sexta-feira, março 30, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Coimbra (parte 2 de 2)

1) Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 1795/05.0TBPMS-C1:
"Para que se decrete uma providência cautelar não especificada impõe-se a conjugação dos seguintes requisitos: - a probabilidade séria da existência do direito invocado; - que muito provavelmente esse direito – invocado – exista ou que venha a surgir em acção constitutiva já proposta ou a propor; - o fundado receio de que outrem, antes da acção ser proposta ou na sua pendência, cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito.
A probabilidade séria da existência do direito invocado basta-se com um mero juízo de verosimilhança, isto é, com uma prova sumária.
Em relação aos factos integradores do chamado “periculum in mora” o requerente tem que provar – não basta um mero juízo de verosimilhança – os danos que visa acautelar, sendo certo que se exige a prova da gravidade e da difícil reparação das consequências danosas da manutenção do “status quo”.
O que significa que apenas merecem a tutela provisória consentida pelo procedimento cautelar comum as lesões graves e de difícil reparação, ficando arredadas do círculo de interesses acautelados pelo procedimento cautelar comum, ainda que se mostrem de difícil reparação, as lesões sem gravidade ou de gravidade reduzida, do mesmo modo que são afastadas as lesões que, apesar de serem graves, sejam facilmente reparáveis.
(...)"
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Nota - A afirmação de que "o requerente tem que provar – não basta um mero juízo de verosimilhança – os danos que visa acautelar" pode ser demasiado sugestiva. É usual encontrar na jurisprudência, com mais ou menos intensidade, uma distinção cortante entre a suficiência da prova da mera "aparência" do direito (fumus boni iuris) e a necessidade de demonstar a certeza, ou quase certeza, dos danos (cfr., por exemplo, entre muitos outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 03-06-1993, proferido no processo n.º 083931, de 15-04-1980, proferido no processo n.º 068730, também in BMJ 296, n.º 206). No entanto, estas expressões devem ler-se com cautelas, sempre sem prejuízo da natureza algo precária da produção e apreciação da prova no procedimento cautelar. Expressões como "certeza" "definitividade" do juízo probatório serão aqui demasiado fortes. Será mais equilibrado afirmar que, enquanto que a apreciação da titularidade do direito se basta com o fumus, a probabilidade de lesão deve ser objecto de uma prova mais convincente, sem prejuízo das limitações próprias do procedimento.
Para uma análise desta mesma questão, cfr. LEBRE DE FREITAS / A. MONTALVÃO MACHADO / RUI PINTO, Código de Processo Civil anotado, vol. 2.º, Coimbra: Coimbra Editora, 2001, pp. 35/36.
A parte da fundamentação do acórdão que toca na relação substantiva é demasiado complexa para que a possa sintetizar aqui. No entanto, recomendo a sua leitura a quem se interessar pelo tema das providências cautelares nas relações decorrentes do contrato-promessa.


2)
Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 29/1997.C1:
"Transmitida a propriedade do locado, operou-se a correspondente translação da posição jurídica do locador, por efeito imperativo da lei, impondo-se a subentrada do adquirente na posição do locador, por força do direito de sequela, em consequência do princípio do «emptio non tollit locatum».
Com a citação do réu, independentemente das vicissitudes que possam vir a acontecer na titularidade do locado, sendo este propriedade dos autores, fixaram-se os elementos essenciais da causa, designadamente, no que se refere aos sujeitos, com as ressalvas previstas na lei, por força do princípio da estabilidade da instância, com a inerente limitação do objecto da acção e, consequentemente, do recurso.
Não sendo a acção de despejo uma acção real, porquanto através dela o autor não se propõe fazer valer o direito de propriedade sobre o prédio em cuja entrega está empenhado, mas antes uma acção de natureza pessoal, emergente de um contrato de arrendamento, não carece o senhorio de juntar documento que comprove a propriedade do prédio despejando.
Se os réus emigraram para a Alemanha, para conseguir melhores proventos do trabalho, onde vivem, há cerca de 30 anos, deslocando-se a Portugal, para passar as férias de Verão, e, por vezes, pelo Natal, deixaram de ter residência permanente no locado, de fazer uso do mesmo, não beneficiando da excepção que consagra a inaplicabilidade dessa causa de resolução, em virtude de o arrendatário se haver ausentado, por tempo superior a dois anos, em cumprimento de deveres profissionais por conta de outrem"
.

Nota - A natureza pessoal (não real) da acção de despejo encontra-se subjacente a outras decisões. Vejam-se, por exemplo, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 17-01-1989, proferido no processo n.º 076631 ("(...)a acção de despejo, ao contrario da acção de reivindicação, não pode classificar-se como acção real, ou seja destinada a fazer valer um direito real, pelo que as causas de pedir são diversas - facto juridico donde deriva o direito real, para a segunda e facto concreto invocado na outra afim de se obter a resolução contratual, na primeira(...)"), e de 28-05-2002, proferido no processo n.º 02A1294 ("à acção de despejo não interessa saber se o autor é o proprietário mas sim se é o senhorio - não é acção real").
O que pode acontecer - e é coisa diversa - é o autor configurar a acção como acção real, invocando o seu direito de propriedade para, por exemplo, pedir a reivindicação, apesar de ter celebrado com o réu um contrato de arrendamento. Tal pode acontecer porque o autor considera o contrato nulo ou inexistente (cfr., por coincidência, a hipótese constante da decisão seguinte), ou porque simplesmente opta por ignorá-lo, podendo o acordo ser invocado pelo réu por via de excepção. Para algumas hipóteses nesta linha, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 21-01-2003, proferido no processo n.º 02A1008 (não tem sumário), do Tribunal da Relação de Coimbra de 29-11-2005, proferido no processo n.º 2385/05, e do Tribunal da Relação de Évora de 13-03-2004, proferido no processo n.º 2908/02-3.


3)
Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 938-H/2001.C1:
"Um contrato-promessa de arrendamento não caduca necessariamente com a declaração de falência, nomeadamente do outorgante locador.
Intentada a acção de reivindicação pela massa falida de uma sociedade, pode o Réu defender-se, nomeadamente, com a existência de um contrato-promessa de arrendamento.
Tal contrato pode resultar da conversão de um contrato de arrendamento para fins industriais nulo por falta de forma, desde que estejam preenchidos os requisitos que a lei faz depender para que se possa operar tal conversão.
A massa falida sucede, decretada que seja a falência, na relação jurídica existente que é presumivelmente a mesma que foi criada na data da realização do contrato entre os outorgantes senhorios (aqui os sócios da falida) e o ora Réu.
Nesta conformidade é lícito ao réu opor à massa falida e ao seu administrador os meios de defesa emergentes do contrato que realizou, nomeadamente os que dizem respeito à conversão do negócio jurídico.
Repugna à consciência jurídica, sendo assim, ofensivos do princípio da boa-fé, fazer tábua rasa de 11 anos de vigência de uma situação fáctica de “contrato de arrendamento” regular com o pagamento e aceitação de rendas, sendo tal facto susceptível de paralisar a reivindicação do prédio ocupado"
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Nota - Mesmo antes da aprovação do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (CPEREF), pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril, o artigo 1197.º do CPC previa que a declaração de falência não importava a resolução dos contratos bilaterais celebrados pelo falido. Depois do CPEREF, o actual Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), não aplicável á hipótese dos autos, prevê, no seu artigo 109.º, n.º 1, que "a declaração de insolvência não suspende a execução de contrato de locação em que o insolvente seja locador, e a sua denúncia por qualquer das partes apenas é possível para o fim do prazo em curso, sem prejuízo dos casos de renovação obrigatória".


4
Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 3142/04.0TBVIS-A.C1:
"Tratando-se de matéria contratual, - estando em causa um contrato de compra e venda de bens, servindo de fundamento à acção a obrigação correspondente ao direito contratual em que se baseia o pedido do demandante – a acção deve ser instaurada no Estado-membro onde os bens foram ou deviam ser entregues".

Nota - Para mais desenvolvimentos sobre a norma da alínea b) do Regulamento (CE) 44/2001, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
de 03-03-2005, proferido no processo n.º 05B316, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-10-2006, proferido no processo n.º 4661/2006-7.

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