quarta-feira, novembro 28, 2007

Jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (parte 2 de 3)

1) Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-11-2007, proferido no processo n.º 5155/2007-7:
"O direito ao bom nome e reputação consubstancia um direito da personalidade e, nessa medida, tem natureza de direito fundamental constitucionalmente garantido, sendo de aplicação directa e imediata, vinculando entidades públicas e privadas.
Tal relevância, porém, não pode de modo algum comprimir a importância de outros direitos que, como ele, gozam de igual estatuto, como é o caso do acesso ao direito e aos tribunais previsto no art.º 20, da CRP, sendo certo que a Lei Fundamental não estabeleceu qualquer hierarquia entre os mesmos. A faculdade de recurso a todas as formas de tutela de direitos e de interesses legalmente protegidos, designadamente o recurso aos tribunais, terá de ser feita de uma forma responsável, exigindo um comportamento norteado por um princípio de boa fé contrário a qualquer utilização maliciosa e abusiva do processo, consagrando a lei, no art.º 456, n.º2 do CPC, a concretização das situações que a integram.
A delimitação da licitude ou ilicitude de determinada conduta caracterizada pelo direito de acesso aos tribunais passa, necessariamente, pela compatibilização dos direitos fundamentais em confronto (direito de acesso à justiça e direito ao bom nome e reputação), questão que terá de ser resolvida, em concreto, de modo a impedir o aniquilamento do conteúdo essencial de cada um deles, com respeito aos princípios da proporcionalidade, da adequação e necessidade.
Não extravasa o exercício legítimo do direito de acesso à justiça (em termos de violar direitos de personalidade da executada) o portador de uma letra que lhe foi endossada (vencida e não paga) que, com base nela, instaura execução contra a pessoa que no título figurava como aceitante, excepto se fosse demonstrado que o exequente conhecia (ou tinha obrigação e conhecer) que a assinatura constante do título não era do punho do executada."

Nota - Sobre o abuso do direito de acção, cfr. o estudo de Menezes Cordeiro Litigância de Má Fé, Abuso do Direito de Acção e Culpa "In Agendo", Coimbra: Almedina, 2005, bem como os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21-10-1993, proferido no processo n.º 084406, do Tribunal da Relação do Porto de 13-07-2006, proferido no processo n.º 0633075 (com grande desenvolvimento sobre o tema), de 05-07-2006, proferido no processo n.º 0551458, de 20-02-2006, proferido no processo n.º 0650132, e do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-02-2007, proferido no processo n.º 10806/2006-6, de 16-12-2003, proferido no processo n.º 8263/2003-7, e de 06-12-2001, proferido no processo n.º 00110906.


2)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-11-2007, proferido no processo n.º 7444/2007-7:
"A caducidade da declaração de utilidade pública não é de conhecimento oficioso (artigo 13.º/4 do Código das Expropriações de 1999 e artigos 303.º e 333.º do Código Civil.
A arguição da caducidade da declaração de utilidade pública não pode ser invocada até à decisão final, deve sê-lo, sob pena de preclusão, antes de ser proferida decisão a adjudicar a parcela expropriada à entidade expropriante.
Decorrem do artigo 51.º/5 do Código das Expropriações dois actos processuais autónomos: o primeiro, em que se adjudica à entidade expropriante a propriedade da parcela; o segundo, que dá a conhecer ao expropriado a decisão arbitral, bem como todos os elementos apresentados pelos árbitros, informando-os da faculdade de interposição de recurso, destinando-se o prazo constante do artigo 52.º/1 à impugnação do acórdão arbitral, abrindo a discussão acerca do valor indemnizatório devido."

Nota - No mesmo sentido, no que toca ao (não) conhecimento oficioso da excepção, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22-10-1996, proferido no processo n.º 96A502, do Tribunal da Relação do Porto de 05-02-1996, proferido no processo n.º 9550923, do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-10-2006, proferido no processo n.º 7521/2006-6, de 19-10-2006, proferido no processo n.º 6569/2006-2, de 15-02-1996, proferido no processo n.º 0010162, e de 09-06-1994, in CJ, tomo III, pág. 282.
Contra, considerando que o conhecimento da caducidade deve ser, nestes casos, oficioso, cfr.
José Osvaldo Gomes, Expropriações por Utilidade Pública, Lisboa: Texto Editora, 1997, pág. 356.
Já quanto ao momento até ao qual pode ser invocada a caducidade a jurisprudência não é unânime. Embora a maior parte das decisões já citadas alinhe com a agora anotada, a já referida da Relação de Lisboa
de 19-10-2006, proferida no processo n.º 6569/2006-2, bem como os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 06-07-2000, proferido no processo n.º 0020859, de 21-06-2000, proferido no processo n.º 0030807, e José Osvaldo Gomes, ob. cit., pág. 343, consideram que a caducidade pode invocar-se mesmo depois da adjudicação.
Outras referências à jurisprudência e doutrina podem encontrar-se na fundamentação da decisão anotada, que é bastante completa.



3)
Decisão de reclamação para o Tribunal da Relação de Lisboa de 02-11-2007, proferida no processo n.º 9157/07-1:
"Nos termos do art.º 1396º CPC, sendo o valor do inventário superior à alçada da Relação, os agravos interpostos até ao momento da convocação da conferência de interessados subirão nesse momento.
Afigura-se que só uma leitura literal do texto do preceito permite a retenção do recurso - porque interposto após a convocação da conferência embora antes da sua realização - quando parece ser intenção do legislador, na definição das fases e funções próprias das fases do processo de inventário, que seja resolvido o maior número possível de questões na fase da conferência de interessados. Por isso se prevê a retenção de recursos interpostos até à referida fase."

Nota - Embora com algumas dúvidas - que a desembargadora que elaborou a decisão também parece ter - penso ser este o entendimento mais equilibrado, embora não conheça outra decisão que se pronuncie sobre este problema concreto.


4)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 31-10-2007, proferido no processo n.º 7033/2007-4:
"A notificação por carta registada presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, salvo se o notificando provar que a notificação não foi efectuada ou ocorreu em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis.
Quem é parte num processo judicial e sabe que vai receber notificações por carta registada para a prática de determinados actos deve providenciar no sentido de haver alguém presente no seu domicílio, ou pelo menos, abrir ou mandar abrir a caixa do correio para se inteirar dos avisos de registos que o carteiro ali depositou e proceder, diligentemente, ao levantamento das cartas.
Quem assim não proceder, quem pelo seu desinteresse ou negligência deixar que as cartas registadas que lhe são enviadas pelos tribunais sejam devolvidas, ou quem conscientemente ou por negligência deixar que essas cartas aguardem na estação dos CTT, durante vários dias, quando podiam perfeitamente ser levantadas no dia em que foi deixado o aviso na caixa do correio, presume-se notificado terceiro posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte, quando o não seja.
É muito menos grave a atitude daquele que, por simples descuido, não esteve atento à distribuição do correio e deixou devolver a carta, do que a atitude daquele que, conscientemente, utilizou o expediente atrás referido no intuito de protelar o andamento normal do processo e prorrogar para o dobro os prazos peremptórios previstos na lei.
Se o disposto no art. 254º, n.ºs 3, 4 e 6 do CPC consentisse a utilização deste tipo de expedientes, estaria claramente a prejudicar o destinatário diligente e a beneficiar o negligente e aquele que protela o andamento normal do processo, premiando-os com um prazo superior ao dobro do concedido àqueles que não procederam dessa forma."

Nota - Em sentido muito aproximado, cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 30-06-1994, proferido no processo n.º 9330461 ("O mandatário judicial presume-se notificado de qualquer acto judicial no terceiro dia posterior à data do registo da carta expedida pelo correio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, presunção que pode ser ilidida por razões que lhe não sejam imputáveis. Tendo o mendatário sido procurado, em vão, no seu endereço, e vindo o mesmo a levantar a carta com o aviso deixado naquele em determinada data e feito a entrega das alegações de recurso fora do prazo, terá de provar, sob pena de deserção do mesmo, que em nada contribuiu para o atraso."
), do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-09-2006, proferido no processo n.º 3296/2006-2, de 04-07-1995, proferido no processo n.º 0092591,
Mais brando, permitindo a ilisão da presunção no caso de levantamento da correspondência dentro do prazo do aviso postal mas para além do 3.º dia, foi o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 19-06-2007, proferido no processo n.º 271-C/1998.C1.
No sentido segundo o qual a ilisão da presunção depende sempre de requerimento do interessado, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
de 12-07-2006, proferido no processo n.º 496/01.3TACBR-A.C1.
Sobre o dever do advogado de assegurar a recepção de correspondência, cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-05-1992, in CJ, tomo III, pág. 196.



5)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 31-10-2007, proferido no processo n.º 5923/2007-4:
"Nos termos do artº 376º do Cod. Proc. Civil a habilitação do adquirente ou cessionário terá obrigatoriamente, e sempre, por base um documento ou título escrito do qual constem os termos do negócio da cessão do direito em litígio.
Junta aos autos a escritura de dissolução e liquidação da primitiva Ré, para valer como prova necessária e suficiente à demonstração da existência da transmissão de estabelecimento invocada, pode e deve ser acompanhada e complementada por outro ou outros meios de prova que, conjuntamente com aquela escritura, o possa demonstrar.
Existindo prova que inquestionavelmente leva a concluir pela transmissão de estabelecimento a que se refere o 318º do Código do Trabalho, não existe qualquer obstáculo, designadamente ligado à tramitação simples e célere do incidente de habilitação, a que se defira a habilitação."

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