Jurisprudência Constitucional
Deixo aqui notícia de duas decisões recentes do Tribunal Constitucional (ainda não publicadas em Diário da República). Não se ocupando qualquer delas de processo civil (embora uma se relacione indirectamente com ele), considero que o seu interesse prático justifica a indicação.
1) Acórdão n.º 221/2007: Não julgou inconstitucional "a norma constante do n.º 1 do artigo 20º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, segundo a qual são sancionadas como contra-ordenações infracções resultantes de falta de pagamento de taxas de portagem previstas na Base LII das Bases de Concessão aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 248-A/99, de 6 de Julho, praticadas antes da entrada em vigor da Lei n.º 25/2006, sem prejuízo da aplicação do regime que concretamente se mostrar mais favorável ao agente, nomeadamente quanto à medida das sanções aplicáveis".
O Tribunal Constitucional recorreu a alguns antecedentes jurisprudenciais para justificar a decisão. Fazendo apelo ao acórdão n.º 61/99 (ao qual aderiram os acórdãos números 226/2006, 227/2006, 230/2006, 273/2006, 281/2006 e 419/2006, bem como as decisões sumárias números 101/2006, 147/2006, 192/2006, 194/2006, 197/2006, 198/2006, 205/2006, 215/2006, 216/2006, 221/2006, 237/2006, 240/2006, 293/2006, 294/2006, 333/2006, 338/2006, 341/2006, 349/2006, 370/2006, 378/2006, 514/2006 e 515/2006), que versava sobre uma norma muito semelhante ("punição com multa de infracção consistente na falta de pagamento ou de pagamento viciado de portagens devidas em estruturas rodoviárias"), considerou-se ser legítima, face à Constituição, a qualificação de tais condutas enquanto contra-ordenações, bem como a alteração da qualificação da conduta de crime punido com multa para contra-ordenação.
2) Acórdão n.º 212/2007: Julgou inconstitucional, "por violação da alínea h) do n.º 1 do artigo 168.º da Constituição, na versão de 1989, a norma do n.º 1 do artigo 22.º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, na interpretação de que, quando o arrendatário pretenda fazer cessar a mora nos termos do n.º 2 do art.º 1041.º do Código Civil, pode proceder ao depósito da renda mesmo que não ocorram os pressupostos da consignação em depósito, nem esteja pendente acção de despejo".
Considerou-se ocorrer inconstitucionalidade orgância, por violação da regra da reserva da competência legislativa da Assembleia da República constante da alínea h) do artigo 168.º da CRP. Quanto ao sentido da reserva, fez-se apelo ao acórdão do Tribunal Constitucional n.º 77/88 (cujo critério se manteve, posteriormente, nos acórdãos números 410/97, 127/98, 273/99, 391/99, 97/2000 e 461/2002, no sentido segundo o qual "a reserva em causa não se limita à definição dos "princípios", "directivas" ou standards fundamentais em matéria de arrendamento (é dizer, das "bases" respectivas), mas desce ao nível das próprias "normas" integradoras do regime desse contrato e modeladoras do seu perfil. Circunscrito o âmbito da reserva pela noção de "arrendamento rural e urbano", nela se incluirão, pois, as regras relativas à celebração de tais contratos e às suas condições de validade, definidoras (imperativa ou supletivamente) das relações (direitos e deveres) dos contraentes durante a sua vigência e definidoras, bem assim, das condições e causas da sua extinção - pois tudo isso é "regime jurídico" dessa figura negocial. Por outras palavras, e em suma: cabe reservadamente ao legislador parlamentar definir os pressupostos, as condições e os limites do exercício da autonomia privada no âmbito contratual em causa. (Cf. também o acórdão nº 358/92, Diário da República, I-A série, de 26 de Janeiro de 1993). (...)"é de entender a reserva como respeitando unicamente aos aspectos significativos, ou seja, verdadeiramente substantivos, do regime legal do contrato, mas permitindo a intervenção do Governo na regulamentação do que seja puramente adjectivo ou processual (em suma, "regulamentar")".
Considerou-se, então, que "a fixação das condições em que o depósito da renda tem efeito liberatório – os pressupostos materiais da faculdade de proceder ao depósito, havendo obviamente outros aspectos que são de natureza processual - incidindo sobre o modo de satisfação da prestação, com directa repercussão na disciplina contratual relativa ao lugar do pagamento da renda e nas consequências de a prestação não ser cumprida nos termos pactuados ou supletivamente aplicáveis, insere-se nas regras definidoras das relações dos contraentes que se consideram compreendidas na referida reserva de competência legislativa".
Atenta a reserva relativa, haveria, pois, necessidade de autorização da Assembleia da República para que o Governo pudesse regular tal matéria através de decreto-lei.
Ora, a lei de autorização legislativa (Lei n.º 42/90, de 10 de Agosto), permitia ao Governo apenas transpor os "preceitos substantivos contidos no Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de Dezembro de 1961".
Ora, de tais preceitos do CPC decorria que o depósito seria liberatório apenas na hipótese de se encontrar pendente acção de despejo (sem prejuízo das regras próprias da consignação em depósito). Logo, ao interpretar-se a norma do n.º 1 do artigo 22.º do RAU num sentido mais amplo do que constava do CPC (de onde veio transposta a regra), ultrapassar-se-á o limite da referida autorização.
1) Acórdão n.º 221/2007: Não julgou inconstitucional "a norma constante do n.º 1 do artigo 20º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, segundo a qual são sancionadas como contra-ordenações infracções resultantes de falta de pagamento de taxas de portagem previstas na Base LII das Bases de Concessão aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 248-A/99, de 6 de Julho, praticadas antes da entrada em vigor da Lei n.º 25/2006, sem prejuízo da aplicação do regime que concretamente se mostrar mais favorável ao agente, nomeadamente quanto à medida das sanções aplicáveis".
O Tribunal Constitucional recorreu a alguns antecedentes jurisprudenciais para justificar a decisão. Fazendo apelo ao acórdão n.º 61/99 (ao qual aderiram os acórdãos números 226/2006, 227/2006, 230/2006, 273/2006, 281/2006 e 419/2006, bem como as decisões sumárias números 101/2006, 147/2006, 192/2006, 194/2006, 197/2006, 198/2006, 205/2006, 215/2006, 216/2006, 221/2006, 237/2006, 240/2006, 293/2006, 294/2006, 333/2006, 338/2006, 341/2006, 349/2006, 370/2006, 378/2006, 514/2006 e 515/2006), que versava sobre uma norma muito semelhante ("punição com multa de infracção consistente na falta de pagamento ou de pagamento viciado de portagens devidas em estruturas rodoviárias"), considerou-se ser legítima, face à Constituição, a qualificação de tais condutas enquanto contra-ordenações, bem como a alteração da qualificação da conduta de crime punido com multa para contra-ordenação.
2) Acórdão n.º 212/2007: Julgou inconstitucional, "por violação da alínea h) do n.º 1 do artigo 168.º da Constituição, na versão de 1989, a norma do n.º 1 do artigo 22.º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, na interpretação de que, quando o arrendatário pretenda fazer cessar a mora nos termos do n.º 2 do art.º 1041.º do Código Civil, pode proceder ao depósito da renda mesmo que não ocorram os pressupostos da consignação em depósito, nem esteja pendente acção de despejo".
Considerou-se ocorrer inconstitucionalidade orgância, por violação da regra da reserva da competência legislativa da Assembleia da República constante da alínea h) do artigo 168.º da CRP. Quanto ao sentido da reserva, fez-se apelo ao acórdão do Tribunal Constitucional n.º 77/88 (cujo critério se manteve, posteriormente, nos acórdãos números 410/97, 127/98, 273/99, 391/99, 97/2000 e 461/2002, no sentido segundo o qual "a reserva em causa não se limita à definição dos "princípios", "directivas" ou standards fundamentais em matéria de arrendamento (é dizer, das "bases" respectivas), mas desce ao nível das próprias "normas" integradoras do regime desse contrato e modeladoras do seu perfil. Circunscrito o âmbito da reserva pela noção de "arrendamento rural e urbano", nela se incluirão, pois, as regras relativas à celebração de tais contratos e às suas condições de validade, definidoras (imperativa ou supletivamente) das relações (direitos e deveres) dos contraentes durante a sua vigência e definidoras, bem assim, das condições e causas da sua extinção - pois tudo isso é "regime jurídico" dessa figura negocial. Por outras palavras, e em suma: cabe reservadamente ao legislador parlamentar definir os pressupostos, as condições e os limites do exercício da autonomia privada no âmbito contratual em causa. (Cf. também o acórdão nº 358/92, Diário da República, I-A série, de 26 de Janeiro de 1993). (...)"é de entender a reserva como respeitando unicamente aos aspectos significativos, ou seja, verdadeiramente substantivos, do regime legal do contrato, mas permitindo a intervenção do Governo na regulamentação do que seja puramente adjectivo ou processual (em suma, "regulamentar")".
Considerou-se, então, que "a fixação das condições em que o depósito da renda tem efeito liberatório – os pressupostos materiais da faculdade de proceder ao depósito, havendo obviamente outros aspectos que são de natureza processual - incidindo sobre o modo de satisfação da prestação, com directa repercussão na disciplina contratual relativa ao lugar do pagamento da renda e nas consequências de a prestação não ser cumprida nos termos pactuados ou supletivamente aplicáveis, insere-se nas regras definidoras das relações dos contraentes que se consideram compreendidas na referida reserva de competência legislativa".
Atenta a reserva relativa, haveria, pois, necessidade de autorização da Assembleia da República para que o Governo pudesse regular tal matéria através de decreto-lei.
Ora, a lei de autorização legislativa (Lei n.º 42/90, de 10 de Agosto), permitia ao Governo apenas transpor os "preceitos substantivos contidos no Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de Dezembro de 1961".
Ora, de tais preceitos do CPC decorria que o depósito seria liberatório apenas na hipótese de se encontrar pendente acção de despejo (sem prejuízo das regras próprias da consignação em depósito). Logo, ao interpretar-se a norma do n.º 1 do artigo 22.º do RAU num sentido mais amplo do que constava do CPC (de onde veio transposta a regra), ultrapassar-se-á o limite da referida autorização.
Etiquetas: arrendamento, contra-ordenações, jurisprudência constitucional
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