quinta-feira, novembro 23, 2006

...m'espanto às vezes, outras m'avergonho...

Ocorreu-me esta passagem de Sá de Miranda, que serve de divisa no blog Abrupto, ao atentar em duas afirmações com as seguintes características comuns: (i) foram proferidas por membros de órgãos do Governo; (ii) constituem generalizações abusivas, não apoiadas em factos concretos; (iii) dificultam uma reacção eficaz dos visados, ao diluir um juízo negativo em considerações vagas.

1) A primeira é do senhor Ministro das Finanças que afirmou, na Assembleia da República, que a redução da verba atribuída às universidades e politécnicos é salutar, para que aprendam a gerir melhor os seus orçamentos. Esta afirmação, que leva implícita uma outra - as universidades e politécnicos gastam mal o seu dinheiro - não se suportou numa razão concreta. Não se ouviu uma palavra sobre quem gere mal as verbas (algumas instituições? todas as instituições?) ou em que consiste essa má gestão (são mal afectadas? há despesismo?), muito menos uma indicação positiva sobre como melhorar.

2) A segunda está aqui e foi proferida pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, João Amaral Tomaz, segundo o qual são os tribunais que atrasam o combate à evasão fiscal. "O Estado dispõe de meios cada vez mais expeditos para detectar situações de fraude fiscal, mas este esforço da máquina acaba por esbarrar numa justiça excessivamente lenta, que tarda em sancionar os criminosos." (...) "Quando não há uma sanção rápida, fica-se com a ideia de que o sistema não funciona, o que, por si, constitui um estímulo ao incumprimento".
O que o cidadão médio retira ou conclui destas declarações, fazendo fé nelas, é o seguinte: o combate à evasão fiscal envolve a cooperação de dois poderes - o executivo e o judicial. O executivo cumpre o seu papel, descobrindo e perseguindo os infractores, acumulando informação e entregando os suspeitos à justiça. Esta é lenta e ineficaz, deitando a perder o belíssimo trabalho anterior.
Uma parte da população fará as perguntas certas: porque se diz que é lenta e ineficaz a justiça?; quais as razões dessa lentidão (falta de recursos? insuficiência legislativa? incompetência de magistrados e/ou advogados?...); que participação é de imputar ao poder executivo nas razões dessa ineficiência?

Para os que nada questionam, por falta de tempo ou atenção, a memória regista apenas as conclusões. Com isto, ninguém ganha. Perdemos todos.

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