domingo, fevereiro 11, 2007

Jurisprudência do STJ - executoriedade de decisão ao abrigo do Regulamento (CE) n.º 44/2001

No acórdão do STJ de 31-01-2007, proferido no processo n.º 06A4568, decidiu-se o seguinte:
"Em acção proposta com vista à obtenção de executoriedade de decisão de tribunal alemão, ao abrigo do disposto nos arts. 32º a 37º e 39º a 42º do Regulamento (CE) nº 44/2001, do Conselho, de 22-12-2000, o tribunal a quo apenas cometerá nulidade por omissão de pronúncia (prevista na al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC) se as questões colocadas à sua consideração de circunscrevam às questões taxadas pelo nº 1 do art. 45º do dito Regulamento e deixar de apreciá-las, mas já o mesmo se não poderá dizer se as questões colocadas extravasarem o âmbito da previsão deste normativo legal.
De acordo com o nº 1 do art. 34º do citado Regulamento,
"uma decisão não será reconhecida se o reconhecimento for manifestamente contrário à ordem pública do Estado-Membro requerido"
.
O pagamento coercivo por incumprimento culposo de um contrato misto de empreitada e venda e custas do processo mediante a competente acção executiva harmoniza-se com a ordem pública portuguesa, nada impedindo que a parte faça valer em sede executiva a decisão condenatória proferida por aquele tribunal alemão."


Transcrevem-se a considerações da fundamentação sobre a ordem pública.

"Resta-nos, pois, apreciar se assiste razão à recorrente quando invoca violação da ordem pública, a verdadeira e única razão de mérito deste recurso.
A este respeito prescreve o nº 1 do art. 34º do Regulamento em causa que "uma decisão não será reconhecida se o reconhecimento for manifestamente contrário à ordem pública do Estado-Membro requerido".
Colocada esta questão da ofensa à ordem pública portuguesa no reconhecimento das decisões proferidas pelos tribunais alemães, reflectiu a Relação de Guimarães do seguinte modo:
"No caso em apreço, as decisões a reconhecer e a declarar exequíveis em Portugal respeitam a condenações da Recorrente no pagamento de determinadas quantias por incumprimento culposo de um contrato misto de empreitada e venda e custas e despesas do processo.
Ora o pagamento coercivo em Portugal destas quantias, mediante a competente acção executiva, harmoniza-se com a ordem pública portuguesa".
Cremos que nada mais é necessário dizer para tornar evidente a sem razão da recorrente a este respeito.
"A Ordem Pública é o complexo dos princípios e dos valores que informam a organização política, económica e social da Sociedade e que são, por isso e como tal, tidos como imanentes ao respectivo ordenamento jurídico" (Pedro Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil - 2ª edição -, pág. 427).
Para este civilista, "quando insanavelmente contrária à Moral, a Ordem Pública é imoral e, como tal, antijurídica e não vinculante".
Segundo Manuel de Andrade, um negócio pode ser contrário à ordem jurídica porque a própria lei o proíbe ou porque remete para as prescrições da moral, nelas como que delegando tal proibição (in Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, pág. 331).
Mota Pinto, depois de nos chamar a atenção para o facto de não podermos fixar um numerus clausus nesta matéria, aponta para exemplos acolhidos na jurisprudência francesa, como, por exemplo, convenções sobre tráfico de votos e convenções através das quais alguém se obrigue a expor o seu corpo ou de outrem a danos voluntários e não justificados (in Teoria Geral do Direito Civil, pág. 434).
Postos perante estas considerações doutrinais, mais se acentua a bondade da decisão impugnada no que diz respeito à questão que a ora recorrente lhe colocou como sendo ofensivas as sentenças alemães em face da ordem jurídica portuguesa: nada há nesta que proíba que se recorra a juízo com vista à satisfação de dívidas.
Pelo contrário, a nossa Ordem Jurídica, como, aliás, todas as Ordens Jurídicas, permitem o recurso à via executiva quando o devedor não cumpre voluntariamente as obrigações a que, por lei ou por decisão judicial, está adstrito
."


Sobre a aplicação jurisprudencial do conceito de "ordem pública",
podem ler-se outros textos deste blog.

O Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial pode ser encontrado
aqui. Algumas informações sobre a sua aplicação e a doutrina que analisa o diploma podem ler-se aqui e aqui.

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