sábado, março 24, 2007

Aos meus alunos - contestação (primeira parte)

Como vem sendo habitual, alguns dos casos analisados nas aulas práticas são adaptações de hipóteses retiradas da nossa jurisprudência.

Aqui ficam os acórdãos sobre as hipóteses analisadas na aula de ontem.

O primeiro caso prático versava sobre revelia numa acção em que a autora pretendeu obter uma indemnização. Um dos pedidos era genérico e a autora suportava-o com alegações vagas sobre danos. Tal hipótese era semelhante à que foi apreciada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22-06-2006, proferido no processo n.º 06B1638, em que um pedido de indemnização se apoiava nos seguintes artigos da p. i.:
"Por outro lado, a paralisação da obra implicou um atraso correspondente na rentabilização do investimento financeiro realizado pela A na aquisição do prédio e na execução da obra realizada até então".
"Acrescem ainda os danos morais decorrentes da criação duma situação de facto consumado, insuportável, resultante dum exercício de poder arbitrário e selvático".
"Pelos danos não patrimoniais causados à A., deve a R. ser condenada em indemnização não inferior a Esc. 2.000.000$00".
O Supremo considerou, no dito acórdão, que "a confissão ficta, prevista no nº1 do artigo 484 do CPC, para a falta de contestação de réu citado, como é o caso, incide apenas sobre factos e não sobre enunciações ou conclusões, conforme decorre dos princípios gerais do direito processual civil e consta expressamente da norma em causa".
Na verdade, se a alegação não for suficientemente concretizada para dela poderem ser extraídos factos, não terá aplicação o regime da admissão por revelia, pela simples razão de que nenhum facto haverá para admitir. O uso de artigos meramente conclusivos (como, por exemplo, "o réu violou direitos do autor" ou "o autor sofreu danos em virtude do comportamento do réu") é admissível, mas eles só fazem verdadeiramente sentido na sequência de uma exposição de factos concretos. A conclusão é sempre um ponto de chegada, nunca um ponto de partida.

O segundo caso prático ocupava-se de uma questão mais complexa: havendo uma petição não contestada, se o juiz convidar o autor a corrigi-la, poderá o réu contestar a segunda petição, não tendo contestado (em revelia absoluta) a primeira?
A questão não é de solução fácil. No acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 29-04-2004, proferido no processo n.º 2853/03-2, decidiu-se que o réu só poderia contestar os factos novos que não constavam da primeira versão da petição inicial, apoiando-se no n.º 4 do artigo 508.º do CPC.
Tal posição não é absolutamente pacífica. O Professor Lebre de Freitas, em A acção declarativa comum, Coimbra: Coimbra Editora, 2000, pág. 80, defende que "[c]omo a revelia do réu se pode explicar pela manifesta inconcludência da petição inicial, o réu deve ser admitido, na contestação, a defender-se com a mesma amplitude com que inicialmente poderia fazê-lo, podendo ainda impugnar os factos inicialmente alegados pelo autor. Assim, só se a revelia se mantiver é que se segue o processo abreviado do art. 484, nos. 2 e 3".
Aqui ficam o acórdão e a opinião contrária. Para ler e reflectir.

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