sexta-feira, junho 22, 2007

Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (parte 2 de 2)

1) Acórdão de 05-06-2007, proferido no processo n.º 07A1473:
"Porque na ordem juridica portuguesa o usucapião prevalece sobre o registo, o comprador que não registou a aquisição de um imóvel mas logrou fazer prova da aquisição originária (usucapião), não vê o seu direito afectado por ulterior penhora daquele bem e subsequentemente venda executiva, mesmo tendo o adquirente registado o bem a seu favor e, posteriormente, tendo-o alienado ao reivindicado, sabendo este que o imóvel fora adquirido pelo reivindicante".

Nota - A fundamentação do acórdão passa, também, em revista o muito discutido problema do conceito de terceiros para efeitos de registo (embora, neste caso concreto, a questão não se coloque nos mesmos termos em que se colocou nos processos que deram origem aos acórdãos uniformizadores de jurisprudência n.º 15/97, de 20-05-97, proferido no processo n.º 087159, e 3/99, de 18-05-1999, proferido no processo n.º 98B1050 - nestes, tratava-se, como é sabido, de vendas voluntárias anteriores à penhora mas não registadas antes dela, tendo dado origem às conhecidas maiorias tangenciais nos dois acórdãos uniformizadores contraditórios em apenas dois anos).
Ainda sobre a questão levantada na decisão anotada, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14-11-2006, proferido no processo n.º 06A3369, de 04-12-2003, proferido no processo n.º 03B3639 (decisão importante, nesta matéria, ao considerar que o arresto e a venda judicial interrompem a usucapião apenas se forem notificados ao possuidor), de 15-04-2004, proferido no processo n.º 04B674, de 11-12-2003, proferido no processo n.º 03B3488, de 03-02-1999, proferido no processo n.º 98B1043, e do Tribunal da Relação do Porto de 07-12-2005, proferido no processo n.º 0535644 (divergindo do já citado acórdão do STJ de 03-02-1999, proferido no processo n.º 98B1043 quanto à possibilidade de o reivindicante juntar à sua posse a dos seus antecessores).



2) Acórdão de 05-06-2007, proferido no processo n.º 07A1642:
"Constando da certidão que serve de título executivo a menção do facto omissivo (do devedor) que determinou a resolução do contrato (por parte do credor) não é defensável, à luz do disposto no art. 8º, nº 2 do D.-L. nº 31/94, de 5 de Fevereiro, a ideia de o mesmo ser inexequível por dele não constar a proveniência da dívida. Se à data da comunicação da resolução do contrato, este já não se encontrava em vigor por, entretanto, ter decorrido o prazo da sua vigência, naturalmente, que o título dado à execução não corresponde às exigências do nº 2 do art. 8º do diploma legal supra referenciado, o mesmo é dizer que não tem a virtualidade de título executivo".

Nota - O decreto-lei n.º 31/94, de 5 de Fevereiro, estabelece regras relativas à aplicação em Portugal dos Regulamentos que instituem regimes de apoio à agricultura, prevendo que as certidões de dívida do IFADAP constituem títulos executivos.
Cfr. ainda os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 29-10-2002, proferido no processo n.º 03B806 (
"Os contratos de atribuição de ajudas, outorgados pelo IFADAP, são contratos de direito privado a que é inaplicável o disposto no artigo 141° do CPA"), e do Tribunal da Relação de Lisboa de 16-11-2006, proferido no processo n.º 905/2006-2 ("Os art.ºs 6, n.ºs 2 a 6 do DL 31/94, de 05/02 na redacção do DL 351/97, de 05/12 e 42, n.º 3 da Portaria n.º 85/98, de 19/02, não conflituam com as normas constantes dos Regulamentos Comunitários relativas às ajudas agro-ambientais à agricultura").


3) Acórdão de 05-06-2007, proferido no processo n.º 07A1673:
"As facturas não são livros de escrituração comercial e, portanto, não se lhes aplica o regime probatório do art. 44º do CCom.
Aos extractos de conta-corrente e aos balanços (embora se possam ter como assentos lavrados em livros de escrituração comercial - cfr. art. 31º do CCom.), só é possível aplicar-lhes o regime probatório do art. 44º daquele diploma legal se se provar que os mesmos estão devidamente arrumados.
Por escrita devidamente arrumada entende-se a que obedece às exigências estabelecidas na lei para o efeito de poder realizar-se plenamente o seu objectivo, ou seja, dar a conhecer as operações e a situação patrimonial dos comerciantes".

Nota - O artigo 44.º do Código Comercial estabelece o seguinte:
"Os livros de escrituração comercial podem ser admitidos em juízo a fazer prova entre comerciantes, em factos do seu comércio, nos termos seguintes:
1.º Os assentos lançados nos livros de comércio, ainda quando não regularmente arrumados, provam contra os comerciantes, cujos são; mas os litigantes, que de tais assentos quiserem ajudar-se, devem aceitar igualmente os que lhes forem prejudiciais;
2.º Os assentos lançados em livros de comércio, regularmente arrumados, fazem prova em favor dos seus respectivos proprietários, não apresentando o outro litigante assentos opostos em livros arrumados nos mesmos termos ou prova em contrário;
3.º Quando da combinação dos livros mercantis de um e de outro litigante, regularmente arrumados, resultar prova contraditória, o tribunal decidirá a questão pelo merecimento de quaisquer provas do processo;
4.º Se entre os assentos dos livros de um e de outro comerciante houver discrepância, achando-se os de um regularmente arrumados e os do outro não, aqueles farão fé contra estes, salva a demonstração do contrário por meio de outras provas em direito admissíveis.
§ único. Se um comerciante não tiver livros de escrituração, ou recusar apresentá-los, farão fé contra ele os do outro litigante, devidamente arrumados, excepto sendo a falta dos livros devida a caso de força maior, e ficando sempre salva a prova contra os assentos exibidos pelos meios admissíveis em juízo".
Quando se satisfaçam os requisitos ali apontados, presume-se correcta a informação contabilística deles constante - presunção
"ilidível pela apresentação de assentos opostos em livros também regularmente arrumados ou por outra prova em contrário" (cfr. ponto "5." da fundamentação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-06-2003, proferido no processo n.º 03A1318).
Cfr. ainda os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24-04-2002, proferido no processo n.º 01S4428 (
"Os relatórios de auditorias feitas ao funcionamento de uma organização (bancária) não cabem na categoria de livros de escrituração comercial e dos documentos a ela relativos"), de 23-01-1996, proferido no processo n.º 087747 ("Os livros de escrituração comercial podem ser admitidos a fazer prova dos factos relativos ao comércio entre os respectivos comerciantes mas isso não significa que tal prova só possa ser feita por esse meio."), e do Tribunal da Relação do Porto de 16-11-2006, proferido no processo n.º 0634459 ("O artº 44º do CCom só é aplicável quando ambas as partes em juízo sejam comerciantes. Quando apenas uma das partes seja comerciante, o valor probatório da escrituração comercial é o mesmo dos simples documentos particulares.").
Convém ter cautela, na busca de jurisprudência sobre esta matéria, com a relação entre o princípio da colaboração na descoberta da verdade e o respeito pelo segredo da escrituração comercial, pois houve alterações relevantes, a este respeito, com a reforma do CPC de 1995/96 - cfr., desenvolvidamente, e com abundante citação de jurisprudência, a fundamentação do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02-05-2006, proferido no processo n.º 1572/2006-7.



4) Acórdão de 05-06-2007, proferido no processo n.º 07A1864:
"Uma vez paga a quantia exequenda na execução de alimentos não há razão alguma para os embargos prosseguirem: a causa extintiva da razão de ser da execução arrasta consigo a própria oposição deduzida.
O actual regime consagrado no nº 5 do art. 1118º do CPC não determina qualquer diminuição de garantias para o oponente, quer das previstas no art. 20º, da CRP quer do direito à defesa consagrado no art. 3º, do CPC ou do princípio da igualdade das partes consagrado no art. 3º-A deste último diploma legal".

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3 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Não cansa/desmotiva nunca ter ninguém a comentar?

6/22/2007 5:51 da tarde  
Blogger Nuno Lemos Jorge disse...

Não, não cansa.

Por vezes, o espírito deste blog pode ser mal compreendido. O que aqui está são notas que, na sua maior parte, tiraria e guardaria para mim. Resultam de uma necessidade de me disciplinar, pois faço a minha investigação nesta área (quer o mestrado, já terminado; quer o doutoramento, em curso) e - como penso que se nota - gosto mesmo muito de processo civil. É por isso que sinto que me obrigo a, por um lado, manter a visão global do sistema (para não me "perder" apenas dentro do tema da tese, o que a preparação das aulas também ajuda) e, por outro, aperfeiçoar a sensibilidade quanto aos problemas mais discutidos nos tribunais (que a prática, apesar de ajudar, não mostra em toda a sua amplitude).

Entre guardar a informação só para mim e disponibilizá-la a quem quisesse vê-la, pareceu-me impor-se a opção de disponibilizá-la.

Claro que me dá um pouco mais de trabalho arrumá-la num blog do que daria, simplesmente, apontá-la apenas para meu uso particular, mas o benefício geral de ter a informação disponível para qualquer um supera, quanto a mim, essa diferença.

No meio disto tudo, e sabendo que o blog tem um número razoável de visitas diárias, os comentários não são decisivos, embora fique especialmente satisfeito, claro está, quando, ocasionalmente, se discute alguma questão (e tem acontecido - é raro, mas acontece).

O propósito do blog é, simplesmente, informar. Não é uma página de promoção pessoal (aliás, limito ao mínimo as minhas informações) nem de vaidade. Realizo-me simplesmente a escrevê-lo e tenho gosto redobrado quando recebo alguma mensagem de alguém que me diga que encontrou nela utilidade.

Por estas razões, caro comentador, com ou sem comentários, o blog continuará enquanto - e na medida em que - eu lhe possa dedicar algum tempo. Gosto do ritmo dos posts diários e só os interrompi em situações muito especiais, como aquelas que, temporariamente, me levam a deixar, por estes dias, textos apenas dia sim, dia não.

Se a página tiver, para si, utilidade, cumpriu também, no que lhe diz respeito, a sua função.

6/22/2007 6:35 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Continue, Sr. Dr., continue!

É, com efeito, um blog muito útil e interessante. Parabéns!

Marta Taborda

6/27/2007 2:23 da manhã  

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