terça-feira, abril 10, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 1 de 2)

1) Abro um ponto para tratar em conjunto duas decisões do Tribunal da Relação de Lisboa. Os acórdãos de 13-03-2007, proferido no processo n.º 2430/2007-1, e de 15-03-2007, proferido no processo n.º 2188/2007-6, pronunciaram-se ambos sobre uma questão muitas vezes referida aqui no blog: a da invalidade superveniente dos pactos de competência, por força das alterações ao CPC introduzidas pela Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril. Apesar de nenhum destes acórdãos divergir do sentido praticamente unânime da jurisprudência, até ao momento, no que toca a este assunto (cfr., especialmente, aqui e aqui), afirmando, pois, que a dita lei se aplica aos pactos de competência celebrados antes da sua entrada em vigor (embora não às acções intentadas antes dessa mesma data) e que, se desta aplicação resultar a invalidade superveniente do pacto, tal interpretação da lei não padece de inconstitucionalidade.
Nenhum dos ditos acórdãos se afasta desta linha uniforme. No entanto, no
de 15-03-2007, proferido no processo n.º 2188/2007-6, há um voto de vencido, onde se defende que a dita lei não deve aplicar-se aos pactos celebrados antes da sua entrada em vigor, mas apenas aos que se celebrem depois dela. Tanto quanto me é dado a conhecer, trata-se da primeira divergência quanto a esta matéria.

2)
Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 965/2007-1:
"Em processo executivo, o montante das custas devidas tem de ser considerado em sede de elaboração da respectiva conta, de sorte a ser garantido no processo pelo responsável das mesmas, mesmo que a este tenha sido concedido o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa total do seu pagamento".

Nota - Na hipótese em apreço, aplicava-se ainda o disposto no Decreto-Lei n.º 387-B/87 de 29 de Dezembro.
Ainda assim, tenho muitas dúvidas quanto à solução defendida nesta decisão (mesmo à luz do dito Decreto-Lei n.º 387-B/87 de 29 de Dezembro). O que ali se defende é que, mesmo obtido o benefício do apoio judiciário pelo executado, na modalidade de dispensa do pagamento de custas, os bens penhorados a esse mesmo sujeito continuam a responder pelo dito pagamento.
Embora não tratem de questão absolutamente idêntica, parecem, indirectamente, apontar para conclusão diversa os acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 30-04-1998, in BMJ 476, pág. 504 (não admitiu o pedido de apoio judiciário após o pagamento pelo executado da quantia exequenda e juros, com um fim de este evitar o pagamento das custas, mas com um fundamento diverso do subscrito na decisão anotada, parecendo admitir-se que, requerido oportunamente o benefício, tal obstaria à responsabilidade do executado pelas custas, através do seu património penhorado) e do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-11-1990, in CJ, t. V, pág. 133.
Se bem entendo a decisão anotada, nela pretende-se fazer corresponder a descoberta de bens penhoráveis a uma revogação (aparentemente tácita) da decisão de concessão de apoio judiciário anterior. No entanto, parece-me difícil de admitir tal solução, embora não me repugne, à luz do regime do Decreto-Lei n.º 387-B/87 de 29 de Dezembro, que a demonstração, nos autos de execução, de uma situação patrimonial do executado incompatível com a manutenção da concessão do benefício leve à perda (expressamente assumida, claro está) do dito benefício. O artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro não parece admitir qualquer outra solução a não ser a alteração expressa do benefício, até mesmo porque sujeita tal alteração ao contraditório do beneficiário do apoio. Aliás, a norma do referido artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, manteve-se quase inalterada no artigo 37.º da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e no artigo 10.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Junho, actualmente em vigor, pressupondo sempre uma decisão expressa e a audição prévia do beneficiário.
Pelo exposto, não subscrevo a decisão anotada.

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2 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa não tem cabimento.
Só faria ela sentido se o pressuposto para a concessão de apoio judiciário fosse “inexistência de bens penhoráveis no património” do requerente do apoio.
Se assim fosse, sendo localizados tais bens e apreendidos (penhorados), poderíamos até concordar com o Tribunal da Relação de Lisboa – embora me pareça que a norma do art. 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil impede que a nova decisão de “não dispensa do pagamento de custas” seja tomada à revelia dos beneficiários do apoio judiciário.
Mas o pressuposto é a “insuficiência económica para suportar os custos do processo”. Ora, este pressuposto não se confunde com “inexistência de bens penhoráveis no património” do requerente do apoio.

Anónimo, por razões óbvias

4/10/2007 11:09 da manhã  
Blogger Nuno Lemos Jorge disse...

Caro leitor,

Nem precisaria de recorrer ao artigo 3.º, n.º 3 do CPC, já que todos os três citados diplomas que se sucederam no tempo sobre o apoio judiciário previam expressamente a necessidade de audição do beneficiário prévia à decisão de lhe retirar o apoio.

Como referi, mesmo que resultasse daquele processo executivo a possibilidade económica para suportar os custos do processo (e concordo consigo quando diz que não se confunde essa possibilidade com a mera existência de bens penhoráveis), nunca a perda do benefício poderia ocorrer automaticamente, sem apreciação concreta em despacho para o efeito, assegurando sempre o contraditório.

E, em três, não houve um só voto de vencido...

4/10/2007 2:28 da tarde  

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