sexta-feira, março 16, 2007

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça

1) Acórdão de 15-03-2007, proferido no processo n.º 07B220:
"O Supremo Tribunal de Justiça pode sindicar alteração factual levada a cabo pela Relação com base em factos que considerou notórios.
A relação de causalidade fica liminarmente afastada se o acto não foi “conditio sine qua non“ do dano.
Os danos não patrimoniais merecem a tutela do direito e consequente indemnização se se justificar que o homem de reacção mediana, para aliviar ou afastar o sofrimento, procure intencionalmente prazeres, com dispêndio de dinheiro.
Está neste caso um proprietário que sofreu angústia e desgosto - com reflexo no ambiente familiar e consequente desregulamento nervoso da mulher e dos filhos - em virtude de outra pessoa, abusando duma procuração, registar em nome dela, na Conservatória do Registo Predial, a totalidade dum prédio dele, quando só fora objecto de contrato-promessa parte e a parte sobejante é valiosa, tendo por via disso, ainda que não exclusivamente, sido indeferido projecto de loteamento relativo a esta parte.
Só nos casos expressamente previstos na lei, uma parte pode ser responsabilizada pelo pagamento dos honorários do advogado da contraparte".

Nota - Quanto ao primeiro ponto, lembro que já foi feito neste blog um levantamento aprofundado de decisões que se pronunciaram sobre o conceito de facto notório (cfr. esta ligação).
Defendi naquele momento que o STJ pode apreciar se o facto qualificado pela Relação como notório merece tal qualificação (contra, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-06-2003, proferido no processo n.º 03B1007, do qual discordo, e em sentido mais correcto, cfr. o acórdão do mesmo tribunal de 09-12-1999, proferido no processo n.º 99A872 e principalmente o de 27-02-1996, proferido no processo n.º 088211).
No caso concreto, na Relação escreveu-se o seguinte: "não nos podemos esquecer da situação económica do país nesse período – Novembro de 1995 a Setembro de 2001. É um facto notório, que nesse período de tempo, o país mantinha um crescimento económico acelerado, com grande explosão no sector da construção civil. Daí que fosse muito fácil negociar o terreno em causa, devidamente loteado, com preços altos". Esta matéria não estava alegada, tendo sido considerada como facto notório.
Num sentido que me parece correcto, o STJ rejeita a qualificação da situação económica do país como facto notório: "Ora, se já seria controversa a evolução económica do país, com os contornos que a Relação lhe dá – nomeadamente quanto aos períodos de tempo – não podemos aceitar que a evolução dos preços dos terrenos destinados à construção seja facto notório. A generalidade das pessoas, mesmo regularmente informadas, nem se interessa por tal matéria. Se, por hipótese de raciocínio, indaga-se-mos, à sorte, cada uma das pessoas que encontrássemos, obteríamos seguramente muitas respostas de “não faço ideia”, “não me interessa tal matéria” e, das que se aprestariam para falar sobre o assunto, umas diriam uma coisa e outras outra. Estamos, pois, longe do que se passa com os factos notórios".
Note-se que, apesar de a inflação e a desvalorização da moeda serem factos notórios (cfr. a jurisprudência citada no post para que remete a ligação anterior), não podemos esquecer que o são na sua singeleza, não arrastando na mesma qualificação fenómenos económicos mais complexos.
Quanto ao último ponto (no sentido de que, por regra, não cabe à parte vencida suportar os honorários do advogado da parte vencedora, sem prejuízo da procuradoria que entra em regra de custas), para a análise de uma hipótese excepcional de responsabilização, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21-11-2006, proferido no processo n.º 7390/2006-1.


2) Acórdão de 15-03-2007, proferido no processo n.º 07B683:
"O ónus de prova na oposição à execução segue essencialmente o regime geral previsto no artigo 342º do Código Civil.
O fundamento substantivo da acção executiva - causa de pedir - é a própria obrigação exequenda, constituindo o título executivo o seu instrumento documental legal de demonstração.
Sendo o exequente o portador e sacador da letra de câmbio, a causa da constituição da relação jurídica cambiária – obrigação subjacente - é susceptível de ser discutida na fase declarativa da oposição à execução deduzida pelo aceitante executado.
(...)
Não assentando a letra de câmbio dada à execução em alguma relação jurídica substantiva idónea à constituição da relação jurídica cambiária por ela consubstanciada, procedem os embargos de executado".

Nota - Para uma formulação precisa e descrição da evolução doutrinária e jurisprudencial sobre o conceito de causa de pedir na acção executiva, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-12-2006, proferido no processo n.º 06B3791, e, complementarmente, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2006, proferido no processo n.º 6554/2005-7 (este adaptando o critério também às execuções de títulos cambiários sem invocação da relação subjacente), e do Tribunal da Relação de Coimbra de 25-10-2005, proferido no processo n.º 2270/05.
Para aplicações práticas do conceito, hoje tendencialmente ultrapassado, de que a causa de pedir, na execução, é o título, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 22-05-2001, proferido no processo n.º 0021602, de 13-03-2001, proferido no processo n.º 0021365, e de 18-01-2000, proferido no processo n.º 9950873.
Não se trata de uma mera questão conceptual, havendo consequências práticas da opção tomada. Veja-se, por exemplo, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14-06-2002, proferido no processo n.º 0230707: "Tem uma corrente doutrinária e jurisprudencial vindo a entender que, quando um título de crédito é apresentado como título executivo, mas enquanto mero quirógrafo, ou seja, como documento particular, consubstanciador da relação subjacente, causal ou fundamental, tem o exequente de invocar a causa da obrigação, ou seja, os factos que consubstanciam a existência de uma obrigação do executado para consigo, no requerimento inicial da execução (quando não conste do título), para, designadamente, poder ser impugnada pelo executado, não o podendo fazer posteriormente, sem o acordo do executado, por tal implicar alteração da causa de pedir (neste sentido, Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 2ª ed., 54; Ac. do STJ, de 30.1.2001, CJ/STJ, 2001, I, 85 e da RP, de 13.1.2000, BMJ, 493º-417, entre outros)".
Quanto ao último ponto, cfr. também, no mesmo sentido, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 26-10-2006, proferido no processo n.º 882/06-3.


3) Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 07A316:
"Tendo nas conclusões das alegações de apelação sido levantada a questão da alteração da decisão da matéria de facto, não pode a Relação limitar-se a usar a remissão prevista no nº 5 do art. 713º do CPC.
O uso deste dispositivo pressupõe que as questões colocadas nas conclusões dos apelantes tenham já sido colocadas na sentença recorrida, de modo a que se evite a repetição da fundamentação, o que não é o caso do nº I.
Neste, há um uso ilegal do instituto do art. 713º, nº 5 mencionado, instituto este que constitui excepção à regra do dever de decisão de todas as questões levantadas pelas partes com a devida fundamentação na sentença prevista nos arts. 659º e 660º, nº 2 do mesmo diploma legal.
Tal uso indevido constitui uma nulidade por omissão de pronúncia prevista na primeira parte da al. d) do nº 1 do art. 668º do mesmo código, pela Relação a suprir pela mesma, nos termos do art. 731º, nº 2 do mesmo diploma".

Nota - Especialmente interessante, quanto ao uso, pela Relação, do expediente da remissão, é a seguinte conclusão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-02-2004, proferido no processo n.º 03B1414: "A falta de discriminação dos factos que a Relação devia considerar provados, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 659.º - aplicável por força do n.º 2 do artigo 713.º -, susceptível em derradeiro termo de furtar ao tribunal de revista a base factual segura pressuposta pelo artigo 729.º, n.º 1, como indispensável à aplicação definitiva do regime jurídico adequado, constitui nulidade atípica sancionável, por aplicação directa ou extensiva, nos termos dos artigos 729.º, n.º 3, e 730.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil".
Para uma hipótese de imprecisão na remissão, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-10-2003, proferido no processo n.º 03A1907 (em que a decisão se limitava a dispor o seguinte: "quanto ao resto das questões suscitadas e resolvidas no processo parecem-nos bem resolvidas pelo juiz da primeira instância, não obstante o exagero e profusão de documentos lançados nos autos e não tratados pessoalmente na segunda decisão após a primeira ter sido anulada. Dá-se por integralmente reproduzida toda a restante argumentação e matéria de facto junta à decisão ora sob recurso que aqui se reproduz").
No sentido de que a remissão não é possível quando, no recurso, se suscitem questões novas de conhecimento oficioso (conclusão na linha do acórdão em análise, com a única diferença de se dirigir a questão de direito nova e não a questões de facto), cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-03-2002, proferido no processo n.º 01B3974.


4) Acórdão de 13-03-2007, proferido no processo n.º 06A4646:
"A lei não impõe a indicação dos números da base instrutória cujas respostas deveriam, no entender do recorrente, ser diferentes das que lhes foram dadas, pelo que é suficiente, para ser admitida em recurso de apelação a impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, a indicação dos próprios factos cuja decisão se pretende impugnar".

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