quarta-feira, junho 04, 2008

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-05-2008, proferido no processo n.º 8230/2007-1:
"I - Nos termos do artigo 9°, n° 1, da Lei 91/95, os proprietários ou comproprietários que têm assento na assembleia são determinados com base nas inscrições prediais. Assim sendo, a certidão predial relativa aos prédios compreendidos nas AUGIs é documento suficiente para, em conjugação com a acta das assembleias, determinar a identidade dos proprietários ou comproprietárias obrigados à comparticipação nas despesas comuns.
II – O dever de comparticipação decorre do direito de propriedade do Apelante sobre tal prédio e não da qualidade de sócio ou não da Apelada. Irreleva, portanto, que o proprietário nunca tenha sido convidado pela Associação para ser seu associado."

Nota - Sobre o (raramente apreciado na jurisprudência) regime da acta contendo a deliberação da assembleia de proprietários, nos termos previstos na Lei n.º 91/95, de 2 de Setembro (Áreas Urbanas de Génese Ilegal - AUGI), no que toca às condições necessárias para que tal documento constitua título executivo, cfr. os acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18-01-2007, proferido no processo n.º 8980/2006-8, de 26-01-2006, proferido no processo n.º 1245/2005-6, de 21-10-2004, proferido no processo n.º 7680/2004-6, e de 07-05-2002, proferido no processo n.º 0021667.
Sobre problemas relacionados com a legitimidade da administração conjunta dos prédios integrados na AUGI, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-11-2006, proferido no processo n.º 5239/2006-7.


2) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-04-2008, proferido no processo n.º 3607/2008-1:
"Só os inventários requeridos na sequência de divórcio são da competência do Tribunal de Família. Não tendo o divórcio sido decretado por Tribunal Português, não se verifica o elemento de conexão justificativo da atribuição da competência do Tribunal de Família, devendo a mesma ser deferida aos Juízos Cíveis, no âmbito da sua competência residual - artigo 99º da LOFTJ."

Nota - A questão em apreço tem algum interesse e não há muita jurisprudência sobre ela. O acórdão anotado invoca um outro, da mesma Relação, de 11-05-2000, proferido no processo n.º 0020422, no qual se decidiu: "I. Só os inventários requeridos na sequência de divórcio, são da competência do Tribunal de Família. II. Não tendo o divórcio sido decretado por um tribunal português, não se verifica o elemento de conexão justificativo da atribuição de competência ao tribunal de família, devendo a mesma ser deferida aos juízos cíveis no âmbito da sua competência residual."
Atente-se na fundamentação do acórdão: "O artigo 1404º do C.Civil dispõe que decretado o divórcio qualquer dos cônjuges pode requerer o inventário para partilha dos bens do casal, salvo se o regime de casamento fôr o de separação, determinando no nº 3 que o inventário corre por apenso ao processo … de divórcio.
Esta norma ainda vigora. Não é uma norma de competência, mas de conexão e dependência – Ac. do T.R.P. de 08-05-1995, in C.J. tomo III, pág. 204.
A actual redacção do artigo 81º c) da LOFTJ decorre da redacção do artigo 60º c) da mesma, na versão da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro, sendo idênticas. Trata-se de norma de competência.
A redacção da LOFTJ sobre competência dos tribunais de família anterior a estas versões, nada continha de relevo - no seu artigo 61º, na redacção da Lei nº 82/77, de 6 e Dezembro.
Estamos portanto perante uma redacção que vem da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro.
Nunca foi dado, desde a Lei nº 38/87, uma interpretação à norma sobre competência do Tribunal de Família, de modo a ligar a acção de divórcio ao inventário subsequente para partilha de bens do casal, que não fosse o de uma ligação sequencial, para passar a ser verdadeiramente espacial.
Por exemplo: quando o divórcio era decretado pelo Tribunal de Círculo, entendia-se que o inventario instaurado para partilha dos bens do casal deveria correr pelos Tribunais Comuns, por serem os competentes, a que depois se apensava o processo de divórcio – Ac. do T.R.C. de 23-03-1999, in C.J. 1999, tomo II, pág. 31.
Como vimos, Tribunais de Competência Especializada são por exemplo os Tribunais de Família a quem compete preparar e julgar designadamente os inventários requeridos na sequência de acções de separação de pessoas e bens e de divórcio, bem como os procedimentos cautelares com aqueles relacionados – artigo 81º c) da LOFTJ.
“Sequência” significa: seguimento, continuação, série, sucessão – Dicionário da Língua Portuguesa de Eduardo Pinheiro, Livraria Figueirinhas, Porto.
O sentido que subjaz à douta sentença recorrida é no fundo o de que sempre que haja divórcio ( pois sem ele não pode haver inventário ), o processo de inventário para partilha dos bens do casal tem de correr termos no Tribunal de Família, quer o processo de divórcio tenha corrido por este, quer inexista, por, por exemplo, ter corrido no Estrangeiro.
Mas assim o Tribunal de Família seria competente para a partilha, mesmo sem qualquer sequência, seguimento, continuação, entre um processo de divórcio e a partilha.
O sentido que se pretende para a norma não tem no seu teor o mínimo de correspondência verbal, como exige o artigo 9º-2 do C. Civil.
A sequência entre o processo de divórcio e o da partilha dos bens do casal tem de ser material, em de existir, não pode ser apenas lógica, abstracta.
Entendemos então, como a Recorrente que, o Tribunal de Família é competente para os inventários subsequentes ao divórcio, no sentido de que a conexão de competência do Tribunal de Família pressupõe a apensação do inventário ao processo de divórcio.
No caso, essa conexão não é susceptível de acontecer porque o divórcio teve lugar num tribunal de País Estrangeiro – Filadélfia, EUA."
Embora seja questão que me suscita dúvidas, não me parecendo de solução evidente, inclino-me para a conclusão oposta à do acórdão anotado. Sem prejuízo de ulterior reflexão melhorada, as razões da discordância são as seguintes:
- Não me parece que seja assim tão claro que a expressão que refere o processo de inventário "na sequência" de divórcio signifique necessariamente que o processo de divórcio tenha corrido no Tribunal de Família, tolerando a letra da lei uma interpretação tão simples como o "seguimento temporal" de um processo ao outro, dando o primeiro (o divórcio) causa ao seguinte (o inventário), em todo o caso sendo de afastar, a meu ver, que esta última interpretação não tenha um "mínimo de correspondência" na lei.
- A decisão em análise parece não levar na devida conta que à distribuição da competência em razão da matéria estão ligadas ideias de alguma especialização do julgador, não se compreendendo o que de tão relevante separa um inventário subsequente a um divórcio decretado no estrangeiro de um outro decretado em Portugal.
- A vencer a posição constante do acórdão anotado, os Tribunais de Família também não deveriam receber os inventários subsequentes a divórcio que correu os seus termos na Conservatória, o que, por sua vez, pelas razões já referidas, e também porque menos se justifica aqui a diferença de tratamento, não me parece acertado, e contraria jurisprudência da mesma Relação (cfr. acórdão de 21-11-2006, proferido no processo n.º 6104/2006-7).
Finalmente, sobre a competência para a acção de anulação da partilha, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30-09-1997, proferido no processo n.º 0037741.


3) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-05-2008, proferido no processo n.º 3321/2008-6:
"1 - A instituição do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores encontra fundamento no direito das crianças à protecção, consagrado constitucionalmente, visando-se proporcionar-lhes condições de subsistência mínimas essenciais ao seu desenvolvimento e a uma vida digna.
2 – O Fundo intervém com carácter subsidiário e surge como garante legal do devedor principal (progenitor condenado a pagar alimentos), efectuando o pagamento das prestações alimentares, a partir do momento em que o progenitor relapso entra em situação de incumprimento, ficando sub-rogado em todos os direitos dos menores perante o devedor originário.
3 – Uma vez que a intervenção do Fundo tem por base o incumprimento do progenitor obrigado a prestar alimentos, este incumprimento só se pode aferir em relação às prestações vencidas, pois que, em relação às prestações vincendas, apenas se pode fazer um juízo de probabilidade, assente no anterior incumprimento e na situação sócio – económica desse devedor.
4 – O n.º 5 do artigo 4º do DL nº 164/99, de 13 de Maio não indica o momento em que nasce a obrigação pelo pagamento das prestações pelo Fundo, mas apenas estabelece o momento a partir do qual o Instituto da Segurança Social deve começar a pagar as prestações através do Fundo, revestindo tal norma um carácter essencialmente burocrático e administrativo.
5 – O momento em que nasce a obrigação a satisfazer pelo Fundo coincide com o momento em que o devedor deixou de pagar as prestações a que estava vinculado.
6 – Para que o Fundo fique adstrito ao pagamento das quantias vencidas, exige-se a verificação pelo Tribunal a quo do incumprimento do devedor e dos demais requisitos exigidos legalmente, condição indispensável para que o Fundo possa ser accionado."

Nota - A decisão contou com um voto de vencido, o que não é de admirar, pois trata-se de um problema de solução difícil, que muito tem dividido os nossos tribunais. Sendo um assunto acompanhado de perto aqui no blog, actualizo agora a última nota sobre o assunto.
Discute-se se a prestação mensal de alimentos a menor, a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores, abrange as prestações já vencidas e não pagas anteriores ao pedido contra o Fundo, as vencidas após tal pedido ou apenas as que se vencerem após a decisão.
Para cada uma das três correntes há jurisprudência.
Citando o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14-12-2006, proferido no processo n.º 0636008, aqui fica um levantamento de algumas delas (acrescentei, apenas, como habitualmente, as ligações directas aos acórdãos).
"São já muito numerosas as decisões dos tribunais superiores sobre a questão do momento a partir do qual recai sobre o Fundo a obrigação de pagar a prestação de alimentos. E três correntes se têm perfilado.
Uma sustenta que a condenação abrange apenas as prestações vencidas a partir do mês seguinte à data da notificação da decisão (de que são exemplo os muitos arestos citados pelo recorrente e, além de outros, o recente acórdão do STJ, de 6.7.2006, www.dgsi.pt, proc. 05B4278); outra, para quem o pagamento, embora só se inicie no mês seguinte ao da notificação da decisão, reporta-se e abrange as prestações vencidas desde a data em que foi apresentado pedido contra o Fundo (neste sentido, Acs. RC, de 12.4.2005, proc. 265/05, e de 3.5.2006, proc. 805/06; da RG, de 1.6.2005, proc. 587/05-1 e de 11.2.2004, proc. 2269/03-2; da RE, de 30.3.2006, proc. 147/06-2, todos em www.dgsi.pt); e, uma terceira, que defende que o Fundo pode ser condenado a pagar as prestações acumuladas, já vencidas e não pagas pela pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos (neste sentido, Ac. da RL, de 12.7.2001 - confirmado pelo Ac. do STJ, de 31.1.2002 (revista nº 4160/01-2ª), e da mesma Relação, de 24.11.2005 e de 9.6.2005, www.dgsi.pt, procs. 9132/2005-6 e 3645/2005-8; da RC, de 15.11.2005, www.dgsi.pt, proc. 2710/05; da RP, de 25.10.2004, 21.9.2004 e 22.11.2004, www.dgsi.pt, procs. 0454340, 0453441 e 0455508; e desta mesma Relação, de 19.9.2002, este in CJ, 2002, IV, 180, relatado pelo ora também relator)."
Exemplar, pela atitude, prossegue o acórdão: "A divergência de decisões tem ocorrido mesmo nesta Secção da Relação do Porto. O que – há que reconhecê-lo – em nada é prestigiante para os tribunais e não deixará de causar alguma perplexidade nos menos entendidos em assuntos de justiça.
Entendeu-se, porém, agora, nesta Secção, após análise conjunta da questão, dever assumir-se uma posição consensual e uniforme, esta no sentido de que as prestações de alimentos são devidas desde a data da propositura do respectivo pedido contra o Estado (embora o respectivo pagamento só se inicie no mês seguinte ao da notificação da decisão que fixe a prestação mensal)."
A argumentação, partindo da omissão de lei reguladora do funcionamento do Fundo, passa por aplicar a regra do artigo 2006.º do CC: "os alimentos são devidos desde a proposição da acção (...)".
Para além desta decisão da Relação do Porto e da jurisprudência nela citada, há ainda a assinalar:
1) No sentido segundo o qual a obrigação a suportar pelo FGA abrange todas as prestações vencidas (desde que não sejam anteriores ao momento da entrada em vigor da lei de instituição do Fundo, ou seja, 01-01-2000): acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 4961/2007-8.
2) No sentido segundo o qual a obrigação a suportar pelo FGA abrange as prestações em dívida a partir da decisão do tribunal: acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2007, proferido no processo n.º 5455/2007-6 (com um voto de vencido, onde se sustenta a posição vertida em "1)"), de 13-03-2008, proferido no processo n.º 899/2008-6 (idem), de 06-03-2008, proferido no processo n.º 1608/2008-6 (idem), e de 31-01-2008, proferido no processo n.º 10848/2007-6; e do Tribunal da Relação de Évora de 28-02-2008, proferido no processo n.º 138/08-3.
3) No sentido segundo o qual o FGA deve suportar as prestações desde a data em que foi requerida a sua intervenção: acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 13-12-2007, proferido no processo n.º 10407/2007-8, e de 10-04-2008, proferido no processo n.º 8324/2007-8.
Já não sobre o mesmo problema, mas outro ainda conexo, veja-se ainda o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-03-2008, proferido no processo n.º 0850591 ("I- Para ocorrer a intervenção do FGADM é necessária a existência de um devedor e que não tenha sido cobrada a prestação de alimentos. II- Esta obrigação e sub-rogação legal do Fundo é independente de terem sido ou não accionados os familiares que estão vinculados à prestação de alimentos.").
Quanto ao critério para cálculo do montante a pagar pelo Fundo, o Tribunal da Relação de Lisboa considerou que o montante a suportar pelo fundo pode ser superior à obrigação do devedor originário - cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17-04-2008, proferido no processo n.º 3137/07-2.

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1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

eu divorciei me em 1999 em geneve
eu sou portugues
a esposa suissa
o casamento foi registado no consulado de portugal em geneve
que devo fazer para reconhecer o meu divorcio em portugal
desde ja muito obrigados pela vossa resposta
ao e mail teixeira_183@hotmail.com
Teixeira

3/05/2009 6:11 da tarde  

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