Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 2 de 3)
1) Acórdão de 24-04-2007, proferido no processo n.º 48/2007-4:
"O tribunal do trabalho é materialmente competente para o conhecimento de acção sub-rogatória de aceitação de herança deduzida por trabalhador contra o empregador repudiante de herança e contra aqueles para quem os bens da herança passaram em virtude desse repudio, acção essa instaurada na acção emergente de contrato de trabalho em que o trabalhador formule o pedido de créditos laborais contra o empregador repudiante;
Verifica-se uma situação de litisconsórcio necessário passivo entre o repudiante da herança e aqueles para quem os bens deste passaram em virtude desse repúdio".
Nota - Neste caso, o A. pretendeu "cumular uma acção emergente de contrato individual de trabalho com processo comum, prevista e regulada nos arts. 39º e segs. do Código de Processo do Trabalho com uma acção subrogatória de aceitação de herança com processo especial de jurisdição voluntária regulado nos arts. 1469°, 1409°, e 302° a 304° do Código de Processo Civil". Sendo uma hipótese que nunca vi tratada, interessei-me muito pela fundamentação, que merece, aqui, ser reproduzida, na sua parte essencial.
O tribunal do trabalho não aceitou a cumulação pretendida, refugiando-se, "por um lado, na verificação de uma situação de incompetência material do Tribunal do Trabalho para a apreciação da referida acção sub-rogatória e, por outro lado, na verificação de uma coligação passiva ilegal, entendendo ainda que as duas acções seguem formas de processo totalmente distintas".
A Relação contrariou esta posição. Partiu do entendimento de que a acção sub-rogatória se funda "na expectativa de satisfação, que os credores têm sobre os bens do devedor e destina-se a assegurar a integridade da garantia patrimonial, que é um elemento constitutivo da relação obrigacional" (cita aqui o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-09-1995, in CJ, tomo III, pág. 20), considerando também que ocorre "litisconsórcio necessário passivo entre o repudiante da herança e aqueles para quem os bens desta passaram em virtude desse repúdio" (o que é pacífico).
Conclui, por fim, que "ao invés do entendimento firmado no despacho recorrido, os Tribunais do Trabalho também são competentes para a apreciação deste tipo de questões não só por força do disposto nos mencionados normativos – mal se compreendendo, aliás, que, em face dos mesmos, o trabalhador tivesse de propor uma acção em Tribunal do Trabalho tendo em vista o reconhecimento de um crédito sobre o empregador repudiante de uma herança e que, pretendendo, ele próprio, aceitar essa herança por sub-rogação do empregador, tivesse de instaurar nos Tribunais Cíveis uma outra acção com esse objectivo – como também por força da al. o) do art. 85º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais aprovada pela Lei n.º 3/99 de 13-01. Com efeito e como refere o agravante, trata-se de uma questão entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho (trabalhador e empregador) e entre o trabalhador e terceiros (restantes herdeiros da herança repudiada), ao mesmo tempo que emerge de uma relação conexa com uma relação de trabalho por dependência (a existência do direito de aceitação sub-rogatória da herança, depende da existência de um crédito do aceitante sobre o repudiante e esse crédito depende ou emerge de uma relação laboral entre estes)".
2) Acórdão de 19-04-2007, proferido no processo n.º 2863/2007-6:
"A dedução de habilitação contra herdeiros incertos só se justifica quando o requerente não tenha possibilidade de os determinar e identificar, não sendo suficiente a ignorância da sua identidade nem a mera dificuldade (subjectiva) na obtenção de informações a seu respeito.
O requerente terá sempre de comprovar que efectuou diligências com vista a identificar os herdeiros da parte falecida e algumas dessas diligências estão, em princípio, ao seu alcance em face de contactos que pode levar a efeito junto de pessoas e serviços.
É que, à partida, não é bom caminho demandar incertos como herdeiros, com a inerentes inconveniências da citação edital e da representação pelo Ministério Público, sabendo-se que os mesmos, com maior ou menor dificuldade, poderão ser identificados e citados para os termos da acção.
Em todo o caso, se o requerente demonstrar ter realizado as diligências que podia realizar e que estas se frustraram com vista à identificação dos sucessores do falecido sempre poderá requerer ao tribunal a realização das necessárias ao fim em alcance e só em último recurso se justificando a citação edital de incertos".
Nota - Considerando, igualmente, a citação edital como ultima ratio a evitar sempre que possível na habilitação, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 06-07-2005, proferido no processo n.º 05B2025, do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-11-2006, proferido no processo n.º 8241/2006-2, de 16-01-2007, proferido no processo n.º 7498/2006-7, e de 16-02-2006, proferido no processo n.º 9844/2005-6.
Mais "brando" quanto à possibilidade de a habilitação ser deduzida contra incertos (mas sem prejuízo da obrigação de diligenciar no sentido de procurar a identificação de possíveis herdeiros) é o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-09-2006, proferido no processo n.º 5476/2006-1 ("Em face dos dados da experiência comum de vida, é suficiente para se intentar uma habilitação de herdeiros incertos a alegação de se desconhecer se o falecido deixou sucessores. Nesse caso deve o juiz, antes de ordenar a citação edital, determinar a realização de diligências úteis à identificação dos sucessores.").
No entanto, a linha dos anteriormente citados parece-me mais correcta, tendo um bom representante no acórdão do mesmo tribunal de 29-06-2006, proferido no processo n.º 5228/2006-8, onde se procede a uma análise pertinente do sentido da alteração das normas com a reforma de 1995/1996 ("a partir da revisão de 1995/1996, foi aditado no artigo 16.º, n.º1 do C.P.C., a expressão “ por não ter o autor possibilidade de identificar os interessados directos” e, assim sendo, nas acções contra incertos já não basta ao A. invocar o desconhecimento da identidade desses interessados incertos, impõe-se-lhe ainda o ónus de provar que efectuou diligências no sentido de identificar tais interessados."), firmando a interpretação que me parece mais razoável.
Sobre a consequência da não intervenção de qualquer herdeiro, em caso de citação edital, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-02-1998, proferido no processo n.º 9520613.
3) Acórdão de 19-04-2007, proferido no processo n.º 3011/2006-6:
"Estando excluídos os casos previstos no 524º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil - impossibilidade de junção anterior do documento ou prova de factos posteriores ao encerramento da discussão em 1ª instância - a junção dos documentos com as alegações só seria de admitir se se tivesse tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.
Para que a junção do documento seja permitida em virtude do julgamento da 1ª instância, não basta que ela seja necessária em face deste julgamento, sendo antes essencial que a junção (apenas) se tenha tornado necessária em virtude desse julgamento. Se a junção já era necessária (para fundamentar a acção ou a defesa) antes de ser proferida a decisão da 1ª instância, ela não é permitida".
Nota - Como já referi no post de ontem, esta matéria foi já tratada neste blog, em anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-03-2007, proferido no processo n.º 07B287, que deixei aqui e para a qual remeto.
"O tribunal do trabalho é materialmente competente para o conhecimento de acção sub-rogatória de aceitação de herança deduzida por trabalhador contra o empregador repudiante de herança e contra aqueles para quem os bens da herança passaram em virtude desse repudio, acção essa instaurada na acção emergente de contrato de trabalho em que o trabalhador formule o pedido de créditos laborais contra o empregador repudiante;
Verifica-se uma situação de litisconsórcio necessário passivo entre o repudiante da herança e aqueles para quem os bens deste passaram em virtude desse repúdio".
Nota - Neste caso, o A. pretendeu "cumular uma acção emergente de contrato individual de trabalho com processo comum, prevista e regulada nos arts. 39º e segs. do Código de Processo do Trabalho com uma acção subrogatória de aceitação de herança com processo especial de jurisdição voluntária regulado nos arts. 1469°, 1409°, e 302° a 304° do Código de Processo Civil". Sendo uma hipótese que nunca vi tratada, interessei-me muito pela fundamentação, que merece, aqui, ser reproduzida, na sua parte essencial.
O tribunal do trabalho não aceitou a cumulação pretendida, refugiando-se, "por um lado, na verificação de uma situação de incompetência material do Tribunal do Trabalho para a apreciação da referida acção sub-rogatória e, por outro lado, na verificação de uma coligação passiva ilegal, entendendo ainda que as duas acções seguem formas de processo totalmente distintas".
A Relação contrariou esta posição. Partiu do entendimento de que a acção sub-rogatória se funda "na expectativa de satisfação, que os credores têm sobre os bens do devedor e destina-se a assegurar a integridade da garantia patrimonial, que é um elemento constitutivo da relação obrigacional" (cita aqui o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-09-1995, in CJ, tomo III, pág. 20), considerando também que ocorre "litisconsórcio necessário passivo entre o repudiante da herança e aqueles para quem os bens desta passaram em virtude desse repúdio" (o que é pacífico).
Conclui, por fim, que "ao invés do entendimento firmado no despacho recorrido, os Tribunais do Trabalho também são competentes para a apreciação deste tipo de questões não só por força do disposto nos mencionados normativos – mal se compreendendo, aliás, que, em face dos mesmos, o trabalhador tivesse de propor uma acção em Tribunal do Trabalho tendo em vista o reconhecimento de um crédito sobre o empregador repudiante de uma herança e que, pretendendo, ele próprio, aceitar essa herança por sub-rogação do empregador, tivesse de instaurar nos Tribunais Cíveis uma outra acção com esse objectivo – como também por força da al. o) do art. 85º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais aprovada pela Lei n.º 3/99 de 13-01. Com efeito e como refere o agravante, trata-se de uma questão entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho (trabalhador e empregador) e entre o trabalhador e terceiros (restantes herdeiros da herança repudiada), ao mesmo tempo que emerge de uma relação conexa com uma relação de trabalho por dependência (a existência do direito de aceitação sub-rogatória da herança, depende da existência de um crédito do aceitante sobre o repudiante e esse crédito depende ou emerge de uma relação laboral entre estes)".
2) Acórdão de 19-04-2007, proferido no processo n.º 2863/2007-6:
"A dedução de habilitação contra herdeiros incertos só se justifica quando o requerente não tenha possibilidade de os determinar e identificar, não sendo suficiente a ignorância da sua identidade nem a mera dificuldade (subjectiva) na obtenção de informações a seu respeito.
O requerente terá sempre de comprovar que efectuou diligências com vista a identificar os herdeiros da parte falecida e algumas dessas diligências estão, em princípio, ao seu alcance em face de contactos que pode levar a efeito junto de pessoas e serviços.
É que, à partida, não é bom caminho demandar incertos como herdeiros, com a inerentes inconveniências da citação edital e da representação pelo Ministério Público, sabendo-se que os mesmos, com maior ou menor dificuldade, poderão ser identificados e citados para os termos da acção.
Em todo o caso, se o requerente demonstrar ter realizado as diligências que podia realizar e que estas se frustraram com vista à identificação dos sucessores do falecido sempre poderá requerer ao tribunal a realização das necessárias ao fim em alcance e só em último recurso se justificando a citação edital de incertos".
Nota - Considerando, igualmente, a citação edital como ultima ratio a evitar sempre que possível na habilitação, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 06-07-2005, proferido no processo n.º 05B2025, do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-11-2006, proferido no processo n.º 8241/2006-2, de 16-01-2007, proferido no processo n.º 7498/2006-7, e de 16-02-2006, proferido no processo n.º 9844/2005-6.
Mais "brando" quanto à possibilidade de a habilitação ser deduzida contra incertos (mas sem prejuízo da obrigação de diligenciar no sentido de procurar a identificação de possíveis herdeiros) é o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-09-2006, proferido no processo n.º 5476/2006-1 ("Em face dos dados da experiência comum de vida, é suficiente para se intentar uma habilitação de herdeiros incertos a alegação de se desconhecer se o falecido deixou sucessores. Nesse caso deve o juiz, antes de ordenar a citação edital, determinar a realização de diligências úteis à identificação dos sucessores.").
No entanto, a linha dos anteriormente citados parece-me mais correcta, tendo um bom representante no acórdão do mesmo tribunal de 29-06-2006, proferido no processo n.º 5228/2006-8, onde se procede a uma análise pertinente do sentido da alteração das normas com a reforma de 1995/1996 ("a partir da revisão de 1995/1996, foi aditado no artigo 16.º, n.º1 do C.P.C., a expressão “ por não ter o autor possibilidade de identificar os interessados directos” e, assim sendo, nas acções contra incertos já não basta ao A. invocar o desconhecimento da identidade desses interessados incertos, impõe-se-lhe ainda o ónus de provar que efectuou diligências no sentido de identificar tais interessados."), firmando a interpretação que me parece mais razoável.
Sobre a consequência da não intervenção de qualquer herdeiro, em caso de citação edital, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-02-1998, proferido no processo n.º 9520613.
3) Acórdão de 19-04-2007, proferido no processo n.º 3011/2006-6:
"Estando excluídos os casos previstos no 524º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil - impossibilidade de junção anterior do documento ou prova de factos posteriores ao encerramento da discussão em 1ª instância - a junção dos documentos com as alegações só seria de admitir se se tivesse tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.
Para que a junção do documento seja permitida em virtude do julgamento da 1ª instância, não basta que ela seja necessária em face deste julgamento, sendo antes essencial que a junção (apenas) se tenha tornado necessária em virtude desse julgamento. Se a junção já era necessária (para fundamentar a acção ou a defesa) antes de ser proferida a decisão da 1ª instância, ela não é permitida".
Nota - Como já referi no post de ontem, esta matéria foi já tratada neste blog, em anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-03-2007, proferido no processo n.º 07B287, que deixei aqui e para a qual remeto.
Etiquetas: alegações de recurso, citação, competência em razão da matéria, habilitação, jurisprudência TRL, prova documental, tribunais do trabalho
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