãos devam entender-se, no regime actual e para efeito do caso em análise, como feitas ao juiz de círculo.

Post Scriptum - Já depois da conclusão e publicação desta nota, abriu-se discussão na caixa de comentários, no decurso da qual o leitor Pedro, autor do blog jurídico "Idealista", me deu conta da existência de jurisprudência oposta ao acórdão anotado, mais precisamente o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-04-2007, proferido no processo n.º 07A1219, indicação que muito lhe agradeço. Embora tenha evitado tomar posição na primeira anotação (uma vez que tinha ainda dúvidas, apesar de me inclinar contra a decisão anotada), acabei por fazê-lo na caixa de comentários, pelas razões que lá deixei escritas, precisamente no sentido do referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-04-2007, proferido no processo n.º 07A1219 e contra o anotado acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28-05-2007, proferido no processo n.º 0751166.



2) Acórdão de 22-05-2007, proferido no processo n.º 0627152:
"Falecendo o interessado/executado na pendência de inventário instaurado nos termos do artº 825º do CPC para separação de meações dos cônjuges por apenso a processo executivo movido por responsabilidade individual de dívida, os autos não devem ser extintos por inutilidade superveniente da lide.
Deve ser ordenada a suspensão da instância com vista à instauração e tramitação do incidente de habilitação de herdeiros
"
.

Nota - Como se refere na fundamentação da decisão, "no que tange à partilha dos bens não se verifica (...) pela morte do Requerido uma inutilidade superveniente da lide dado que importa saber relativamente ao mesmo qual o respectivo quinhão nos bens do acervo patrimonial sobretudo tendo em consideração a existência e a natureza da aludida dívida como se referiu assim tendo de determinar-se a sua respectiva meação nos bens que integravam aquela massa patrimonial do casal e que não se confundem com os correspondentes ao acervo hereditário".


3) Acórdão de 21-05-2007, proferido no processo n.º 0656949:
"É da competência do Tribunal Criminal a execução de sentença homologatória de transacção sobre o pedido cível enxertado em processo crime".

Nota - A decisão reproduz, citando, a fundamentação do acórdão da mesma Relação de 26-01-2006, proferido no processo n.º 0536697 (sendo esta decisão em matéria de execução para pagamento de multa, contém uma apreciação geral que a Relação entendeu aplicável à execução relativa ao pedido de indemnização civil).
Não existe muita jurisprudência que possa comparar-se à decisão anotada, pois esta encontra um argumento decisivo na alteração recente da LOFTJ pela
Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto, ainda não muito aplicada pelos tribunais superiores: "a norma do artº 1º da Lei 42/05 não é uma norma interpretativa dos artºs 77º, nº 1, al. c), 97º, nº 1, al. c), 102º-A e 103º da LOFTJ, mas sim uma norma inovadora, que veio regular a competência dos juízos de execução de forma significativamente diferente da instituída pelo DL 38/03. Assim, à data da instauração da presente execução, o tribunal competente para a sua tramitação era o 1º Juízo de Execução do Porto. Actualmente, é o 1º Juízo do Tribunal Criminal do Porto". Considerando competentes os juízos de execução para os processos executivos relativos a indemnizações civis, multas criminais e coimas, pode encontrar-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-06-2005, proferido no processo n.º 6607/2005-8 (esta decisão, porém, não é contrária ao acórdão anotado, pois foi proferida antes da vigência da dita Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto, que a Relação do Porto considerou ter alterado o quadro anterior, reconhecendo que, antes de tal alteração, a competência era dos juízos de execução ou tribunais de competência cível).
Quanto à execução relativa a custas, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto
de 04-02-2004, proferido no processo n.º 0345805, que considerou, contra o referido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-06-2005, proferido no processo n.º 6607/2005-8, competentes para a execução por multa os juízos criminais, antes mesmo da alteração introduzida pela Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto.


4) Acórdão de 21-05-2007, proferido no processo n.º 0750496:
"Na actual redacção do n.º3 do art. 646.º do CPC a realização de julgamento singular quando em termos legais deveria ser colectivo, configura um caso de incompetência relativa, que pode ser suscitada pelas partes ou oficiosamente conhecida até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento".
(...)"
.

Nota - Trata-se de questão pacífica, face ao disposto, actualmente, nos artigos 646.º, n.º 3 e 110.º, n.º 4 do CPC. Curiosamente, e apesar do que dispõe o sumário, o acórdão não aplicou o CPC na redacção actual, mas sim na redacção anterior à reforma de 1995/96.


5) Acórdão de 16-05-2007, proferido no processo n.º 0751818:
"A expropriação deve limitar-se ao estritamente necessário para a realização do seu fim, limitando deste modo o encargo/dever do expropriado.
O proprietário, além de poder requerer a expropriação total quando a parte restante não assegurar proporcionalmente os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio, pode ainda requerê-lo quando os cómodos assegurados pela parte restante não tiverem interesse económico para o expropriado, este determinado objectivamente.
É imprescindível à decisão do pedido de expropriação total o apuramento da natureza ou aptidão do prédio não só antes, mas sobretudo após o desmembramento pela expropriação
"
.

Nota - Quanto ao direito de requerer expropriação total, cfr. também os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 16-05-2007, proferido no processo n.º 0751818 e de 06-10-2005, proferido no processo n.º 0534263.
Sobre o conceito de diminuição grave dos cómodos que abra as portas à expropriação total, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 24-10-1996, proferido no processo n.º 96B465 (comprometimento de um projecto de aproveitamento industrial da totalidade do prédio pelo expropriado), do Tribunal da Relação do Porto dede 26-05-1992, in BMJ n.º 417, pág. 423 (acesso à via pública) e de 17-12-1987, in CJ, tomo V, pág. 215 ("se a parte sobrante tinha dois acessos, e com a expropriação passou a ter um só, há que compensar o expropriado pela correspondente diminuição dos cómodos e utilização"), de 16-02-1993, proferido no processo n.º 9120602 (perda da capacidade de construção na parte sobrante), de 26-10-2006, proferido no processo n.º 0635162 (critério a utilizar em terrenos sem aptidão para construção), do Tribunal da Relação de Guimarães de 15-02-2005, proferido no processo n.º 2478/05-2 (prejuízo ambiental).
Sobre a impossibilidade de requerer a expropriação total quando a parte sobrante constitui prédio diferente, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação e Lisboa
de 10-10-2006, proferido no processo n.º 5649/2006-7.

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4 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Talvez alguma da jurisprudência citada devesse ser alvo de um juízo crítico, ainda que breve. Não me parece, por exemplo, sólida a argumentação tecida pelo TRP relativamente à competência do Juiz de Círculo para julgar a oposição de valor superior à alçada da relação. Na verdade aquele entendimento cria uma norma que vai ao arrepio do que a lei directamente dita. Com efeito, ao remeter para os termos do processo sumário (artigo 817º, nº 2, in fine)a lei está desviar da regra da forma de processo dependente do valor. Então a lei quer que a oposição siga uma tramitação mais simples e depois quer (sem o dizer) uma maior exigência na determinação do tribunal de julgamento? Se fosse essa a sua intenção não deixaria de prever uma norma do género da que antigamente existia no artigo 791º.
Não tenho tempo para mais.
J. F. Moreira das Neves

6/06/2007 7:56 da tarde  
Blogger Pedro Mineiro disse...

Em recente Acórdão do STJ, de 17/04/2007, processo nº 07A1219, In www.dgsi.pt., decidiu-se que cabia ao juiz da comarca e não ao juiz de círculo proceder ao julgamento no âmbito de oposição à execução de valor superior à alçada da Relação, por força da remissão final, contida na alínea b) do artigo 106º da L.O.F.T.J., para a lei de processo, certo que o artigo 817º, nº 2 do CPC determina que os termos posteriores à notificação da oposição ao exequente seguem a forma do processo sumário de declaração e esta exclui, em absoluto, a intervenção do tribunal colectivo.
Pese embora o respeito que nos merecem as decisões da Relação do Porto citadas, parece-me que a questão merece maior e melhor reflexão.
Com efeito, e em primeiro lugar, importa referir que o problema em apreço deixou de se colocar no âmbito dos embargos de terceiro, uma vez que estes pssaram a seguir os termos do processo ordinário ou sumário de declaração, conforme o valor, nos termos do artigo 357º, nº 1 do CPC.
Contudo, a lei prevê, efectivamente, a possibilidade de haver processos sumários com valor superior à alçada da Relação, como sucede, por exemplo, com a oposição à execução e com a reclamação de créditos (artigo 868º, nº 1 do CPC).
Ora, se é certo que esta situação é nova relativamente à oposição à execução, o mesmo não acontece com a reclamação de créditos.
Aliás, até à entrada em vigor do DL nº 375-A/99, de 20/09, havia muitas outras acções que, não obstante terem valor superior à alçada da Relação, seguiam os termos do processo sumário de declaração (v.g. acções para efectivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação).
Só com a entrada em vigor do citado DL nº 375-A/99 é que a forma ordinária passou a ser obrigatoriamente utilizada para todas as acções cujo valor processual seja superior à alçada da Relação. E, só nestas, é que a lei de processo prevê a possibilidade de intervenção do tribunal colectivo, embora dependente do acordo das partes e da ausência de vicissitudes processuais ulteriores à propositura da acção que levem a dispensá-la.
Assim, tudo leva a crer que, com a entrada em vigor do DL nº 375-A/99, a referência final contida no artigo 791º, nº 1 do CPC ao "juiz singular" deixou de ter sentido, porquanto, à luz do disposto no artigo 462º do CPC, o processo sumário de declaração está limitado às acções de valor não superior à alçada da Relação e em que, como tal, nunca pode ter intervenção o tribunal colectivo, por força do artigo 106º, alínea b) da L.O.F.T.J..
Repare-se que não se encontra idêntica referência a propósito, por exemplo, do processo sumaríssimo de declaração.
Decorrentemente, a parte final da alínea b) do artigo 106º da L.O.F.T.J. actualmente, isto é, após a vigência do DL nº 375-A/99, de 20/09, só pode reportar-se ao artigo 646º, nºs 1 e 2 do CPC.
E, se assim é, como parece ser, quando determinado processo siga, independentemente do valor, a forma sumária, então não se vislumbra em que medida é que esse valor, desde que superior à alçada da Relação, já deva ser considerado para efeitos de competência do tribunal colectivo ou do juiz de círculo.
Admití-lo seria um verdadeiro contra-senso, pois que é a própria lei de processo que, ao determinar que se siga os termos do processo sumário de declaração, desconsidera o valor processual da causa.
Dito de outro modo, o legislador não ignorou que, ao determinar que um processo prossiga segundo os termos do processo sumário de declaração, estava a remeter para uma forma de processo em que nunca é possível a intervenção do tribunal colectivo ou do juiz de círculo, porque exclusiva da forma ordinária.
Reconheço que as considerações que antecedem não são pacíficas, mas deixo-as, ainda assim aqui, para reflexão.

6/07/2007 12:07 da manhã  
Blogger Nuno Lemos Jorge disse...

Caros leitores,

antes de mais devo um agradecimento pela movimentação na caixa de comentários (muito parada, nos últimos tempos).

Creio que tenho de dar uma explicação prévia. Por vezes não indico a minha posição de adesão ou oposição a um acórdão. Tal não significará que não tenho opinião, mas eventualmente que não a tenho ainda suficientemente formada ou que reservo considerações detalhadas para outra oportunidade (com mais tempo, mais atenção, etc.). É o preço de o blog ser um "one-man show", pese embora não me pareça que falte, na maior parte das vezes, o "juízo crítico" sobre as decisões.

Ao reler o post, fiquei com dúvida sobre se o respectivo texto indica alguma tomada de posição (procurei que não a tivesse - o segmento final "embora as referências ao "tribunal colectivo" destas decisões devam considera-se, no regime actual e para efeito do caso em análise, como feitas ao juiz de círculo" refere-se à posição do acórdão e não à minha, apesar de me parecer agora que talvez isso não seja muito claro).

Mas tudo isto tem pouca importância. O relevante é que a questão levantada é muito interessante, como se pode ver pelos vossos comentários. Embora me tenha guardado para mais tarde no que toca a tratar este assunto (pareceu-me merecer alguma maturação), não resisto a tratá-lo agora, após estes dois comentários.

Pesados os argumentos, e removendo algumas dúvidas que tinha, creio que a solução mais razoável será mesmo a que aponta para a competência do juiz singular. Muito sumariamente (para não repetir as razões descritas supra), entendo que o único argumento verdadeiramente forte para defender a intervenção do juiz de círculo seria o da igualdade em relação à acção comum. Só que esse possível argumento cede inevitavelmente quando, como referiu o leitor Pedro, "é a própria lei de processo que, ao determinar que se siga os termos do processo sumário de declaração, desconsidera o valor processual da causa". E quando aquele argumento cai, a letra e a aparente ratio da lei sugerem fortemente a solução da competência do juiz singular.

Adiro, assim, a esta posição. Confesso que ainda não li o acórdão do STJ que foi aqui citado. Ainda vou lê-lo, mas só amanhã. Depois de o fazer, vou incluí-lo no comentário.

Mais uma vez, obrigado pela discussão. Espero que a repitam.

6/07/2007 12:42 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

AH, se se desconsidera o valor da causa e nessa nunca é admitida a intervenção de colectivo, passa por integrar na al. a), do artigo 97 da LOTJ para se decidir a «favor» da competência da comarca ou na al. b) e aí fica-se com maior liberdade para se decidir a favor da competência da vara.
O ser juiz singular afasta a regra do colectivo e nessas situações, as caras não são competentes, se se entender a oposição como uma verdadeira acção declarativa como tantas vezes se escreve e se decidiu numa questão bem mais importante: o ónus da prova da inexistência de dívida caber ao opoente e não ao exequente a prova da existência da dívida.

6/27/2007 3:23 da tarde  

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